Transparência e Dados Abertos: caminhos e desafios na construção de leis e sua implementação em Florianópolis

Por Ismael Tiago Motta, Luiz Carlos Ferreto Junior, Paulo Aranalde Carvalho e William Otoniel*

Como são elaboradas as leis que promovem transparência e dados abertos em municípios? Quem costuma participar do processo? Como se pode assegurar e acompanhar sua implementação?

Essas e outras questões nos levaram a investigar o tema no âmbito do município de Florianópolis. Nos acompanhe para saber um pouco do que descobrimos.

Um dos temas centrais da sociedade contemporânea tem sido a democratização do Estado no sentido de prover à sociedade informações relativas a seus atos, além de justificar suas omissões. Nisso se fundamenta a accountability, o prestar contas e a responsabilização a que gestores estão sujeitos, por seus atos e omissões, passíveis de serem punidos ou reconhecidos e valorizados. Dessa forma juntam-se elementos como responsabilização, fiscalização e controle social no sentido de melhorar a governança pública e o acesso e a qualidade dos serviços públicos, além de combater a corrupção e o desperdício, trazendo assim benefícios a toda a sociedade.

Contribuem para isso dispositivos legais no âmbito federal dispondo sobre transparência de dados, como a Lei da Transparência (LC 131/2009), a Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011), bem como a Lei n. 13.460/2017, que dispõe sobre a participação, proteção e defesa dos direitos dos usuários dos serviços públicos da administração pública. Dessa forma, vão se construindo pontes legais que possibilitam o controle social pela sociedade, das ações do setor público e seus agentes.

A Câmara Municipal de Florianópolis, CMF, é o órgão do poder local que abriga o Poder Legislativo do Município e é composta por representantes do povo, eleitos pelo sistema proporcional. O legislativo municipal atua na produção de leis e na fiscalização do Poder Executivo, com o objetivo de preservar o bem estar da comunidade e promover conexões entre a administração pública e os cidadãos. Em sua área de atuação, a Câmara Municipal propõe, delibera e vota Projetos de Leis, Projetos de Decretos Legislativos, Projetos de Resoluções e demais matérias. 

Alinhado às políticas de controle social e transparência emanadas do ente federal e a demandas de segmentos locais, o município de Florianópolis instituiu o Portal Da Transparência de Florianópolis (Lei 9.447/2014) e a Política de dados abertos do Poder público municipal (Lei 10.584/ 2019).

Ainda, foi estabelecida a Comissão Parlamentar Especial (CPE) pela Transparência na Administração Pública de Florianópolis, a partir do Requerimento 382/2019, em 12 de novembro de 2019, com o objetivo de elaborar uma proposta de “Política de Transparência na Administração Pública de Florianópolis”, por meio de uma cooperação interinstitucional entre a Câmara Municipal de Florianópolis, demais entes públicos, academia e sociedade civil. Esses atores, se reuniram e elaboraram um diagnóstico e um projeto de lei orientado à construção de uma agenda municipal permanente, voltada à transparência, aos dados abertos e à participação cidadã.  

Assim, chegou-se ao Projeto de Lei nº 18.124/2020, que dispõe sobre a instituição da Política Municipal da Transparência em Florianópolis. Esse projeto deu entrada na Câmara no dia 23 de setembro de 2020 e desde então percorre o trâmite legislativo, que inclusive teve mudança de mandato nesse período, cujas comissões analisam e emitem pareceres durante a sua tramitação. Na Figura 1 estão alguns dos principais passos. Mais detalhes sobre a tramitação aqui.

Figura 1 – Algumas etapas do trâmite do Projeto de Lei nº 18.124/2020

Fonte: CMF/Consulta a projetos/PL/18124/2020 – Elaborado pelos autores (2022)

O processo de tramitação dos projetos de lei podem passar por algumas das 13 comissões avaliadoras da Câmara, requerendo tempo para aprovação ou rejeição de um Projeto de Lei. As discussões são importantes, pois, ao ampliar o debate, permitem diferentes perspectivas. Porém, nem sempre a tramitação pelas diversas comissões conta com a participação dos diferentes segmentos interessados e dos que contribuíram na construção de um projeto de lei. A mobilização durante todo o período de tramitação pode vir a ser um fator que distancia seus agentes das alterações que o texto original do projeto de lei pode sofrer, dessa forma ocorrendo alterações sem o devido debate com os autores que o idealizaram.

Assim, ressaltamos que o debate deve prosseguir ativo, com participação daqueles que o idealizaram e outros que se somam durante o processo, mantendo uma agenda contínua de acompanhamento e vigilância. O controle social e a accountability são processos contínuos e permanentes.

 A partir dessa análise, suscitam questionamentos de como projetos de lei são acompanhados. O PL 18.124/2020 no momento encontra-se em tramitação percorrendo as comissões parlamentares da câmara municipal, entretanto, existe algum acompanhamento pelo grupo de cooperação interinstitucional: Câmara Municipal de Florianópolis, demais entes públicos, academia e sociedade civil?

Aqui se faz oportuno um questionamento sobre a Lei n. 10.584/2019, que versa sobre a Política de Dados Abertos do Município. Apesar de ser um importante avanço legal e social no quesito transparência e abertura de dados, e fruto de um longo debate na Câmara de Vereadores de Florianópolis, a partir de um projeto construído em colaboração entre estudantes de administração pública da Udesc Esag e o gabinete do vereador Gabriel Meurer, a sua implementação não está sendo executada com a devida transparência, conforme já apontado por Pedro Braga Montoya e Thaynná Machado Sene (2021) em artigo sobre a transparência em Florianópolis. 

Em  agosto de 2021, os estudantes não conseguiram obter informações sobre o andamento da implementação. A situação em fevereiro de 2022 não é diferente, pois buscamos novamente informações sobre a implementação da Política de Dados Abertos em Florianópolis, e também não se obteve resposta. Cabe ressaltar que a Lei n. 10.584/2019, em seu artigo 13, determina prazos para que o Poder Executivo e o Poder Legislativo Municipal apresentem um relatório sobre as atividades desenvolvidas no ano anterior, bem como sua evolução. 

Portanto, evidencia-se que os elementos de controle, fiscalização, prestação de contas e responsabilização integram um processo contínuo de accountability, no qual os diversos segmentos da sociedade, ao se unirem ao legislativo, podem contribuir para elaborar leis, acompanhar sua tramitação e, sobretudo, sua execução. Os atores ali envolvidos, governo e cidadãos, deverão estar em contínua mobilização, dialogando entre si, com base em transparência e vigilância, transformando a accountability não apenas num instrumento isolado que se encerra num decreto, uma lei ou relatório, mas num instrumento permanente de controle social, edificando uma sociedade mais justa e cidadã.

* Texto elaborado pelos acadêmicos de administração pública Ismael Tiago Motta, Luiz Carlos Ferreto Junior, Paulo Aranalde Carvalho e William Otoniel, no âmbito da disciplina sistemas de accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, no segundo semestre de 2021.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Ministério da Educação. Sobre a Lei de Acesso à Informação. Disponível em:<

https://www.gov.br/capes/pt-br/acesso-a-informacao/servico-de-informacao-ao-cidadao/sobre-a-lei-de-acesso-a-informacao>. Acesso: 12 dez. 2021.

CÂMARA MUNICIPAL DE FLORIANÓPOLIS. Cpe Da Transparência. Em de agosto de 2020. Disponível em:< https://www.youtube.com/watch?v=-8-DU4g3iBQ.>. Acesso: 12 de dez. 2021.

CÂMARA MUNICIPAL DE FLORIANÓPOLIS. Portal. Disponível em:<https://www.cmf.sc.gov.br/>. Acesso: 12 de dez. 2021.

FLORIANÓPOLIS. Câmara Municipal de Florianópolis. Disponível em: <https://www.cmf.sc.gov.br/>. Acesso: 12 de dez. 2021.

FLORIANÓPOLIS. Projeto de Lei PL./18124/2020. Câmara Municipal de Florianópolis. Disponível em: Disponível em: <https://paperlessgov-editor.cmf.sc.gov.br/visualizador/publico/anexo/1261>. Acesso: 12 dez. 2021.

LEIS MUNICIPAIS. Lei N° Nº 10.584, de 02 de Agosto de 2019. Institui A Política De Dados Abertos Do Poder Público Municipal. Disponivel em:<https://leismunicipais.com.br/a1/sc/f/florianopolis/lei-ordinaria/2019/1059/10584/lei-ordinaria-n-10584-2019-institui-a-politica-de-dados-abertos-do-poder-publico-municipa>. Acesso 12 de dez. 2021.

LEIS MUNICIPAIS. Lei Nº 9447, de 20 de Janeiro de 2014. INSTITUI O PORTAL DA TRANSPARÊNCIA DE FLORIANÓPOLIS. Disponível em: <https://leismunicipais.com.br/a1/sc/f/florianopolis/lei-ordinaria/2014/945/9447/lei-ordinaria-n-9447-2014-institui-o-portal-da-transparencia-de-florianopolis?q=9447>. Acesso: 12 de dez. 2021.

POLITEIA. Coprodução do Bem Público: Accountability e Gestão. Ed. Camila Pagani. 2020. Disponível em:<https://politeiacoproducao.com.br/comissao-parlamentar-especial-pela-transparencia-no-municipio-de-florianopolis/>. Acesso: 12 de dez. 2021.

Transparência e participação cidadã na iniciativa de governo aberto em Santa Catarina

Por Daniela de Jesus Lumertz, Douglas Davi Silveira, Luiza Debastiani e Silva e Verônica Pereira de Souza*

Santa Catarina começou a desenvolver, em março de 2021, um conjunto de ações incluídas em seu 1º Plano de Ação para promover o governo aberto no Estado, com o  intuito de aperfeiçoar de maneira contínua os serviços públicos, além de prevenir e combater a corrupção. Para que essa intenção se concretize, o Poder Executivo Estadual dispõe de dispositivos legais, seu aparato de servidores e recursos e parcerias com cidadãos e organizações locais, nacionais e internacionais para realizar e consolidar a abertura contínua de governo. As ações desse plano, orientadas pela Visão Estratégica de Governo Aberto, são uma forma para movimentar e impulsionar a abertura do governo em Santa Catarina (OGP, 2021).   

Neste texto, será analisado este 1º Plano de Ação, em especial suas ações voltadas para a promoção da transparência e da participação cidadã, explorando conceitos e projetos relacionados a essas áreas.  

De onde surgiu essa iniciativa de promoção do Governo Aberto no Estado de Santa Catarina? 

Santa Catarina possui em seu histórico ações que corroboram com o conceito de governo aberto, contando com instâncias de colaboração entre sociedade e setor público, um aspecto fundamental de governo aberto. Embora exista um avanço nessa aproximação entre Estado e sociedade, é percebido pelo próprio governo de Santa Catarina a ausência de uma visão de longo prazo para o fomento dessa colaboração, bem como a instalação de meios sistemáticos e continuados que fomentem a participação cidadão e a transparência pública (OGP, 2021).  

Dito isso, integrantes do governo de Santa Catarina entendem a importância das ações voltadas para o Governo Aberto, como forma de aprimorar suas práticas que tange a participação social, transparência e accountability, áreas estas fundamentais para o desempenho e a democratização do Estado e da própria sociedade. Por conta disso, Santa Catarina vem procurando empenhar esforços para se tornar uma referência em inovação, transparência e participação social. Este desejo se traduziu na participação de Santa Catarina na Parceria pelo Governo Aberto (Open Government Partnership, OGP) e na construção do seu 1º Plano de Ação (OGP, 2021).  

Para desenvolver esse 1º Plano de Ação, houve a colaboração de múltiplos agentes, como cidadãos, universidades, órgãos e entidades dos governos estaduais e municipais, organizações da sociedade civil, câmara de vereadores, empresas e outras organizações privadas. Para que esse grupo diversificado de colaboradores pudesse articular e criar em conjunto as ações de governo aberto, foram organizadas mesas temáticas, cada uma com um dos temas a ser deliberado. As mesas foram escolhidas pelo Grupo Motor, que coordena o processo, e os coordenadores de projetos em curso no Estado. Em cada mesa, houve participação de organizações governamentais e da sociedade civil, buscando-se alcançar certo equilíbrio entre os dois grupos (OGP, 2021). Os temas das mesas foram:   

  • Compras Públicas e Contratação Aberta; 
  • Transparência Ativa; 
  • Participação do Usuário e Avaliação dos Serviços Públicos; 
  • Articulação de Governo Aberto e Controle Social nos Municípios. 

Dessas mesas surgiram projetos relacionados às quatro temáticas mencionadas, sendo que aqui focalizamos aqueles mais diretamente relacionados com a transparência e a participação cidadã.

Transparência

O plano de Ação de Santa Catarina possui uma mesa temática relacionada à transparência ativa. Esta define  como compromisso “reestruturar instrumentos de transparência ativa utilizando desenho centrado no usuário para melhorar a qualidade, usabilidade e acessibilidade da informação pública, inclusive com a disponibilização de formatos abertos”. 

Está sendo desenvolvido o projeto de reestruturação e aperfeiçoamento continuado e participativo do Portal da Transparência. Busca-se criar um plano de melhoria continuada do Portal, para ampliar a participação social, transformando a estrutura da informação, em que as pesquisas dos dados e informações se tornem mais intuitivas e orgânicas, e melhorando a qualidade e a atualização dos conteúdos do portal através de novos canais de comunicação bidirecionais.

Este projeto se iniciou em janeiro de 2021 e está previsto para se encerrar em junho de 2022, totalizando um esforço de 18 meses para sua conclusão (CGE, 2021). Para desenvolvê-lo, são despendidos esforços como o benchmarking em portais (nacionais ou não), a análise e levantamento das funcionalidades necessárias para essa nova versão do portal (backlog de funcionalidades), modelagem da navegação do portal, a criação de um protótipo, seguida de testes para seu refinamento, e a implementação de funcionalidades (CGE, 2021).  

Dentre as dificuldades mapeadas que justificam essa reestruturação do portal, estão a falta de agilidade atual, a incompatibilidade de informações dentro do site,  informações incompletas e a ausência de um canal para que o cidadão possa dar feedbacks (CGE, 2021).  

Uma abordagem que pode ser útil para o grupo é a da Transparency by Design, termo que designa um método criado por Cavoukian (2009), que imaginou uma visão holística e integrativa referente à proteção da privacidade, com o objetivo de ajudar as organizações a promover a transparência. Esse método refere-se a um princípio de que os dados sobre o funcionamento do governo são, automaticamente, abertos, podendo ser acessados e interpretados facilmente sem serem pré-processados ou pré-definidos. Dessa forma, deve-se garantir que todos os dados relevantes de uma supervisão pública sejam disponibilizados à população, de forma clara (FELZMANN et al., 2020).

A Transparency by Design atua como uma orientação prática a fim de ajudar a promover as funções da transparência, enquanto mitiga seus desafios em ambientes que necessitam da tomada de decisão. O desenvolvimento da transparência é um equilíbrio entre desejabilidade e viabilidade. Por essa razão, o ideal de um sistema transparente completo só pode ser atingido com grandes despesas e esforços de longo prazo (FELZMANN et al., 2020).

Dessa forma, é importante refletir: para quem uma situação transparente é criada? Para quem tem conhecimento e tempo para usá-lo? Ou o objetivo é criar “transparência num piscar de olhos”, de modo que qualquer pessoa com um diploma de ensino médio e alguns minutos possa entender a situação? 

Segundo Felzmann el al. (2020), o nível ideal de transparência seria aquele em que a transparência desejada e alcançada correspondesse à perspectiva do indivíduo e de um grupo. Já que diferentes partes interessadas têm diferentes expectativas e percepções de transparência, negociar esse ponto é  visto como um grande desafio.

Portanto, ao implementar esse método, as organizações podem perceber os benefícios da transparência de maneira prática, incluindo o fomento da confiança, facilitando a responsabilização, apoiando a autonomia e permitindo um nível mais alto de controle. Ao mesmo tempo, é fundamental estar consciente das complexidades e da inserção da transparência com suas limitações associadas (FELZMANN et al., 2020).

Participação cidadã

O Plano de Ação de Santa Catarina possui duas mesas temáticas relacionadas diretamente à participação cidadã, além de este ser um princípio mais geral de todo o processo. A primeira tem como compromisso “promover princípios e práticas de governo aberto e controle social em municípios catarinenses, incentivando a aprendizagem compartilhada e articulando iniciativas de governos e sociedade civil nos âmbitos local e estadual”. A outra é a que busca “promover a participação social para aperfeiçoamento dos serviços públicos através da instituição de conselho de usuários, criação de ferramenta tecnológica de avaliação de serviços digitais e melhoria do sistema de ouvidoria e acesso à informação”.

Esses dois compromissos do Plano de Ação apresentam características de controle social que promovem a participação coletiva, como, por exemplo, através de conselhos de usuários e do controle social em municípios. 

A participação e o controle social estão relacionados. Os cidadãos, através da participação na gestão pública, podem orientar os governos para que sejam adotadas medidas que atendam ao interesse público, e ao mesmo tempo podem exercer controle sobre a ação do Estado, exigindo que o gestor público preste contas de sua atuação, com mais transparência e accountability.  A  participação  popular,  “no  que  tange  à  elaboração  de  políticas  embasadas  em  dados e informações públicas governamentais ou não (entre outras ações e possibilidades), se destaca como um  dos  fatores  de  transformação  social” (SANCHEZ, MARCHIORI, 2017, p.105). 

De acordo com Arnstein (2019, p. 24), a participação cidadã constitui um sinônimo para poder cidadão. A participação é a redistribuição de poder que permite aos cidadãos sem-nada, quando excluídos dos processos políticos e econômicos, serem ativamente incluídos no futuro.

Segundo Wijnhoven et al. (2015, p.30), as novas plataformas da internet tornam mais fácil para os cidadãos articular suas opiniões e interagir com a administração pública e representantes políticos. Além disso, “essas plataformas também podem aumentar a aceitação de decisões políticas, porque os cidadãos podem compreender quem e quantas pessoas apoiam uma decisão” (WIJNHOVEN et al. 2015, p.30).

É possível analisar e identificar em qual etapa de participação cidadã que determinado governo se encontra. É o que apresenta um clássico texto de Arnstein, publicado originalmente na década de 1970. De acordo com esse estudo, a partir da experiência da autora na gestão pública e na academia, a participação cidadã pode ser representada através de oito  degraus  de participação, que simbolizam os níveis de participação cidadã existentes em qualquer estrutura política, social ou econômica. 

Esses degraus são divididos em 3 estágios. O primeiro é chamado de  “Não participação” e nele as pessoas não participam efetivamente do planejamento ou da  realização de programas, “mas os detentores do poder estabelecem alguns espaços – audiências, reuniões comunitárias, etc.- e se utilizam destes para mascarar um tipo de participação” (SANCHEZ e MARCHIORI. 2017 p.114). No segundo estágio, chamado de “esforços simbólicos de participação”, os cidadãos podem ouvir e ser ouvidos, porém eles não têm o poder de assegurar que seus pontos de vista serão atendidos. Quando a participação é restrita a esses níveis, não há acompanhamento e, portanto, não há garantia de mudanças. O patamar mais alto dessa “escada” é chamado de “Poder do cidadão”, que inclui a tomada  de  decisão,  representada pelo degrau 6 (Parceria), que lhes permite negociar com detentores de poder tradicionais a possibilidade de tomada de decisão,  a “Delegação de Poder” (degrau 7) e o “Controle cidadão” (degrau 8), nos quais os cidadãos podem atingir pleno poder gerencial sobre certo projeto ou tema (SANCHEZ e MARCHIORI. 2017 p.114). 

Figura 1: Oito degraus de uma escada de participação cidadã | Fonte: ARNSTEIN, Sherry. A ladder of citizen participation. In: The city reader. Routledge, 2015, p.26

Para Arnstein (2015, p. 25), conhecer esta gradação possibilita cortar os exageros retóricos e entender tanto a crescente demanda por participação por parte dos sem-nada, como o leque completo de respostas confusas por parte dos poderosos.

Além dessa clássica “escada da participação cidadã”, de Arnstein, diversas outras tipologias de participação podem ser úteis aos envolvidos em processos de governo aberto, para avaliar o compartilhamento de poder, as expectativas de cada envolvido e as contribuições dos participantes ao processo.

Além disso, Hilgers (2012, conforme citado por WIJNHOVEN et al. 2015, p.31) afirma que a participação no governo aberto tem três metas: ideação e inovação cidadã, fonte cidadã e democracia colaborativa. Ideação e inovação cidadã visam reunir conhecimento externo, principalmente dos cidadãos, para melhorar as realizações da administração pública. A fonte cidadã visa o apoio do cidadão nas tarefas diárias da administração pública. Por último, a democracia colaborativa reúne iniciativas governamentais abertas para processos de decisão política (HILGERS, 2012 apud WIJNHOVEN et al. 2015, p.31). Democracia colaborativa procura respostas para questões normativas para desenvolvimentos futuros da sociedade.

É com base nesses conceitos e com uma análise da situação atual da participação cidadã no estado de Santa Catarina que é possível identificar caminhos  que proporcionem maior grau de compartilhamento de poder entre governantes e cidadãos.

Exemplos Internacionais

Entendemos que são muitos os desafios que envolvem a utilização da participação cidadã, porém trazemos como sugestão que as iniciativas internacionais a seguir sejam analisadas como exemplo, e que possam auxiliar no debate quanto às ações a serem tomadas para uma participação social mais direta e próxima do cidadão.

  • Sciencewise é uma iniciativa em que cidadãos do Reino Unido podem participar do projeto de políticas públicas através de um projeto de diálogo público. Segundo o site da iniciativa, eles ajudam a garantir que as políticas sejam informadas pelas opiniões e aspirações do público.

Figura 2: Página inicial do site Sciencewise | Fonte: elaborado pelos autores, 2022

  • Challenge.gov é o ambiente virtual onde instituições governamentais dos Estados Unidos podem postar problemas e esperar possíveis soluções dos cidadãos, sendo este  um exemplo de ideação e inovação cidadã. 

Figura 3: Página inicial do site Challenge.Gov | Fonte: elaborado pelos autores, 2022

  • FixMyStreet: o cidadão pode informar sobre problemas nas estradas e lugares que precisam de manutenção no Reino Unido. Essa iniciativa ajuda a  poupar mão de obra, fornece informações sobre infraestrutura e possibilita uma resposta mais rápida ao problema postado.

Figura 4: Página inicial do site FixMyStreet | Fonte: elaborado pelos autores, 2022

  • Buergerhaushalt.org é um exemplo de meio para a democracia colaborativa de projetos de “orçamento participativo”, no qual os cidadãos podem fazer sugestões sobre os ativos no próximo exercício financeiro. Contudo, não é necessário buscar somente em fontes externas exemplos sobre orçamento participativo, visto que o Brasil é referência nessa iniciativa, que foi instituída pela primeira vez em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, no ano de 1989, e que, desde então, foi difundida e adaptada globalmente.

Figura 5: Página inicial do site Challenge.Gov | Fonte: elaborado pelos autores, 2022

Os cidadãos podem participar, também, do processo de abertura de dados através da utilização dos portais de dados abertos, efetuando pesquisas, analisando, visualizando o conjunto de dados e compartilhando suas descobertas. Dados abertos capacitam o cidadão a ser mais bem informado sobre o que o governo decide e fornece como, por exemplo, escolher uma escola melhor ou serviço de saúde, entender onde o dinheiro público foi gasto ou estar ciente dos problemas ambientais na sua área.

Por fim, compreendemos que o Governo do Estado de Santa Catarina tem realizado iniciativas em governo aberto através da parceria com a Open Government Partnership (OGP), rede que inclui iniciativas de muitos países e locais pelo mundo e que é fonte de estímulo, ideias e apoio para ações continuadas e transformadoras. Entendemos, também, que o incentivo à participação cidadã é um grande desafio a ser continuamente reconhecido e trabalhado, em conjunto entre governos e sociedade. 

Para que seja possível uma ampla e intensa participação social, é necessário que o governo considere as diferentes necessidades e capacidades da cidadania, entenda os usuários de cada serviço, identifique e ouça o que os cidadãos precisam, crie interfaces fáceis e que o acesso aos dados e às ferramentas de participação social sejam de fácil compreensão e que seja oferecido um feedback sobre o que é feito com a contribuição para motivá-los a participar. Outro ponto importante é o cuidado necessário para que grupos marginalizados também façam parte e contribuam com sua participação. Caso contrário, corre-se o risco de reforçar as estruturas existentes, focando apenas naqueles que já possuem mais capacidades e acesso à tomada de decisões.

Entendemos que a tecnologia e a informação são sim necessárias, embora não suficientes, para proporcionar transparência. Além da transparência, é por meio da proximidade em ações conjuntas e da abertura dos governos aos cidadãos, que estes  encontram a possibilidade de realmente participar na tomada de decisão dos governos e na implementação das políticas públicas, na coprodução dos serviços públicos e no monitoramento e avaliação dos resultados.

* Texto elaborado pelos acadêmicos de administração pública Daniela de Jesus Lumertz, Douglas Davi Silveira, Luiza Debastiani e Silva e Verônica Pereira de Souza, no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, no segundo semestre de 2021.

 Referências

ARNSTEIN, Sherry. A ladder of citizen participation. In: The city reader. Routledge, 2015. p. 323-336. Disponível em: http://www.remineo.org/repositorio/ciao/xviii/talleres/t1/Mirada2.Arnstein1968Ladderofparticipation.pdf Acesso em 21 fev. 2022

BUERGER HAUS HAULT. BuergerHausHault.org, c2022. Página inicial. Disponível em: <https://www.buergerhaushalt.org/>. Acesso em: 15 fev. 2022.

CAVOUKIAN, A. Privacy by design: The 7 foundational principles. Privacy by Design Foundational Principles, 2009.

CHALLENGE. Challenge.gov, c2022. Página inicial. Disponível em: <https://www.challenge.gov/>. Acesso em: 15 fev. 2022.

Controladoria-Geral do Estado. Programa SC Governo Aberto. 2021. Disponível em: http://dados.sc.gov.br/dataset/programa-sc-governo-aberto. Acesso em 21 fev. 2022.

FELZMANN, H. et al. Towards Transparency by Design for Artificial Intelligence. Science and Engineering Ethics, 2020. Disponível em: https://link.springer.com/article/10.1007/s11948-020-00276-4. Acesso em: 13 fev 2022. 

FIXMYSTREET. FixMyStreet, c2022. Página inicial. Disponível em: <https://www.fixmystreet.com/>. Acesso em: 15 fev. 2022.

POLITIZE. orçamento participativo: como funciona e como participar. Politize. 2016. Disponível em: <https://www.politize.com.br/orcamento-participativo-como-funciona/> Acesso em: 22 fev. 2022.

Open Government Partnership. 1º Plano de Ação SC Governo Aberto. 2021. p. 06-20. Disponível em: https://cge.sc.gov.br/wp-content/uploads/2021/09/1o-Plano-SC-Governo-Aberto-OGP-Local.pdf. Acesso em 21 fev. 2022.

WIJNHOVEN, Fons; EHRENHARD, Michel; KUHN, Johannes. Open government objectives and participation motivations. Government information quarterly, v. 32, n. 1, p. 30-42, 2015. Disponível em: http://translateyar.ir/wp-content/uploads/2018/12/document14.pdf acesso em 14 fev. 2022

SANCHEZ, Cristiane Sinimbu; MARCHIORI, Patricia Zeni. Participação Popular no Contexto das iniciativas de Governo Aberto: revisão sistemática da literatura. Revista Brasileira de Políticas Públicas e Internacionais-RPPI, v. 2, n. 2, p. 103-118, 2017. Disponível em: https://periodicos.ufpb.br/index.php/rppi/article/view/34564/18994 Acesso em 14 fev. 2022
MEIJER, Albert J.; CURTIN, Deirdre; HILLEBRANDT, Maarten. Open government: connecting vision and voice. International review of administrative sciences, v. 78, n. 1, p. 10-29, 2012. Disponível em https://journals.sagepub.com/doi/pdf/10.1177/0020852311429533 Acesso em 15 fev. 2022

Por que o Espírito Santo é líder em transparência entre os estados brasileiros e o que isso tem a ver com melhorias em gestão e governo aberto?

Por Leandro Andrade do Nascimento, José Victor de Andrade Ramos, Izadora Estruzani Queiroz de Melo e Camila Galliza Fagundes* 

Você sabe qual o significado de Governo Aberto? Será que isso tem algum impacto na vida do cidadão comum? O fato de o Espírito Santo figurar como destaque em se tratando de transparência gera benefícios para a população capixaba?

Para responder a essas indagações, inicialmente, é preciso entender o conceito e as características de Governo Aberto. A Parceria para o Governo Aberto (Open Government Partnership – OGP) consiste em uma iniciativa internacional voltada à difusão e ao incentivo de práticas governamentais relacionadas à transparência, ao acesso à informação pública e à participação social, com o fim de aprimorar as democracias, combater a corrupção e fomentar a inovação na governança (CGU). Para tanto, a OGP congrega “governos, cidadãos, organizações da sociedade civil, universidades e setor privado com o objetivo de tornar os governos mais transparentes, participativos, responsáveis e responsivos” (CGE/SC). 

Feita essa abordagem geral sobre Governo Aberto, passamos a tratar da avaliação destacada do Espírito Santo em avaliações do grau de transparência na gestão pública dos estados brasileiros e como a transparência está relacionada à abertura dos governos e sua contribuição para uma gestão exitosa.

Sob o entendimento de que a transparência é um bom instrumento para conter a corrupção e que opera como um mecanismo indutor de gestões públicas responsáveis e abertas à participação social, inclusive promovendo a confiança da sociedade em relação ao poder público, a Controladoria-Geral da União – CGU desenvolve avaliações periódicas da transparência nos entes públicos. Para tanto, foi idealizada a Escala Brasil Transparente, EBT – Avaliação 360º, por meio da qual se realiza o monitoramento da transparência pública, tanto ativa quanto passiva, e o acompanhamento das ações implementadas por estados e municípios na promoção do acesso à informação. Seguindo essa metodologia, o Espírito Santo (Figuras 1 e 2), junto com Minas Gerais e Ceará, encontra-se na posição de liderança no ranking de transparência dos estados.

Figura 1: Desempenho do estado do Espírito Santo da Escala Brasil Transparente | Fonte: Mapa Brasil Transparente, 2021

Figura 2: Lançamento do Novo Portal de Transparência do estado do Espírito Santo e celebração do título de estado mais transparente do Brasil | Fonte: Governo do Espírito Santo, 2021

O Portal da Transparência do Poder Executivo do Espírito Santo, recentemente aprimorado, é uma ferramenta que “tem como foco o cidadão e o fortalecimento do controle social, contemplando informações sobre gastos públicos organizadas por área temática, com uma linguagem mais compreensível e com visual amigável, intuitivo e prático”, revestindo-se no compromisso do ente estatal em promover a transparência pública e, a partir disso, prevenir e combater a corrupção.

Um diferencial da política de transparência capixaba é a utilização da robô Maila (Monitoramento Automático das informações de Livre Acesso), empregada na verificação automática e em tempo real das informações no Portal de Transparência. Tal ferramenta foi concebida para resolver problemas de atualização dos dados de despesas em diferentes bases, buscando anomalias e erros nas informações, alcançando uma cobertura de 95% das consultas do Portal da Transparência.

Conforme se observa em excertos de consultas ao Portal de Transparência do Espírito Santo (figuras 3, 4, 5 e 6, a seguir), em único ambiente, por meio de poucos cliques, de forma extremamente simples e acessível, qualquer pessoa pode ter ciência de importantes informações de interesse coletivo no tocante à arrecadação e ao dispêndio de recursos públicos.   

Figura 3: Informações sobre receita, orçamento, despesas e transferências de recursos administrados pelo estado do Espírito Santo | Fonte: Portal da Transparência do Poder Executivo do Espírito Santo, 2021

Figura 4: Informações sobre despesas previstas por área de atuação governamental do estado do Espírito Santo para o exercício 2021 | Fonte: Portal da Transparência do Poder Executivo do Espírito Santo, 2021

Figura 5: Informações sobre despesas previstas por área de atuação governamental do estado do Espírito Santo para o exercício 2021 | Fonte: Portal da Transparência do Poder Executivo do Espírito Santo, 2021

Figura 6: Disponibilização de painéis interativos contendo diversas informações sobre temáticas de interesse público em áreas de atuação governamental do estado do Espírito Santo | Fonte: Portal da Transparência do Poder Executivo do Espírito Santo, 2021

Além de dados gerais compreensíveis pela população em geral, um importante recurso do portal de transparência capixaba é a possibilidade de acesso a informações mais robustas, completas e aprofundadas, de maneira a contemplar, além do cidadão comum, usuários do meio acadêmico, profissionais especializados, representantes do terceiro setor, imprensa e gestores públicos.

A análise da sistemática de disponibilização de dados por parte do estado do Espírito Santo permite concluir que o êxito não está em apenas publicar os dados, mas sim em estruturá-los, utilizá-los efetivamente e transformá-los em políticas públicas e melhores serviços para o cidadão. 

A comprovação dessa relevância foi possível por ocasião da pandemia de COVID-19, circunstância que ensejou a adoção de medidas de transparência específicas sobre informações de enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus.

A experiência e as boas práticas do estado do Espírito Santo em termos de transparência vem contribuindo para uma boa gestão da crise decorrente da pandemia de COVID-19, inclusive sendo circunstância objeto de reconhecimento pela liderança no “Índice de transparência da Covid-19 3.0”, promovido pela Open Knowledge Brasil, OKBR, organização da sociedade civil dedicada a promover o conhecimento livre por meio da transparência, da informação e da sabedoria. De acordo com esse ranking, o Espírito Santo é o estado da federação que mais bem disponibiliza informações sobre a pandemia (Figura 7), tais como os números da vacinação e o perfil das pessoas vacinadas.


Figura 7: Mapa do Índice de transparência da Covid-19 3.0 | Fonte: Monitor da transparência da Covid-19 da Open Knowledge Brasil (OKBR), 2021

Essa política exitosa do Espírito Santo já fora objeto de análise em texto de acadêmicos de Administração Pública, publicado neste blog do Politeia, e aponta para a plena possibilidade de ser replicada tanto em Santa Catarina quanto nos demais estados da federação.

Os dados abertos, passíveis de serem exportados em vários formatos (PDF, XLS, CSV e DOC), permitem à população em geral ter fácil e pleno conhecimento da distribuição geográfica dos casos de contaminação e da série histórica da pandemia por tipo de comorbidade, faixa etária, etnia, ocupação de leitos e custos, das providências adotadas quanto à observância dos critérios de priorização e distribuição das doses de vacinas por municípios, bem como subsidiam o planejamento e a tomada de decisão de todas as áreas envolvidas em ação de tamanha magnitude e complexidade, com destaque para a antecipação da reabertura das atividades econômicas.

Segundo Edmar Camata, Secretário de Estado de Controle e Transparência e outrora dirigente da organização da sociedade civil Transparência Capixaba, em entrevista publicada na página eletrônica da OKBR, em 20 de agosto de 2020, a disponibilização de dados sobre a gestão da pandemia no Espírito Santo “permitiu que pesquisadores e outros interessados pudessem ter acesso às informações para discutir e dialogar com os gestores públicos sobre o avanço da pandemia, as medidas de fechamento e reabertura no mesmo nível de conhecimento”. 

Na aba Dados Abertos do Portal da Transparência do Espírito Santo, há 16 conjuntos de dados acessíveis em formato aberto. Para além da saúde, há dados abertos sobre educação, patrimônio, obras, contratos, convênios, transferências para municípios, entre outros.   

Um outro avanço, de acordo com o Secretário, foi a superação de uma resistência cultural na área da saúde no tocante à proteção de informações de prontuários médicos, sobressaindo a compreensão de que a publicização de dados gerais, ineptos a individualizar e identificar os pacientes, não violam o direito à privacidade.

Em entrevista concedida ao programa Link ES, da emissora Record News do Espírito Santo, em 21 de junho de 2021, Edmar Camata assevera que a sensibilização e o engajamento do quadro de servidores quanto aos benefícios da transparência, aliados à desnecessidade de investimentos vultosos para sua implementação, contribuíram decisivamente para o quadro de destaque do Espírito Santo, tanto na Escala Brasil Transparente quanto no Índice de transparência da Covid-19 3.0. Observa, ainda, que toda essa evolução foi possível a partir da decisão política do Governador do Estado de considerar a transparência como compromisso e obrigação do poder público perante a sociedade.

Diante de todo o exposto acerca da experiência do estado do Espírito Santo, resta inconteste a relevância da efetiva aplicação dos preceitos de Governo Aberto com o fim de assegurar a centralidade do cidadão na implementação de políticas públicas visando a satisfação dos anseios e de suas necessidades, sendo fundamental o estabelecimento de uma aliança entre o poder público e a sociedade para a definição de prioridades e realização de controle social a partir dos princípios de transparência, participação cidadã, accountability e tecnologia e inovação. 

De maneira geral, além de outros benefícios, entende-se que a ideia de Governo Aberto assegura uma melhora na prestação de serviços públicos em razão de o ambiente de coprodução proporcionado pela participação social naturalmente ampliar o engajamento das pessoas nas causas coletivas. Essa situação caracteriza um sistema de retroalimentação, de maneira que quanto mais a sociedade participa, mais sente necessidade e interesse em participar, exigindo transparência de informações e accountability, aperfeiçoando os serviços públicos e aprimorando a prevenção à corrupção.

* Texto elaborado pelos acadêmicos de Administração Pública Leandro Andrade do Nascimento, José Victor de Andrade Ramos, Izadora Estruzani Queiroz de Melo e Camila Galliza Fagundes, no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, no segundo semestre de 2021.

REFERÊNCIAS

Blog da SISGOV. Transparência passiva e transparência ativa nos órgãos públicos: saiba a diferença. Disponível em: <https://www.sisgov.com/transparencia-passiva-e-transparencia-ativa-nos-orgaos-publicos-saiba-a-diferenca/>. Acesso em: 10 dez. 2021.

Controladoria-Geral da União. Governo Aberto – A OGP – O que é a iniciativa. Disponível em: <https://www.gov.br/cgu/pt-br/governo-aberto/a-ogp/o-que-e-a-iniciativa>. Acesso em: 05 dez. 2021.

Controladoria-Geral da União. Mapa Brasil Transparente. Disponível em: <https://mbt.cgu.gov.br/publico/home>. Acesso em: 07 dez. 2021.

Controladoria-Geral do Estado de Santa Catarina. Governo Aberto: participação social, transparência e inovação. Disponível em: <https://cge.sc.gov.br/governo-aberto/>. Acesso em: 05 dez. 2021.

Controladoria-Geral do Estado de Santa Catarina. 1º Plano de Ação SC Governo Aberto. Disponível em: <http://dados.sc.gov.br/dataset/e691c2fd-6b36-46cc-96c1-ca8c8b91b2f7/resource/18bb72a8-e2d8-419d-8f08-c20b63166763/download/1-plano-governo-aberto.pdf>. Acesso em: 06 dez. 2021.

Facebook Watch. Secretaria de Controle e Transparência – Secont ES. O Espírito Santo é o Estado mais transparente nos dados da vacinação. Disponível em: <https://www.facebook.com/watch/?v=1174861756271622&ref=sharing>. Acesso em: 10 dez. 2021.

Governo do Estado do Espírito Santo. Novo Portal da Transparência: mais completo e fácil de usar. Disponível em: <https://www.es.gov.br/Noticia/novo-portal-da-transparencia-mais-completo-e-facil-de-usar>. Acesso em: 09 dez. 2021.

Open Knowledge Brasil. Abertura de dados na pandemia vai deixar um legado importante, diz Secretário de Transparência do ES. Disponível em: <https://ok.org.br/noticia/abertura-de-dados-na-pandemia-vai-deixar-um-legado-importante-diz-secretario-de-transparencia-do-es/>. Acesso em: 10 fev. 2022.

Portal da Transparência do Poder Executivo do Espírito Santo. Dados Abertos. Disponível em: <https://transparencia.es.gov.br/DadosAbertos>. Acesso em: 09 dez. 2021.
Portal da Transparência do Poder Executivo do Espírito Santo. Quero Saber. Disponível em: <https://transparencia.es.gov.br/>. Acesso em: 10 dez. 2021.

A Accountability na Política Externa Brasileira

Por Rodrigo de Souza Pereira*

Em artigo publicado nos maiores jornais do País em 08 de maio de 2020, o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso e ex-Ministros das Relações Exteriores  manifestaram sua insatisfação com os rumos da política externa brasileira, a qual se caracterizaria pela sistemática violação dos princípios orientadores das relações internacionais do Brasil, definidos no art. 4º da Constituição de 19881. A diversidade de atores antecipa o tom da nota, que proclama a reconstrução da política externa brasileira, anseio que dá nome ao texto, por meio da defesa da Constituição Federal, da manutenção de princípios-chave à tradição diplomática brasileira e devida adequação da política externa à opinião pública nacional. 

Desse modo, em face da crescente insatisfação com a atuação brasileira recente na esfera das relações internacionais, este texto apresenta elementos do que seria a tradição da política externa brasileira e aponta mudanças que vêm acontecendo nas últimas décadas, discutindo possíveis vantagens e riscos da abertura a diversos atores e interesses. Assim, almeja compreender as possibilidades de accountability na política externa, com vistas a reforçar sua legitimidade, transparência e responsividade.

Do ponto de vista histórico, a política externa brasileira é reconhecida por sua tradição insular, simbolizada pelo papel centralizador desempenhado pelo Itamaraty na sua condução. Em meados dos anos 1990, entretanto, verificou-se um processo de descontinuidade desse encapsulamento, em decorrência de uma abertura que permitiu mais permeabilidade nas articulações, interesses e demandas em política externa. À época, novos grupos de pressão, formados por variados atores estatais e não-estatais, passaram a influenciar ativamente o processo de formulação da política externa, cujo formato inicial top-down passou a se assemelhar a um arranjo bottom-up (PIMENTA DE FARIA, 2011). 

As alterações se justificam pelas mudanças ocorridas no padrão de inserção internacional do País, que intensificou sua participação nas instâncias multilaterais, e pelos processos de globalização, liberalização econômica e revolução nos meios de comunicação. O aumento no grau de autonomia dos governos subnacionais, conferido com o advento da Constituição de 1988, é igualmente um fator responsável pela mudança de paradigma, tendo em vista que possibilitou a esses governantes defenderem seus interesses particulares de maneira mais veemente (PIMENTA DE FARIA, 2021).  A título de exemplo, tem-se a atuação proativa dos estados e municípios no âmbito da pandemia de COVID-19 no País, cuja atuação paradiplomática serviu de contraponto às controversas diretrizes adotadas pelo Governo Federal no suprimento de determinadas demandas sanitárias, tal como a aquisição de vacinas (CORREA, 2021).

No processo de elaboração da política externa, como nas demais políticas públicas, incidem demandas e conflitos de variados grupos domésticos (SALOMÓN; PINHEIRO, 2013).  Se por um lado essa multiplicidade de atores envolvidos é capaz de ampliar perspectivas e fomentar a legitimidade da atuação governamental, por outro, adiciona complexidade às funções de accountability, uma vez que dificulta a identificação de atores e agendas, inseridos no contexto de negociação política. Como uma forma de justificar o objetivo comum a ser perseguido pelo Estado no âmbito internacional, muito se empregou a noção simbólica de “interesse nacional”. Atualmente, contudo, muitas críticas têm sido conferidas a essa definição, dado que ela tende a simplificar a dialética das relações sociais e das negociações entre interesses públicos e privados no âmbito da política externa (PINHEIRO; MILANI, 2013). Em sociedades democráticas e complexas, é difícil imaginar a existência de um interesse ou uma política específica que contemple todas ou quase todas as forças políticas do Estado e da sociedade (JUNIOR; FARIAS, 2021).

No momento contemporâneo, é possível inclusive conferir à política externa brasileira a alcunha de “pós-diplomática”, visto que caracterizada por uma tendência de declínio do papel do Itamaraty em detrimento da atuação de outros órgãos burocráticos, partidos políticos e atores individuais (BELÉM LOPES, 2020). Na medida em que os temas de política externa se inserem no debate público, a tendência é que forças políticas em disputa apresentem diferentes projetos para o país e, uma vez no governo, procurem imprimir ações específicas e novas interpretações do que seja o interesse nacional (JUNIOR; FARIAS, 2021).

No que se refere à análise da política externa enquanto política pública, ressalta-se a necessidade primária de que haja transparência para que se possa avaliar os fundamentos políticos, a dimensão institucional, o desenho e os resultados dessas políticas (GONÇALVES; PINHEIRO, 2020). É nesse contexto  que se insere a importância de aplicação da accountability, cuja definição, para além da noção de transparência, reivindica o exercício do poder de agência com base em normas e valores democráticos que assegurem a legitimidade e a publicidade da ação (FILGUEIRAS, 2018). A accountability, além de estar atrelada às obrigações governamentais de prestação de contas, é um instrumento de controle social, por meio do qual pode a sociedade civil exigir informações, efeitos e  consequências das ações governamentais, com fins de realizar controle e construir confiança mútua entre governantes e cidadãos (TAVARES; ROMÃO, 2020).

Uma vez que a política externa vem incorporando novos atores, ideias e agendas, torna-se difícil entendê-la e explicá-la apontando apenas os seus resultados. É igualmente necessário analisar seu processo de formulação e implementação, bem como compreender seus princípios e valores fundamentais. Rompendo com princípios tradicionais da política externa brasileira, outrora reconhecida por sua moderação, equilíbrio e pela busca de consensos2, a política externa de Bolsonaro teve como base ideológica outros critérios, tais como o antiglobalismo, o anticomunismo e o nacionalismo religioso. A prática acompanhou o discurso, de modo que importantes mudanças estruturais foram realizadas na estrutura da corporação diplomática brasileira, destacando-se sobretudo a modificação de regras do Ministério das Relações Exteriores em relação à hierarquia, permitindo a ascensão de diplomatas ainda em meio de carreira para cargos-chave, e uma maior abertura à atuação de não-diplomatas no âmbito do Itamaraty (SARAIVA; ALBUQUERQUE, 2022).

O processo decisório em política externa passou a ser influenciado diretamente pelas disputas internas de grupos que formam a base de sustentação do governo3. Em artigo intitulado “Ideologia e Pragmatismo na Política Externa de Jair Bolsonaro”, Miriam Gomes Saraiva e Álvaro Vicente Costa Silva classificam o embate como uma tensão entre as duas alas, ideológica e pragmática, pelo comando da agenda. Esse processo de fragmentação, por sua vez, culminou no crescente afastamento de algumas bases de apoio do governo e levou à substituição de quadros da ala ideológica do Ministério. Após embate com o Senado4, o chanceler Ernesto Araújo foi substituído pelo embaixador Carlos Alberto Franco França, nomeado com fins de reduzir os pontos de atrito com parceiros externos, previsibilidade no comportamento internacional do país e resgatar a centralidade do corpo diplomático (SARAIVA; ALBUQUERQUE, 2022).

Diante do cenário atual, a adoção de mecanismos de accountability se apresenta como uma possibilidade para sublimar a crise de legitimidade, transparência e responsividade que nos assola. O processo de desencapsulamento em curso não pode se limitar à abertura da política externa aos atores afeitos às agendas do Executivo. É este o momento de pôr em prática a antiga demanda pela efetiva democratização da política externa, materializada na adoção de canais permanentes de diálogo e consulta com a sociedade civil organizada. Ainda que implique desafios à accountability, a pluralidade é fator essencial para a legitimação da política externa brasileira, temática de crescente relevância no debate político nacional5.

No âmbito da transparência, ressalta-se a importância da promoção do controle social e institucional, sobretudo por intermédio de uma atuação mais proativa do Senado Federal, a quem recai legalmente o papel de desempenhar o regime de freios e contrapesos no exercício da atividade pública internacional por parte do Poder Executivo (KALOUT, 2020). 

Por fim, é por meio da responsividade, dimensão-chave da accountability, que será feita a defesa dos princípios constitucionais que regem as relações internacionais do País, tão duramente atacados. Afinal, ainda que sujeita à dinâmica política, uma vez que é formulada e executada pelo representante do Executivo democraticamente eleito, a política externa não é um salvo-conduto concedido à Presidência, devendo seu processo de construção se adequar aos ditames legais existentes. Não há dúvida: carece de legitimidade uma atuação internacional que se contrapõe à Constituição. 

*Texto elaborado pelo acadêmico de administração pública Rodrigo de Souza Pereira, no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, no segundo semestre de 2021.

Notas

  1.  “Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: I – independência nacional; II – prevalência dos direitos humanos; III – autodeterminação dos povos; IV – não-intervenção; V – igualdade entre os Estados; VI – defesa da paz; VII – solução pacífica dos conflitos; VIII – repúdio ao terrorismo e ao racismo; IX – cooperação entre os povos para o progresso da humanidade; X – concessão de asilo político. Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações.” BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
  1. “Afasta-se, ademais, da vocação universalista da política externa brasileira e de sua capacidade de dialogar e estender pontes com diferentes países, desenvolvidos e em desenvolvimento, em benefício de nossos interesses”. Disponível em: <https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,a-reconstrucao-da-politica-externa-brasileira,7000329612>
  1. “O governo aglutinou setores muito diferentes e com visões diversas, que buscavam influenciar segmentos da política externa (olavistas, evangélicos, liberais na economia, militares e ruralistas exportadores de commodities) e eram conectados por intermédio de um líder predominante. A articulação entre eles, no entanto, era instável e deu-se apenas em torno da figura presidencial e das expectativas com a nova administração.” (SARAIVA; ALBUQUERQUE, 2022).
  1. CNN Brasil. 29/03/2021: Ernesto Araujo pede demissão do cargo de Ministro das Relações Exteriores: Disponível em <https://www.cnnbrasil.com.br/politica/ernesto-araujo-pede-demissao-do-cargo-de-ministro-de-relacoes-exteriores/>
  1.  Isto é – Dinheiro. 17/04/2021: Para ex-chanceleres, política externa vai pautar eleição. Disponível em: <https://www.istoedinheiro.com.br/para-ex-chanceleres-politica-externa-vai-pautar-eleicao/>

Referências

BELÉM LOPES, Dawisson. De-westernization, democratization, disconnection: the emergence of Brazil’s post-diplomatic foreign policy. Global Affairs, Volume 6 – Issue 2. 2020. Disponível em: <https://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/23340460.2020.1769494

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>

CARDOSO, Fernando Henrique; FERREIRA, Aloysio Nunes; AMORIM, Celso; LAFER, Celso; REZEK, Francisco; SERRA, José; RICUPERO, Rubens; KALOUT, Hussein. A Reconstrução da Política Externa Brasileira. O Globo. 08/05/2020. Disponível em: <https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,a-reconstrucao-da-politica-externa-brasileira,70003296122

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CONECTAS DIREITOS HUMANOS. Política Externa e Direitos Humanos: Estratégias de ação para a sociedade civil – Um olhar a partir da experiência da Conectas no Brasil. Série Conectas – Número 1. São Paulo. 2017. p. 10. Disponível em: <https://www.conectas.org/wp-content/uploads/2017/12/2013_Politica_Externa_E_Direitos_Humanos.pdf

CORREA, Silvia. A internacionalização dos governos locais na pandemia. Jornal Nexo. 16/12/2021. Disponível em: <https://www.nexojornal.com.br/academico/2021/12/16/A-internacionaliza%C3%A7%C3%A3o-dos-governos-locais-na-pandemia>

FILGUEIRAS, Fernando de Barros. Burocracias do controle, controle da burocracia e accountability no Brasil. Capítulo publicado em: Burocracia e políticas públicas no Brasil : interseções analíticas / organizadores: Roberto Pires, Gabriela Lotta, Vanessa Elias de Oliveira. – Brasília : Ipea : Enap, 2018. Disponível em: <http://repositorio.ipea.gov.br/handle/11058/8617

 ISTO É – Dinheiro. 17/04/2021: Para ex-chanceleres, política externa vai pautar eleição. Disponível em: <https://www.istoedinheiro.com.br/para-ex-chanceleres-politica-externa-vai-pautar-eleicao/>

JUNIOR, Haroldo Ramanzini e FARIAS, Rogério de Souza. Análise de Política Externa. Editora Contexto. 1ª edição. (2021).

KALOUT, Hussein. A perigosa inércia do Senado nos rumos da política externa brasileira. Jornal O Globo, 05/02/2020: Disponível em: <https://oglobo.globo.com/epoca/a-perigosa-inercia-do-senado-nos-rumos-da-politica-externa-brasileira-1-24231176>

GONÇALVES, Fernanda Nanci e PINHEIRO, Letícia. Análise de política externa: o que estudar e por quê?. InterSaberes; 1ª edição. 31 dezembro de 2020.

O GLOBO. A Reconstrução da Política Externa Brasileira. Disponível em: <https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,a-reconstrucao-da-politica-externa-brasileira,70003296122

PIMENTA DE FARIA, Carlos Alberto. Opinião pública e política externa: Insulamento, politização e reforma na produção da política exterior do Brasil. (2008). Rev. bras. polít. int. 51 (2). 2008. Disponível em: <https://www.scielo.br/j/rbpi/a/KcLn9ws8QNX8VQB5pvHQG3N/?lang=pt

PINHEIRO, Letícia e MILANI, Carlos R. S. Política externa brasileira: os desafios de sua caracterização como política pública. (2013). Contexto int. 35 (1). 2013. Disponível em: <https://www.scielo.br/j/cint/a/Dy6zLys78XTnTV8YFkY9ZJJ/abstract/?lang=pt

SALÓMON, Mónica e PINHEIRO, Leticia. Análise de Política Externa e Política Externa Brasileira: trajetória, desafios e possibilidades de um campo de estudos. (2013)  Rev. bras. polít. int. 56 (1). 2013. Disponível em: <https://www.scielo.br/j/rbpi/a/SktXpnzRXjptLV53R6XvGcF/abstract/?lang=pt

SARAIVA, Miriam Gomes e ALBUQUERQUE, Felipe Leal. Como mudar uma política externa? (2022). CEBRI. Brazilian Journal of International Affairs ∙ Ano 1 / Nº 1 / jan-mar 2022.

TAVARES, Paulino Varela e ROMÃO, Ana Lucia. Accountability e a Importância do Controle Social na administração Pública: Uma Análise Qualitativa. Brazilian Journal of Business. ​​v. 3, n. 1 (2021). Disponível em: <https://www.brazilianjournals.com/index.php/BJB/article/view/23530>

Acesso à informação sobre Covid-19 na relação entre a população da periferia de grandes cidades e profissionais de saúde: uma experiência na Cidade Estrutural, DF

Por Bruno César Miranda de Moura e Fabiana Pereira das Chagas*

Buscando conhecer mais sobre como diferentes perfis da população brasileira acessam informações sobre a Covid-19 e sobre os desafios da pesquisa em saúde, os acadêmicos de administração pública Bruno e Fabiana, da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc Esag), entrevistaram a convidada Loyane Mayara da Silva, profissional da saúde na área de Análises Clínicas pela Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS) de Brasília e estudante de Farmácia na Universidade de Brasília (UNB).

Loyane participou, em 2020/21, do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC), no projeto de validação de Métodos para diagnóstico e estimativas de prevalência pela infecção por SARS – CoV2 em três populações no Distrito Federal e Vigilância Ambulatorial e Custos Catastróficos em Área Vulnerável, além do Projeto MEC/UnB/FM-Ações integradas de pesquisa e serviço para o enfrentamento da pandemia de Covid-19 no Distrito Federal, desenvolvidos na Unidade Básica de Saúde (UBS 1) da Cidade Estrutural – DF.

Na entrevista, Loyane fala como desenvolveu seu trabalho numa região da Cidade Estrutural, no Distrito Federal, durante a pandemia, demonstrando as dificuldades enfrentadas pela equipe de pesquisadores diante da disseminação de informações falsas (fake news), ameaças aos pesquisadores, entre outros obstáculos ao buscar desenvolver uma linguagem acessível à comunidade para informar a respeito da pandemia de Covid-19. As estratégias desenvolvidas para lidar com esse desafio nos permitem aprender sobre accountability em pesquisa e em serviços públicos, articulação em redes, comunicação e relações entre profissionais e cidadãos, em seus diferentes perfis, capacidades e vulnerabilidades.

Aqui um trecho do que disse a entrevistada Loyane Mayara da Silva:

“Agradeço por mostrar tanto o lado da comunidade, quanto o lado científico, e quanto ao lado da desinformação e o lado de toda uma estrutura que a gente pode abraçar em tantos outros locais, em uma relação de saúde, educação e ciência, que são uma tríplice que andam juntos. O importante é abraçar isso com a população, para a saúde e educação.“

Confira a entrevista completa em vídeo disponível no YouTube

E conheça mais sobre a Cidade Estrutural, a pesquisa realizada, as estratégias adotadas e as aprendizagens: 

* Trabalho elaborado pelos acadêmicos de administração pública Bruno César Miranda de Moura e Fabiana Pereira das Chagas, no âmbito da disciplina sistemas de accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, no segundo semestre de 2021.

Órgãos de controle e o fortalecimento do sistema de accountability: interações, aprendizagens e acordos em prol do interesse público

Por Ellen Paola Franco e Maria Alice Martins*

  1. Introdução

Propõe-se, no presente texto, explanar sobre o desenvolvimento do sistema de accountability, relacionando-o com os vários tipos de controle na administração pública e sua articulação, uma vez que são interdependentes. Pretende-se elucidar que, na medida que todo o sistema se fortalece, ocorrem melhores resultados no todo. A fim de trazer exemplos práticos para ilustrar tal proposição, expõe-se o acordo de leniência, instrumento relativamente recente no Brasil, por meio do  qual os órgãos e agentes do sistema de controle estão aprendendo a colaborar para produzir acordos mais vantajosos para o interesse público. Denota-se que em muitos aspectos já se avançou nesse sentido, fomentando o controle externo e interno, mas  ainda há um longo caminho a percorrer.

1.1  A função controle e accountability

A ação do controle na Administração Pública brasileira é uma manifestação do Estado Democrático de Direito, buscando contribuir para que a gestão da coisa pública ocorra em conformidade aos princípios inerentes a ela pelo ordenamento jurídico. Segundo Castro (2008, p. 98), “a aplicação da noção democrática, no controle da atividade administrativa, resulta na elevação do grau de consensualidade e legitimação das atividades da Administração Pública.”.

A atividade de controle na administração pública pode ser classificada a partir da esfera de atuação onde é realizada. Desta forma, verificam-se estruturas da própria administração, que desempenham o controle interno, e órgãos de controle exteriores à estrutura administrativa, responsáveis por realizar o controle externo. Há, também, o controle social, realizado pelos cidadãos, organizações da sociedade civil e imprensa, e na interlocução entre sociedade e Estado, por meio de conselhos, ouvidorias, audiências públicas, entre outras.

Existem diferentes áreas de atuação do controle, ora complementares, ora sobrepostas, que podem ser da esfera federal, estadual ou  municipal (DI PIETRO, 2019). O controle pode ser enquadrado, ainda, como administrativo, quando da própria administração, controle legislativo, exercido pelos representantes do povo nas casas legislativas, e controle judicial, exercido pelo Poder Judiciário, que analisa, sobretudo, a legalidade dos atos administrativos. No tocante ao momento do exercício do controle, este pode ser prévio, antes do surgimento do ato, concomitante, quando presente em todas as etapas do ato, e posterior, após a emanação do ato (CASTRO, 2008).

O exercício do controle exige que haja transparência, tanto em relação ao objeto do controle quanto à atuação dos órgãos de controle e seus processos, para que sejam democráticos. Sobre a relação entre accountability, transparência, e controle, pode-se destacar que:

Buscando o significado da palavra accountability em dicionários, justamente para apreender com maior precisão o que o termo significa em inglês e como tem sido traduzido para o português, constatou-se que o significado do conceito envolve responsabilidade (objetiva e subjetiva), controle, transparência, obrigação de prestação de contas, justificativas para as ações que foram ou deixaram de ser empreendidas, premiação e/ou castigo. (PINHO; SACRAMENTO, p. 1364, 2009) 

É possível verificar que controlar atos e omissões da administração pública é importante para a melhoria da prestação dos serviços públicos e para a democracia, e, ainda que o aperfeiçoamento do controle relaciona-se à accountability (FERNANDES; TEIXEIRA, 2020). O controle é uma dimensão da accountability e controlar a atividade estatal figura-se como um dos eixos que dão sustentação ao regime democrático (PINHO; SACRAMENTO, 2009). Uma vez que o termo accountability pode adquirir mais de um significado, por ser um conceito multidimensional, pode ser entendido, dentre outras definições possíveis, por ser um processo permanente de avaliação e responsabilização dos agentes públicos, pelo uso do poder que lhes é concedido pela sociedade (ABRUCIO; LOUREIRO, 2005), estando, portanto, relacionado com a atividade desempenhada pelos órgãos de controle. Estas instituições, que controlam as ações das autoridades públicas e fazem parte da administração pública,  exercem accountability das atividades públicas (POLITIZE, 2022).

Faz-se necessário entender as principais diferenças entre os termos. Com base nos estudos de Dahl e Lindblom, Pó e Abrucio (2006) mencionam que controle é a capacidade de um ator em fazer que as pessoas em geral atendam às demandas, através de restrições e incentivos. Já a accountability, de forma mais ampla, para além do controle exercido pelas agências estatais, pressupõe a criação de condições para que o cidadão participe da avaliação e definição de políticas públicas, exercendo seu controle social, premiando ou punindo os responsáveis (Clad, 2000). Controle e accountability não são sinônimos, no entanto um não consegue existir sem o outro. Significa dizer que a accountability não existe se não houver o uso de instrumentos das instituições de controle (PÓ; ABRUCIO, 2006).

1.2  Órgãos de controle

Órgãos de controle na gestão pública são unidades administrativas que possuem o dever de fiscalizar os recursos públicos e a administração e criar mecanismos de melhoria da governança e combate à corrupção. De acordo com Di Pietro (2019, p. 922), “o controle constitui poder-dever a quem a lei atribui essa função, precisamente pela sua finalidade corretiva; ele não pode ser renunciado nem retardado, sob pena de responsabilidade de quem se omitiu”.

Existem órgãos específicos para diferentes hipóteses que necessitam de controle dentro da administração pública, como, por exemplo, a responsabilização dos gestores públicos por ato de improbidade, ou o combate à corrupção. São exemplos de órgãos de controle que atuam no combate à corrupção, na esfera federal, a Controladoria-Geral da União (CGU), a Polícia Federal (PF), o Tribunal de Contas da União (TCU), o Ministério Público Federal (MPF) e o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF). No âmbito dos estados e municípios, há órgãos de controle com função similar e complementar aos da esfera federal. Alguns atuam no controle interno, outros no controle externo.

O controle interno é desempenhado para que a administração pública atue em conformidade aos princípios impostos pelo ordenamento jurídico que garantem a boa gestão da coisa pública. Segundo Di Pietro (2019, p. 921), “no exercício de suas funções, a administração pública sujeita-se a controle por parte dos Poderes Legislativo e Judiciário, além de exercer, ela mesma, o controle sobre os próprios atos.”. Sendo este o controle interno, isto é, aquele controle que a administração exerce sobre seus próprios atos e agentes.

O controle externo está relacionado ao trabalho desempenhado pelos Tribunais de Contas, Ministério Público e pelo Legislativo. 

Há, ainda, o trabalho  desenvolvido pela ouvidoria pública, que de certo modo estabelece interfaces entre o controle interno e o controle social e até mesmo com o controle externo. A ouvidoria  faz o tratamento das reclamações, solicitações, denúncias, sugestões e elogios relativos às políticas e aos serviços públicos, e é responsável por garantir o direito de acesso à informação, bem como promover a transparência de forma proativa e espontânea, criando condições e mecanismos para o exercício do controle social (CGE/SC, 2021).

A correição visa aprimorar a gestão pública, tendo entre seus principais compromissos a prevenção e o combate à corrupção e o fortalecimento da integridade, abrange “atividades relacionadas à apuração de possíveis irregularidades cometidas por servidores e empregados públicos e à aplicação das devidas penalidades” (CGU, 2021).

Em suma, o controle  almeja fazer com que a administração atue em consonância com os princípios que lhe são impostos pelo ordenamento jurídico, como os da legalidade, moralidade, finalidade pública, publicidade, motivação e impessoalidade (DI PIETRO, 2019). Assim, os órgãos de controle, por meio de diversos mecanismos e interações entre eles,  são estruturas fundamentais para a gestão pública, desempenhando atividades que buscam contribuir para  a correta administração dos recursos públicos e a consecução melhor possível das atribuições do Estado.

  1. Órgãos de controle e acordos de leniência

Com a Reforma Administrativa instituída pela Emenda Constitucional nº 19/98 e da edição da Lei Complementar nº 101/2000, houve diversas mudanças na administração pública, agregando responsabilidades aos órgãos de controle, “que precisam mais do que nunca, elaborar, certificar, publicar e atualizar os demonstrativos de prestação de contas que asseguram a ampla transparência das ações do Governo” (COLOMBINI, 2014, p. 11). De lá para cá, houve fortalecimento dos órgãos e sistemas de controle, com várias frentes de articulação dos órgãos de controle entre si e deles com a sociedade civil. Houve também controvérsias e disputas sobre papéis, responsabilidades e modos de exercer o controle.

Em 2016, o Tribunal de Contas da União (TCU) e a Controladoria-Geral da União (CGU), fizeram um acordo técnico para unir forças na fiscalização das contas públicas. A proposta foi a de compartilhar conhecimento, experiências e tecnologia. Foi criado um sistema informatizado para otimizar a prestação de contas. O formato digital é importante para que  os órgãos de controle promovam  transparência compartilhando os dados (TCU, 2016).

Já em 2020, foi celebrado um novo acordo de cooperação técnica, agora entre MPF (Ministério Público Federal), CGU (Controladoria-Geral da União), Advocacia Geral da União (AGU),  Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) e o Tribunal de Contas da União (TCU), para o combate à corrupção, em relação ao acordo leniência, previsto na Lei  Lei Anticorrupção (Lei 12.846/2013). “O acordo [de leniência] é um instrumento sancionador negocial, celebrado com uma pessoa jurídica, que colabora, de livre e espontânea vontade, entregando informações e provas sobre os atos de corrupção de que tem conhecimento e sobre os quais assume a sua responsabilidade objetiva.” (CGU, 2021). O Capítulo V Art. 16 da Lei nº 12.846/2013 dispõe que  “a autoridade máxima de cada órgão ou entidade pública poderá celebrar acordo de leniência com as pessoas jurídicas responsáveis pela prática dos atos previstos nesta Lei que colaborem efetivamente com as investigações e o processo administrativo”. O objetivo do acordo de cooperação técnica entre os vários órgãos é ampliar a segurança jurídica aos acordos de leniência através do compartilhamento de informações, para potencializar as investigações, a fim de recuperar valores desviados da União (Site TCU, 2020).

Em Santa Catarina, em fevereiro de 2022, foi fechado o primeiro acordo de leniência do Estado, com uma grande empresa  de tecnologia, a  NEOWAY. Os valores de devolução ultrapassam 50 milhões de reais com atualização da taxa SELIC, valor referente a contratos firmados entre os anos de 2007 a 2019, com o Poder Executivo. São 17 contratos que estavam sendo investigados pela Polícia Federal e o Ministério Público Federal, em uma operação denominada hemorragia (Site SC INOVA, 2022). O montante deverá ser  pago em parcela única e devolvido aos cofres públicos. As negociações começaram em janeiro de 2021, após a troca de CEO da empresa e o envio da proposta de acordo para a Controladoria-Geral do Estado, CGE-SC. O processo teve a participação da Procuradoria Geral do Estado (SC NOVA, 2022). “A assinatura deste acordo é mais um marco inédito na história do Estado de Santa Catarina conquistado pela Controladoria-Geral do Estado”, afirma o auditor do Estado Cristiano Socas da Silva, Controlador-Geral do Estado (Site Governo do Estado de Santa Catarina, 2022). O termo do acordo será publicado em breve.

  1. Considerações finais e perspectivas

Fortalecendo a dimensão controle da accountability, é possível contribuir para inibir práticas ilícitas e corruptivas e aprimorar a gestão e os serviços públicos. O aprimoramento do sistema de controle depende da articulação, aprendizagem e desempenho dos órgãos estatais e, também, da transparência e abertura dos processos decisórios à participação de organizações privadas, da sociedade civil e do cidadão. Estes podem contribuir para os resultados e cobrar de seus governantes que cumpram seus papéis. Ainda, com a transparência, as informações precisam ser publicadas de forma que os indivíduos entendam o que está posto, e que tenham utilidade para que exerçam o controle social (MENEZES, 2021).

Assim, os sistemas de controle da administração pública propiciam o equilíbrio do poder e facilitam a construção de sociedades democráticas. Denota-se que uma gestão pública qualificada e um país mais justo é algo que se constrói com cidadãos ativos, servidores públicos qualificados e abertos à colaboração com os cidadãos (SCHOMMER; GUERZOVICH, 2015). Representando pontos a serem perseguidos pela administração pública brasileira. 

A atuação conjunta dos órgãos de controle, materializada nos acordos de leniência, exemplo trazido no texto, não evidencia a participação cidadã. Mesmo que seja positivo firmar esses acordos, é necessário seguir avançando em transparência nos trâmites e desdobramentos do processo, no fomento da articulação e aprendizagem compartilhada entre os órgãos, na instituição de modelos de avaliação de desempenho e na abertura para participação dos cidadãos, não só como espectadores, mas sendo consultados e convidados a conhecer e a decidir dentro do que for possível, e do que os afeta, sobre os encaminhamentos do processo.

Diante do que foi exposto no texto, cabe ressaltar a importância do desenvolvimento da função controle na administração pública, incluindo o controle exercido pela própria administração e pelos cidadãos. Destaca-se que é um caminho a percorrer, no qual muito já se avançou, mas ainda há  muito a avançar, por isso trazer o tema para o debate é de valor, para fomentar a temática e o seu fortalecimento.

* Texto elaborado em fevereiro de 2022, pelas acadêmicas de administração pública Maria Alice Martins e Ellen Paola Franco, no âmbito da disciplina sistemas de accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer.

Referências

ABRUCIO, Fernando Luiz; LOUREIRO, Maria Rita. Finanças públicas, democracia e accountability. In: ARVATE, Paulo Roberto; BIDERMAN, Ciro. Economia do Setor Público no Brasil. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005.

CASTRO, Rodrigo Pironti Aguirre de. Sistema de controle interno: uma perspectiva do modelo de gestão pública gerencial. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2008. CGU – Controladoria Geral da União. Institucional, 2021. Disponível em: <https://www.gov.br/cgu/pt-br/acesso-a-informacao/institucional>. Acesso em: 15 de dezembro de 2021.  

CUNILL GRAU, N. Responsabilización por el control social. In: CENTRO LATINOAMERICANO DE ADMINISTRACIÓN PARA EL DESARROLLO (CLAD). La responsabilización en la nueva gestión pública latinoamericana Buenos Aires: Eudeba, 2000.

CGE/SC, Controladoria Geral do Estado de Santa Catarina. Institucional. 2021. Disponível em: <https://cge.sc.gov.br/>. Acesso em: 15 de dezembro de 2021.

COLOMBINI, Tiago. Controle interno na Administração Pública como instrumento de Accountability: um estudo comparativo entre países, 2014. Disponível em <http://repositorio.utfpr.edu.br/jspui/handle/1/23037>. Acesso em 10 de fevereiro de 2022.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 32 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2019.

FERNANDES, Gustavo Andrey Almeida e TEIXEIRA, Marco Antonio Carvalho. Accountability ou Prestação de Contas, CGU ou Tribunais de Contas: o exame de diferentes visões sobre a atuação dos órgãos de controle nos municípios brasileiros. BASE – Revista de Administração e Contabilidade da Unisinos. 2020. Disponível em:<http://www.revistas.unisinos.br/index.php/base/article/view/base.2020.173.04/60747948>. Acesso em: 15 de dezembro de 2021.

MENEZES, Roberta Di Paula. APLICABILIDADE, CONTROLE E TRANSPARÊNCIA NAS AÇÕES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA BRASILEIRA, 2021. Disponível em <doi.org/10.51891/rease.v7i7.1679>. Acesso em 8 de fevereiro de 2022.

PINHO, José Antonio Gomes de; SACRAMENTO, Ana Rita Silva. Accountability: já podemos traduzi-la para o português?. Rio de Janeiro: Revista de Administração Pública, 2009.

PÓ, Marcos Vinicius; ABRUCIO, Fernando Luiz. Desenho e funcionamento dos mecanismos de controle e accountability das agências reguladoras brasileiras: semelhanças e diferenças. 2006. Disponível em <https://doi.org/10.1590/S0034-76122006000400009>. Acesso em 9 de fevereiro de 2022.

República Federativa do Brasil. ACORDO DE COOPERAÇÃO TÉCNICA QUE ENTRE SI CELEBRAM O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, A CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO (CGU), A ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (AGU),O MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E SEGURANÇA PÚBLICA (MJSP) EO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU) EM MATÉRIA DE COMBATE À CORRUPÇÃO NO BRASIL, ESPECIALMENTE EM RELAÇÃO AOS ACORDOS DE LENIÊNCIA DA LEI Nº 12.846, DE 2013. Disponivel em <https://portal.tcu.gov.br/data/files/11/16/BB/03/575C37109EB62737F18818A8/ACORDO%20DE%20COOPERACAO%20TECNICA%20_1_.pdf>. Acesso em 10 de fevereiro de 2022

SANTA CATARINA. Governo do Estado de Santa Catarina. 7 de fevereiro de 2022. Primeiro acordo de leniência da história do Governo de Santa Catarina resulta na devolução de R $50,6 milhões aos cofres públicos. Disponivel em <https://www.sc.gov.br/noticias/temas/justica-e-defesa-da-cidadania/primeiro-acordo-de-leniencia-da-historia-do-governo-de-santa-catarina-resulta-na-devolucao-de-r-50-6-milhoes-aos-cofres-publicos>. Acesso em 13 de fevereiro de 2022.

SC INOVA. Neoway: devolução de R $50,6 milhões ao governo de SC em acordo de leniência. 07 de fevereiro de 2022. Disponível em <https://scinova.com.br/neoway-devolucao-de-r-506-milhoes-ao-governo-de-sc-em-acordo-de-leniencia/>, Acesso em 13 de fevereiro de 2022.

SISGOV. Transparência na gestão pública: o que é e como surgiu?. Disponível em <https://www.sisgov.com/transparencia-na-gestao-publica-o-que-e-e-como-surgiu/>. Acesso em 10 de fevereiro de 2022.

SCHOMMER, Paula Chies; GUERZOVICH, Florencia. Histórias por trás da história: do combate à corrupção à coprodução do controle nos municípios brasileiros. 2015. Disponível em: <https://politica.estadao.com.br/blogs/gestao-politica-esociedade/historias-por-tras-da-historia-do-combate-a-corrupcao-a-coproducao-do-controlenos-municipios-brasileiros/ >. Acesso em 17 de fevereiro de 2022.

TCE, Tribunal de Contas do Estado da Bahia. Seminário discute controle e transparência na gestão pública. Disponível em <https://www.tce.ba.gov.br/noticias/o-controle-e-apenas-o-meio-a-finalidade-e-a-melhoria-do-servico-publico>.  Acesso em 10 de fevereiro de 2022.

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TCU. Tribunal de Contas da União. Cooperação técnica define protocolo para compartilhamento de informações nos acordos de leniência. 06 de agosto de 2020. Disponível em <https://portal.tcu.gov.br/imprensa/noticias/cooperacao-tecnica-define-protocolo-para-compartilhamento-de-informacoes-nos-acordos-de-leniencia.htm>. Acesso em 10 de fevereiro de 2022.

Desinformação, mídia e o controle na pandemia de COVID-19

Por Karina Karim da Costa Martins*

Informação é poder. Em tempos de pandemia, essa máxima tornou-se ainda mais imperativa, pois se trata de uma situação sem precedentes, com uma doença até então desconhecida pela comunidade científica e cujo combate precisa ser realizado conjuntamente.

Essencial ao controle, a informação, tratada nesse texto de maneira ampla – como requisito para o enfrentamento à doença e fiscalização/monitoramento das instituições e suas ações durante a pandemia – tem mostrado como sua presença ou ausência influencia na tomada de decisão dos agentes públicos e dos cidadãos.

O pujante acesso à informação pode ser apontado como um diferencial se compararmos esta pandemia a outras que assolaram o mundo em momentos remotos da história mundial. O combate à peste bubônica, à varíola e à gripe espanhola não dispunham de informações, quase em tempo real, como temos hoje, acerca das mais recentes descobertas e recomendações sobre os surtos.

No entanto, o que se pode observar durante os recentes eventos no Brasil, é a utilização da informação com propósitos nem sempre louváveis, ou de forma parcial ou distorcida, bem como a difusão deliberada de desinformação. Como apontado por Recuero et al. (2020), a epidemia é utilizada por diversos atores do segmento político no propósito de mobilizar ainda mais a população na direção de uma suposta polarização e do apoio irrefletido a certas ideias e práticas.

A sociedade, em sua necessidade de se inteirar dos fatos e prevenir-se da doença, busca notícias como nunca acerca da situação pandêmica, com o desafio de discernir o fato do fake, que, segundo Cantuário (2020), baseia-se em opiniões, rumores e teorias da conspiração ao invés de estudos e dados confiáveis. A sociedade vive, portanto, uma segunda pandemia, a infodemia.

Nesse cenário, a mídia apresenta papel primordial. Apesar do vultoso fluxo de informações falsas e distorcidas que circulam cotidianamente em vários países, esse segmento de controle sobre o governo busca ferramentas para coibir a propagação de material distorcido e cobra das autoridades e grandes empresas de veiculação de conteúdo, posturas e ações que possibilitem o mínimo de qualidade informativa aos cidadãos.

Com a criação do Consórcio de Veículos de Imprensa, a mídia brasileira assumiu o protagonismo da transparência de dados básicos e pressionou o governo quanto à divulgação correta de dados, uma vez que a instalação do referido consórcio deixava claro a inoperância do governo federal na articulação e divulgação dos dados. Ademais, assumiu a vanguarda na divulgação de campanhas de vacinação de combate à COVID.

Não obstante, percebem-se iniciativas das próprias empresas de mídia e a pressão social pela adoção de medidas que coíbam a veiculação das chamadas fake news. As mídias sociais passaram a adotar procedimentos na tentativa de monitorar suas redes e de excluir conteúdo não comprovado; colaborando para com aquela parcela da sociedade que, por conveniência ou necessidade, utiliza-se das redes sociais e sites de notícias como única fonte de informação.

O posicionamento apático e atravancador do governo federal foi bastante divulgado pela mídia, tendo como ápice a cobertura da CPI da COVID, conduzida pelo Senado Federal no período de 27 de abril de 2021 a 26 de outubro de 2021, na qual a população pôde ter contato com uma parte, mesmo que ainda superficial, dos bastidores do poder.

Por outro lado, percebeu-se na mídia o uso de algoritmos e a limitação de conteúdos de acesso gratuito, que contribuíram para a formação das bolhas de desinformação, nas quais, conforme Nemer (2020), as pessoas só encontram informações que corroboram com sua opinião.

Considerando a desigualdade social, acentuada pelo período, informar-se se tornou um desafio ainda maior para uma grande parcela da sociedade. A iniquidade mostra-se latente num momento em que o desemprego assola o país e volta-se a atingir elevados níveis de pobreza. Verifica-se então uma limitação da mídia, que nem sempre facilita o acesso a informações qualificadas e isoladamente é incapaz de mobilizar a sociedade para tomar atitudes assertivas no combate à doença e cobrar dos governantes acerca de suas responsabilidades.

Por fim, pode-se inferir que exigir transparência dos dados tornou-se questão de sobrevivência, no intento do combate à doença e seu controle. Apesar de, em parte, colaborar com a desinformação, há de se destacar o papel positivo da mídia durante a pandemia. A enxurrada de informação traz à tona o lado negativo e positivo da exposição ao excesso de conteúdo, nem sempre verificado. Sendo assim, percebe-se que mesmo com a transparência comprometida pela falta de engajamento de autoridades na disponibilização dos dados sobre a pandemia, constatou-se movimentação da mídia no intuito de promover-se algum controle num momento caótico.

Referências

CANTUÁRIO, Victor André Pinheiro. “Isso é verdade?” – a “infodemia” da pandemia: considerações sobre a desinformação no combate à COVID-19. 2020.https://periodicos.unifap.br/index.php/investigacaofilosofica/article/view/5934. Acesso em nov. 2021.

NEMER, David. Desinformação no contexto da pandemia do Coronavírus (COVID-19). 2020. https://revistas.ufpr.br/atoz/article/view/77227/42052. Acesso em nov. 2021.

RECUERO, R; Soares, F. B.; VINHAS, O.; Volcan, T.; ZAGO, G.; STUMPF, E. M.; Viegas, P.; HÜTTNER, L. G.; Bonoto, C.; SILVA, G.; Passos, I.; SALGUEIRO, I.; SODRÉ, G.. Desinformação, Mídia Social e Covid-19 no Brasil: Relatório, resultados e estratégias de combate. Relatório de Pesquisa. 2020. https://wp.ufpel.edu.br/midiars/2021/05/17/desinformacao-sobre-covid-19-na-midia-social-brasileira-laboratorio-midiars-divulga-relatorio-de-pesquisa/. Acesso em nov. 2021.

*Texto elaborado por Karina Karim da Costa Martins, no âmbito da disciplina na disciplina Tópicos Especiais em Gestão Pública e Coprodução: Controle, Accountability e Coprodução, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, com colaboração do professor Arlindo Carvalho Rocha, no segundo semestre de 2021, no Programa de Pós-Graduação em Administração do Centro de Ciências da Administração (Esag) da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc).