‘Governance & Systems Convening’ é tema de conversa no dia 04 de março

O diálogo é promovido pelo Politeia Udesc Esag e #Act4Delivery, do Brasil, e PSAM/Universidade de Rhodes, da África do Sul

Contaremos com a participação de pessoas de diversos países, que atuam em diferentes temas e contextos, buscando responder a desafios complexos, articulando pessoas, recursos e instrumentos para gerar mudanças graduais e sistêmicas.

O evento online será na sexta-feira, 04 de março, às 11h (horário Brasil).

É aberto a todas as pessoas que queiram refletir sobre suas próprias práticas, conhecer sobre systems convening e compartilhar aprendizagens com pessoas de vários lugares.

Inscrição prévia no seguinte link : https://bit.ly/3p9FxLK

Para saber mais sobre o conceito e a prática de systems convening – baseado num livro de Etienne e Bev Wenger-Trayner: http://wenger-trayner.com/systems-convening/

Capa do livro Systems Convening – Disponível para download gratuito em https://wenger-trayner.com/systems-convening/

O livro inclui menção ao trabalho da professora Paula Schommer, conforme divulgado pela Udesc Esag quando do lançamento do livro.


Nesse post, Rachel Gondo e Florencia Guerzovich escrevem sobre seu encontro com o conceito  https://medium.com/@florcig/social-accountability-practitioners-as-system-conveners-33b77c8a4778

A Accountability na Política Externa Brasileira

Por Rodrigo de Souza Pereira*

Em artigo publicado nos maiores jornais do País em 08 de maio de 2020, o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso e ex-Ministros das Relações Exteriores  manifestaram sua insatisfação com os rumos da política externa brasileira, a qual se caracterizaria pela sistemática violação dos princípios orientadores das relações internacionais do Brasil, definidos no art. 4º da Constituição de 19881. A diversidade de atores antecipa o tom da nota, que proclama a reconstrução da política externa brasileira, anseio que dá nome ao texto, por meio da defesa da Constituição Federal, da manutenção de princípios-chave à tradição diplomática brasileira e devida adequação da política externa à opinião pública nacional. 

Desse modo, em face da crescente insatisfação com a atuação brasileira recente na esfera das relações internacionais, este texto apresenta elementos do que seria a tradição da política externa brasileira e aponta mudanças que vêm acontecendo nas últimas décadas, discutindo possíveis vantagens e riscos da abertura a diversos atores e interesses. Assim, almeja compreender as possibilidades de accountability na política externa, com vistas a reforçar sua legitimidade, transparência e responsividade.

Do ponto de vista histórico, a política externa brasileira é reconhecida por sua tradição insular, simbolizada pelo papel centralizador desempenhado pelo Itamaraty na sua condução. Em meados dos anos 1990, entretanto, verificou-se um processo de descontinuidade desse encapsulamento, em decorrência de uma abertura que permitiu mais permeabilidade nas articulações, interesses e demandas em política externa. À época, novos grupos de pressão, formados por variados atores estatais e não-estatais, passaram a influenciar ativamente o processo de formulação da política externa, cujo formato inicial top-down passou a se assemelhar a um arranjo bottom-up (PIMENTA DE FARIA, 2011). 

As alterações se justificam pelas mudanças ocorridas no padrão de inserção internacional do País, que intensificou sua participação nas instâncias multilaterais, e pelos processos de globalização, liberalização econômica e revolução nos meios de comunicação. O aumento no grau de autonomia dos governos subnacionais, conferido com o advento da Constituição de 1988, é igualmente um fator responsável pela mudança de paradigma, tendo em vista que possibilitou a esses governantes defenderem seus interesses particulares de maneira mais veemente (PIMENTA DE FARIA, 2021).  A título de exemplo, tem-se a atuação proativa dos estados e municípios no âmbito da pandemia de COVID-19 no País, cuja atuação paradiplomática serviu de contraponto às controversas diretrizes adotadas pelo Governo Federal no suprimento de determinadas demandas sanitárias, tal como a aquisição de vacinas (CORREA, 2021).

No processo de elaboração da política externa, como nas demais políticas públicas, incidem demandas e conflitos de variados grupos domésticos (SALOMÓN; PINHEIRO, 2013).  Se por um lado essa multiplicidade de atores envolvidos é capaz de ampliar perspectivas e fomentar a legitimidade da atuação governamental, por outro, adiciona complexidade às funções de accountability, uma vez que dificulta a identificação de atores e agendas, inseridos no contexto de negociação política. Como uma forma de justificar o objetivo comum a ser perseguido pelo Estado no âmbito internacional, muito se empregou a noção simbólica de “interesse nacional”. Atualmente, contudo, muitas críticas têm sido conferidas a essa definição, dado que ela tende a simplificar a dialética das relações sociais e das negociações entre interesses públicos e privados no âmbito da política externa (PINHEIRO; MILANI, 2013). Em sociedades democráticas e complexas, é difícil imaginar a existência de um interesse ou uma política específica que contemple todas ou quase todas as forças políticas do Estado e da sociedade (JUNIOR; FARIAS, 2021).

No momento contemporâneo, é possível inclusive conferir à política externa brasileira a alcunha de “pós-diplomática”, visto que caracterizada por uma tendência de declínio do papel do Itamaraty em detrimento da atuação de outros órgãos burocráticos, partidos políticos e atores individuais (BELÉM LOPES, 2020). Na medida em que os temas de política externa se inserem no debate público, a tendência é que forças políticas em disputa apresentem diferentes projetos para o país e, uma vez no governo, procurem imprimir ações específicas e novas interpretações do que seja o interesse nacional (JUNIOR; FARIAS, 2021).

No que se refere à análise da política externa enquanto política pública, ressalta-se a necessidade primária de que haja transparência para que se possa avaliar os fundamentos políticos, a dimensão institucional, o desenho e os resultados dessas políticas (GONÇALVES; PINHEIRO, 2020). É nesse contexto  que se insere a importância de aplicação da accountability, cuja definição, para além da noção de transparência, reivindica o exercício do poder de agência com base em normas e valores democráticos que assegurem a legitimidade e a publicidade da ação (FILGUEIRAS, 2018). A accountability, além de estar atrelada às obrigações governamentais de prestação de contas, é um instrumento de controle social, por meio do qual pode a sociedade civil exigir informações, efeitos e  consequências das ações governamentais, com fins de realizar controle e construir confiança mútua entre governantes e cidadãos (TAVARES; ROMÃO, 2020).

Uma vez que a política externa vem incorporando novos atores, ideias e agendas, torna-se difícil entendê-la e explicá-la apontando apenas os seus resultados. É igualmente necessário analisar seu processo de formulação e implementação, bem como compreender seus princípios e valores fundamentais. Rompendo com princípios tradicionais da política externa brasileira, outrora reconhecida por sua moderação, equilíbrio e pela busca de consensos2, a política externa de Bolsonaro teve como base ideológica outros critérios, tais como o antiglobalismo, o anticomunismo e o nacionalismo religioso. A prática acompanhou o discurso, de modo que importantes mudanças estruturais foram realizadas na estrutura da corporação diplomática brasileira, destacando-se sobretudo a modificação de regras do Ministério das Relações Exteriores em relação à hierarquia, permitindo a ascensão de diplomatas ainda em meio de carreira para cargos-chave, e uma maior abertura à atuação de não-diplomatas no âmbito do Itamaraty (SARAIVA; ALBUQUERQUE, 2022).

O processo decisório em política externa passou a ser influenciado diretamente pelas disputas internas de grupos que formam a base de sustentação do governo3. Em artigo intitulado “Ideologia e Pragmatismo na Política Externa de Jair Bolsonaro”, Miriam Gomes Saraiva e Álvaro Vicente Costa Silva classificam o embate como uma tensão entre as duas alas, ideológica e pragmática, pelo comando da agenda. Esse processo de fragmentação, por sua vez, culminou no crescente afastamento de algumas bases de apoio do governo e levou à substituição de quadros da ala ideológica do Ministério. Após embate com o Senado4, o chanceler Ernesto Araújo foi substituído pelo embaixador Carlos Alberto Franco França, nomeado com fins de reduzir os pontos de atrito com parceiros externos, previsibilidade no comportamento internacional do país e resgatar a centralidade do corpo diplomático (SARAIVA; ALBUQUERQUE, 2022).

Diante do cenário atual, a adoção de mecanismos de accountability se apresenta como uma possibilidade para sublimar a crise de legitimidade, transparência e responsividade que nos assola. O processo de desencapsulamento em curso não pode se limitar à abertura da política externa aos atores afeitos às agendas do Executivo. É este o momento de pôr em prática a antiga demanda pela efetiva democratização da política externa, materializada na adoção de canais permanentes de diálogo e consulta com a sociedade civil organizada. Ainda que implique desafios à accountability, a pluralidade é fator essencial para a legitimação da política externa brasileira, temática de crescente relevância no debate político nacional5.

No âmbito da transparência, ressalta-se a importância da promoção do controle social e institucional, sobretudo por intermédio de uma atuação mais proativa do Senado Federal, a quem recai legalmente o papel de desempenhar o regime de freios e contrapesos no exercício da atividade pública internacional por parte do Poder Executivo (KALOUT, 2020). 

Por fim, é por meio da responsividade, dimensão-chave da accountability, que será feita a defesa dos princípios constitucionais que regem as relações internacionais do País, tão duramente atacados. Afinal, ainda que sujeita à dinâmica política, uma vez que é formulada e executada pelo representante do Executivo democraticamente eleito, a política externa não é um salvo-conduto concedido à Presidência, devendo seu processo de construção se adequar aos ditames legais existentes. Não há dúvida: carece de legitimidade uma atuação internacional que se contrapõe à Constituição. 

*Texto elaborado pelo acadêmico de administração pública Rodrigo de Souza Pereira, no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, no segundo semestre de 2021.

Notas

  1.  “Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: I – independência nacional; II – prevalência dos direitos humanos; III – autodeterminação dos povos; IV – não-intervenção; V – igualdade entre os Estados; VI – defesa da paz; VII – solução pacífica dos conflitos; VIII – repúdio ao terrorismo e ao racismo; IX – cooperação entre os povos para o progresso da humanidade; X – concessão de asilo político. Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações.” BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
  1. “Afasta-se, ademais, da vocação universalista da política externa brasileira e de sua capacidade de dialogar e estender pontes com diferentes países, desenvolvidos e em desenvolvimento, em benefício de nossos interesses”. Disponível em: <https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,a-reconstrucao-da-politica-externa-brasileira,7000329612>
  1. “O governo aglutinou setores muito diferentes e com visões diversas, que buscavam influenciar segmentos da política externa (olavistas, evangélicos, liberais na economia, militares e ruralistas exportadores de commodities) e eram conectados por intermédio de um líder predominante. A articulação entre eles, no entanto, era instável e deu-se apenas em torno da figura presidencial e das expectativas com a nova administração.” (SARAIVA; ALBUQUERQUE, 2022).
  1. CNN Brasil. 29/03/2021: Ernesto Araujo pede demissão do cargo de Ministro das Relações Exteriores: Disponível em <https://www.cnnbrasil.com.br/politica/ernesto-araujo-pede-demissao-do-cargo-de-ministro-de-relacoes-exteriores/>
  1.  Isto é – Dinheiro. 17/04/2021: Para ex-chanceleres, política externa vai pautar eleição. Disponível em: <https://www.istoedinheiro.com.br/para-ex-chanceleres-politica-externa-vai-pautar-eleicao/>

Referências

BELÉM LOPES, Dawisson. De-westernization, democratization, disconnection: the emergence of Brazil’s post-diplomatic foreign policy. Global Affairs, Volume 6 – Issue 2. 2020. Disponível em: <https://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/23340460.2020.1769494

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>

CARDOSO, Fernando Henrique; FERREIRA, Aloysio Nunes; AMORIM, Celso; LAFER, Celso; REZEK, Francisco; SERRA, José; RICUPERO, Rubens; KALOUT, Hussein. A Reconstrução da Política Externa Brasileira. O Globo. 08/05/2020. Disponível em: <https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,a-reconstrucao-da-politica-externa-brasileira,70003296122

CNN Brasil. 29/03/2021: Ernesto Araujo pede demissão do cargo de Ministro das Relações Exteriores: Disponível em <https://www.cnnbrasil.com.br/politica/ernesto-araujo-pede-demissao-do-cargo-de-ministro-de-relacoes-exteriores/>

CONECTAS DIREITOS HUMANOS. Política Externa e Direitos Humanos: Estratégias de ação para a sociedade civil – Um olhar a partir da experiência da Conectas no Brasil. Série Conectas – Número 1. São Paulo. 2017. p. 10. Disponível em: <https://www.conectas.org/wp-content/uploads/2017/12/2013_Politica_Externa_E_Direitos_Humanos.pdf

CORREA, Silvia. A internacionalização dos governos locais na pandemia. Jornal Nexo. 16/12/2021. Disponível em: <https://www.nexojornal.com.br/academico/2021/12/16/A-internacionaliza%C3%A7%C3%A3o-dos-governos-locais-na-pandemia>

FILGUEIRAS, Fernando de Barros. Burocracias do controle, controle da burocracia e accountability no Brasil. Capítulo publicado em: Burocracia e políticas públicas no Brasil : interseções analíticas / organizadores: Roberto Pires, Gabriela Lotta, Vanessa Elias de Oliveira. – Brasília : Ipea : Enap, 2018. Disponível em: <http://repositorio.ipea.gov.br/handle/11058/8617

 ISTO É – Dinheiro. 17/04/2021: Para ex-chanceleres, política externa vai pautar eleição. Disponível em: <https://www.istoedinheiro.com.br/para-ex-chanceleres-politica-externa-vai-pautar-eleicao/>

JUNIOR, Haroldo Ramanzini e FARIAS, Rogério de Souza. Análise de Política Externa. Editora Contexto. 1ª edição. (2021).

KALOUT, Hussein. A perigosa inércia do Senado nos rumos da política externa brasileira. Jornal O Globo, 05/02/2020: Disponível em: <https://oglobo.globo.com/epoca/a-perigosa-inercia-do-senado-nos-rumos-da-politica-externa-brasileira-1-24231176>

GONÇALVES, Fernanda Nanci e PINHEIRO, Letícia. Análise de política externa: o que estudar e por quê?. InterSaberes; 1ª edição. 31 dezembro de 2020.

O GLOBO. A Reconstrução da Política Externa Brasileira. Disponível em: <https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,a-reconstrucao-da-politica-externa-brasileira,70003296122

PIMENTA DE FARIA, Carlos Alberto. Opinião pública e política externa: Insulamento, politização e reforma na produção da política exterior do Brasil. (2008). Rev. bras. polít. int. 51 (2). 2008. Disponível em: <https://www.scielo.br/j/rbpi/a/KcLn9ws8QNX8VQB5pvHQG3N/?lang=pt

PINHEIRO, Letícia e MILANI, Carlos R. S. Política externa brasileira: os desafios de sua caracterização como política pública. (2013). Contexto int. 35 (1). 2013. Disponível em: <https://www.scielo.br/j/cint/a/Dy6zLys78XTnTV8YFkY9ZJJ/abstract/?lang=pt

SALÓMON, Mónica e PINHEIRO, Leticia. Análise de Política Externa e Política Externa Brasileira: trajetória, desafios e possibilidades de um campo de estudos. (2013)  Rev. bras. polít. int. 56 (1). 2013. Disponível em: <https://www.scielo.br/j/rbpi/a/SktXpnzRXjptLV53R6XvGcF/abstract/?lang=pt

SARAIVA, Miriam Gomes e ALBUQUERQUE, Felipe Leal. Como mudar uma política externa? (2022). CEBRI. Brazilian Journal of International Affairs ∙ Ano 1 / Nº 1 / jan-mar 2022.

TAVARES, Paulino Varela e ROMÃO, Ana Lucia. Accountability e a Importância do Controle Social na administração Pública: Uma Análise Qualitativa. Brazilian Journal of Business. ​​v. 3, n. 1 (2021). Disponível em: <https://www.brazilianjournals.com/index.php/BJB/article/view/23530>

Acesso à informação sobre Covid-19 na relação entre a população da periferia de grandes cidades e profissionais de saúde: uma experiência na Cidade Estrutural, DF

Por Bruno César Miranda de Moura e Fabiana Pereira das Chagas*

Buscando conhecer mais sobre como diferentes perfis da população brasileira acessam informações sobre a Covid-19 e sobre os desafios da pesquisa em saúde, os acadêmicos de administração pública Bruno e Fabiana, da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc Esag), entrevistaram a convidada Loyane Mayara da Silva, profissional da saúde na área de Análises Clínicas pela Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS) de Brasília e estudante de Farmácia na Universidade de Brasília (UNB).

Loyane participou, em 2020/21, do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC), no projeto de validação de Métodos para diagnóstico e estimativas de prevalência pela infecção por SARS – CoV2 em três populações no Distrito Federal e Vigilância Ambulatorial e Custos Catastróficos em Área Vulnerável, além do Projeto MEC/UnB/FM-Ações integradas de pesquisa e serviço para o enfrentamento da pandemia de Covid-19 no Distrito Federal, desenvolvidos na Unidade Básica de Saúde (UBS 1) da Cidade Estrutural – DF.

Na entrevista, Loyane fala como desenvolveu seu trabalho numa região da Cidade Estrutural, no Distrito Federal, durante a pandemia, demonstrando as dificuldades enfrentadas pela equipe de pesquisadores diante da disseminação de informações falsas (fake news), ameaças aos pesquisadores, entre outros obstáculos ao buscar desenvolver uma linguagem acessível à comunidade para informar a respeito da pandemia de Covid-19. As estratégias desenvolvidas para lidar com esse desafio nos permitem aprender sobre accountability em pesquisa e em serviços públicos, articulação em redes, comunicação e relações entre profissionais e cidadãos, em seus diferentes perfis, capacidades e vulnerabilidades.

Aqui um trecho do que disse a entrevistada Loyane Mayara da Silva:

“Agradeço por mostrar tanto o lado da comunidade, quanto o lado científico, e quanto ao lado da desinformação e o lado de toda uma estrutura que a gente pode abraçar em tantos outros locais, em uma relação de saúde, educação e ciência, que são uma tríplice que andam juntos. O importante é abraçar isso com a população, para a saúde e educação.“

Confira a entrevista completa em vídeo disponível no YouTube

E conheça mais sobre a Cidade Estrutural, a pesquisa realizada, as estratégias adotadas e as aprendizagens: 

* Trabalho elaborado pelos acadêmicos de administração pública Bruno César Miranda de Moura e Fabiana Pereira das Chagas, no âmbito da disciplina sistemas de accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, no segundo semestre de 2021.

A Associação dos Pacientes Renais de Santa Catarina e como a prestação de contas pode ser aliada para a credibilidade de organizações da sociedade civil

Por Guilherme Zomer, Juventino Neto, Luã Costa e Nathan Vieira*

Muitos veem a prestação de contas como uma formalidade burocrática, porém ela pode ter uma grande importância para as organizações da sociedade civil e ser um fator primordial para a legitimidade da organização.

SOBRE A ASSOCIAÇÃO DOS PACIENTES RENAIS DE SANTA CATARINA (APAR)

Fundada em 08 de janeiro de 1997, a Associação dos Pacientes Renais de Santa Catarina, APAR, reúne  pacientes com doenças renais crônicas do estado de Santa Catarina e procura, por meio de diversas parcerias, contribuir para a qualidade de vida de pacientes em tratamento dialítico e já transplantados.

A organização promove ações voltadas para a prevenção de doenças renais, acompanha e busca assegurar tratamento de qualidade nas clínicas de hemodiálise, entrega e apoia medicamentos básicos e de alta complexidade por parte do Sistema Único de Saúde, SUS, além de prestar serviços socioassistenciais para pacientes e suas famílias.

Dentre os projetos realizados, destacam-se as campanhas de prevenção de patologias renais, que são feitas frequentemente pela organização, visando conscientizar e informar a população sobre o tema. A organização atua por meio de  parcerias com órgãos públicos, como a Prefeitura de Florianópolis, e empresas privadas, como na ação “troco solidário”, realizada  com  supermercados, contribuindo para a  compra de alimentos  para o público atendido pela APAR. São feitas, ainda, parcerias com outras organizações da sociedade civil espalhadas por todo o Brasil, com o intuito de fortalecer o trabalho desenvolvido por essas organizações.

QUANTO À PRESTAÇÃO DE CONTAS NAS PARCERIAS COM O ESTADO

Construído ao longo de vários anos e colocado em prática desde 2014, o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC) é o principal elemento a orientar e  formalização das responsabilidades e  atividades a serem desenvolvidas na parceria entre governos e OSCs e para que estas prestem  contas junto aos órgãos governamentais existentes. 

O marco regulatório, agenda política ampla que tem o objetivo de aperfeiçoar o ambiente jurídico e institucional relacionado às organizações da sociedade civil e suas relações de parceria com o Estado, define a prestação de contas na lei 13.019 de julho de 2014, como um procedimento em que se analisa e se avalia a execução da parceria quanto aos aspectos de legalidade, legitimidade, economicidade, eficiência e eficácia.

 Através da prestação de contas, pode ser verificado o cumprimento do objeto da parceria e o alcance das metas e dos resultados previstos, compreendendo duas fases: 

a) apresentação das contas, de responsabilidade da organização da sociedade civil; 

b) análise e manifestação conclusiva das contas, de responsabilidade da administração pública, sem prejuízo da atuação dos órgãos de controle.

PRESTAÇÃO DE CONTAS ALÉM DAS OBRIGAÇÕES LEGAIS

Para muitas organizações, como é no caso da APAR, a prestação de contas vai além de uma obrigação legal, ela é um caminho para legitimar as operações da organização, tanto perante aos parceiros quanto perante a população em geral. Uma prestação de contas bem feita, transparente e acessível, além de cumprir as obrigações e exigências legais, mostra para os parceiros e para a população que  se trata de uma organização séria, com credibilidade e confiável. Num país como o Brasil, em que existem diversos casos de corrupção, muitas vezes as organizações podem ser vistas como fachada, locais para lavagem de dinheiro, entre outras coisas, o que é totalmente equivocado, pois tais casos se tratam de exceções, não a regra. Mas tendo em vista que as repercussões são sempre maiores quando ocorrem essas tais exceções, elaborar uma boa prestação de contas se torna fundamental para dar credibilidade para as Organizações da Sociedade Civil.

Há também quem critique deliberadamente as OSCs simplesmente para deslegitimá-las, como fazem alguns políticos, pois essas muitas vezes são críticas e fazem controle social sobre os governos ou sobre temas sensíveis como meio ambiente, direitos humanos, entre outros. Esta é mais uma razão para as OSCs serem proativas na comunicação sobre o que fazem e como fazem. Além disso, existe uma questão de accountability e responsividade – respostas às expectativas substantivas da organização quanto a sua  causa, ao que se propõe e porque existe – que se deve buscar atender. Algo que tem a ver mais com resultados da organização do que com os processos.

 Existem uma série de plataformas que auxiliam OSCs na transparência e na prestação de contas, por exemplo: a plataforma OSC Fácil, a plataforma Bússola Social, a plataforma desenvolvida pela Sísamo, entre outras. Além disso, ainda existem instituições que auxiliam na gestão de OSCs. Por exemplo, a organização OSC Legal, uma iniciativa para o fortalecimento das Organizações da Sociedade Civil com o intuito de auxiliar no gerenciamento e nas suas relações com o setor privado e a administração pública. A OSC Legal busca isso através da promoção de trocas de experiências, da divulgação de informações úteis, da produção e da disseminação de conteúdos relacionados à gestão social e ao direito. 

Outro exemplo é o Instituto Comunitário da Grande Florianópolis (ICOM), que atua auxiliando a gestão das OSCs e incentivando a participação cidadã na vida comunitária e  no terceiro setor. As principais áreas de atuação do ICOM são: apoio técnico e financeiro para OSCs; investimentos sociais na comunidade; e produção e disseminação de conhecimento. Além disso, a Instituição possui ações voltadas ao fortalecimento, capacitação, consultoria, articulação e doação de recursos para OSCs da região da Grande Florianópolis.

IMPORTÂNCIA DOS PRÊMIOS E DAS RELAÇÕES PARA ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL 

Por conta de sua importância para a sociedade e sua contribuição para a construção do bem público, as organizações sem fins lucrativos podem pleitear títulos, qualificações e certificações junto ao Poder Público, após cumprimento de alguns requisitos exigidos para tal. Esses títulos e certificações, por sua vez, podem conceder benefícios fiscais, reconhecimento público e outros incentivos à manutenção ou ampliação das atividades desempenhadas.

 Alguns títulos e qualificações que podem ser requeridos pelas organizações sem fins lucrativos no âmbito federal são o Título de Utilidade Pública Federal; o Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social, CEBAS; e o título de Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, OSCIP.

Existem, ainda, premiações que destacam e certificam organizações que atuam em prol do interesse público, reconhecendo sua maturidade organizacional, transparência ou forma de atuação. Neste caso, destaca-se por exemplo o Selo Doar, idealizado pelo Instituto Doar, que legitima e destaca o profissionalismo e transparência nas organizações não-governamentais brasileiras baseando-se em eixos como estratégia de financiamento, comunicação, prestação de contas e governança.

No âmbito estadual, destaca-se a Certificação de Responsabilidade Social de Santa Catarina e o Troféu Responsabilidade Social, que em 2021 chega à 21ª Edição. Tal certificação é destinada como reconhecimento ao trabalho realizado e apresentado nos balanços sociais das organizações escolhidas. A Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina (Alesc) promove a certificação e premiação em parceria com uma Comissão Mista de Certificação de Responsabilidade Social, composta por representantes técnicos de órgãos públicos e da sociedade civil.

Tais honrarias, além de propiciar o reconhecimento das instituições que assumem a responsabilidade social, trazem fôlego e apoio sustentável para a manutenção dos  serviços de caráter público que as OSCs podem oferecer.   

Outra estratégia é a de formar uma rede cooperativa, como um fenômeno crescente no cotidiano das organizações, tornando-se tema de interesse de acadêmicos, empresários e gestores do setor público, setor privado e terceiro setor. 

No caso da APAR, é válido mencionar a parceria com a Associação Renal Vida, ambas associações catarinenses com interesses em comum que se juntam para fortalecer sua causa, por meio de campanhas de prevenção e divulgação de seus serviços.

Com o que foi apresentado, podemos concluir que investir tempo e dedicação na prestação de contas da organização é fundamental e essencial para que a prestação seja um instrumento que vá muito além de uma formalidade ou uma obrigação da instituição. Ela é um instrumento de credibilidade e um vetor para atrair parcerias e visibilidade para as organizações da sociedade civil. 

* Texto elaborado pelos acadêmicos de administração pública Guilherme Zomer, Juventino Neto, Luã Costa e Nathan Vieira, no âmbito da disciplina sistemas de accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, em 2021.

REFERÊNCIAS

ICOM. Icom Floripa, 2021. Sobre o ICOM. Disponível em: <https://www.icomfloripa.org.br/o-icom/>. Acesso em: 20 de Agosto de 2021.

OSC LEGAL. Osc Legal, 2021. Página Inicial. Disponível em: <https://osclegal.org.br/>. Acesso em: 20 de Agosto de 2021.

INSTITUTO DOAR. Selo Doar, 2021. Disponível em: <https://www.institutodoar.org/selo-doar/criterios/>.

INSTITUTO DOAR. Quem somos, 2021. Disponível em: <https://www.institutodoar.org/selo-doar/criterios/>.

GOVERNO FEDERAL. Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil, 2017. Disponível em: <http://www.mds.gov.br/assuntos/assistencia-social/entidade-de-assistencia-social/marco-regulatorio-das-organizacoes-da-sociedade-civil-2013-mrosc>.

ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SANTA CATARINA. Certificado de Responsabilidade Social de Santa Catarina e Troféu Responsabilidade Social – Destaque SC, 2021. Disponível em: <http://responsabilidadesocial.alesc.sc.gov.br/>. 

Campanha Conexão e Suporte de Vidas em Tempos de Pandemia

Conheça e participe conosco.

O Projeto “Conexão e Suporte de Vidas em Tempos de Pandemia” tem por objetivo promover colaboração no sentido de minimizar alguns dos efeitos da pandemia de Covid-19, juntamente com hospitais públicos na Grande Florianópolis. 

A proposta da Campanha consiste em organizar a arrecadação de fundos para aquisição de tablets e roteadores de wifi para doação aos hospitais parceiros do projeto.

A iniciativa partiu de um grupo de estudantes da disciplina Governança e Redes de Coprodução, do Mestrado em Administração da Udesc Esag – Sueli Farias Kieling, André Luiz Caneparo Machado, Maxiliano de Oliveira  e  Luana Casagrande – ministrada no primeiro semestre de 2021 pela professora Paula Chies Schommer. A partir do contato com assistentes sociais e gestores de hospitais da Grande Florianópolis e da compreensão de alguns dos desafios trazidos pela pandemia, foram desenhadas e realizadas ações (mais detalhes aqui).

Os recursos arrecadados serão totalmente utilizados para a aquisição de dispositivos tecnológicos (tablets, roteadores e chips) aos hospitais. 

As doações de qualquer valor podem ser realizadas clicando no link da Vakinha. São várias as opções para pagamento, é fácil e rápido.

A prestação de contas acontecerá por este blog do Grupo de Pesquisa Politeia Udesc Esag e no site Vakinha online. 

Participe desta iniciativa conosco e faça parte dessa corrente de afeto, carinho, ação e conexão!! 

Campanha Conexão e Suporte de Vidas em Tempos de Pandemia 

Apoie essa ideia!!!

Os desafios da coprodução no período de pandemia: um relato sobre a experiência de trabalho com hospitais da Grande Florianópolis

Por Sueli Farias Kieling, André Luiz Caneparo Machado, Maxiliano de Oliveira e Luana Casagrande*

A pandemia do Covid-19 se apresenta como uma das maiores catástrofes sanitárias deste século, em que a humanidade se depara com desafios, problemas e sofrimentos extremamente complexos. As infecções e os agravamentos decorrentes da doença destroçaram milhares de famílias ao redor do mundo, e mesmo com o avanço da vacinação, passados um ano e 4 meses do início da pandemia no Brasil, os registros são de 555.512 óbitos no país até o início de agosto de 2021, sendo quase 18 mil no estado catarinense. Expressões como intubação, falta de oxigenação, lockdown, isolamento social e comorbidade tonaram-se corriqueiras nos telejornais e dentro das residências.

A alta transmissibilidade e a letalidade do vírus Covid-19 ocasionaram altos índices de hospitalização, culminando em colapso nos hospitais com falta de vagas, de materiais para o tratamento da doença, e levando os profissionais da saúde ao esgotamento físico e psicológico. 

Muita coisa mudou em ritmo acelerado: a ciência deu um passo gigante em pouco tempo, pois o mundo viu uma corrida pelo desenvolvimento de medicamentos que atenuassem os sintomas, tratassem os doentes, e pela tão necessária vacina, tudo em tempo recorde, conforme o zelo pela vida se mostrava urgente. Milhares de pessoas aprenderam a usar a tecnologia e de um dia para o outro passaram a trabalhar de suas próprias casas, quando possível. 

Por outro lado, diversas organizações, como escolas e comércios classificados como não essenciais precisaram fechar suas portas por semanas, de forma esporádica ou imprevista, seguindo dados de contaminação, óbitos e difíceis notícias diárias. Em meio a diversos dilemas, o desemprego e a fome alcançam patamares elevados, aumentando ainda mais o abismo social no país e no mundo. 

Diante das emergências decorrentes da pandemia e da piora nas estatísticas sociais, tornou-se mais evidente o trabalho de organizações da sociedade civil que trabalham com iniciativas de cunho social, realizando um trabalho de atendimento à populações mais vulneráveis, como o feito pelo Instituto Comunitário Grande Florianópolis (ICOM). Esta Instituição atua junto às comunidades de maneira a fortalecê-las, por meio de investimento social e atuação em rede com outras organizações comunitárias. 

Os reflexos negativos da pandemia, como os elevados números de hospitalizados, de complicações e óbitos, o medo do contágio e das possibilidades de agravamento decorrentes da doença se transformaram em sentimento comum a milhares de cidadãos. As empresas e instituições que retornaram ao trabalho/atendimento presencial, precisaram se adequar à nova realidade, com o uso de máscaras e outras medidas sanitárias necessárias, para proteção da própria saúde e dos demais. 

Nesse contexto, o isolamento social se apresentou, e ainda se mostra, como uma das medidas necessárias mais eficientes no combate à disseminação do vírus – as pessoas precisam manter o distanciamento ao máximo que for possível para evitar a disseminação. Isso trouxe reflexo imediato também para os pacientes hospitalizados, seja pela Covid-19 ou outras doenças, que necessitam se manter isolados, sem poder contar com o apoio e cuidado próximo de amigos e familiares nas unidades hospitalares, fragilizando-os ainda mais nesse momento tão difícil. Além disso, por conta dos reflexos da pandemia, muitos hospitalizados e/ou familiares perdiam sua fonte de renda, por vezes a única, fragilizando-os quanto a questões básicas de alimentação e higiene, segundo o relato de profissionais da assistência social de vários hospitais da Grande Florianópolis. 

Assim, o único meio de contato dos hospitalizados e seus familiares se dá por meio de dispositivos de tecnologia como tablets e aparelhos celulares dos hospitais, muitas vezes obsoletos e precários. É triste imaginar que esta é a forma que um paciente, acometido pela doença, pelo medo, pelas complicações de saúde, pode utilizar para se comunicar com um familiar antes de um procedimento de intubação, por exemplo; e, mais estarrecedor ainda, é pensar que talvez nem assim seja possível. 

Ter ciência dessa situação dentro dos hospitais da Grande Florianópolis, em contato direto, debate e levantamento de dados entre assistentes sociais e gestores hospitalares, e alunos e professora da disciplina Governança e Redes de Coprodução, do Mestrado Profissional em Administração da Udesc Esag, motivou o desenvolvimento de um projeto colaborativo que pudesse, de alguma forma, amenizar esses problemas de alimentação, higiene e comunicação. 

O Projeto denominado “Conexão e Suporte de Vidas em Tempos de Pandemia” foi idealizado pensando em trabalhar em algumas vertentes. Por intermédio das servidoras, assistentes sociais de grandes hospitais da Grande Florianópolis foi possível construir um canal de comunicação entre o ICOM e as associações sem fins lucrativos vinculadas aos hospitais; e nesse trabalho, o ICOM, por meio do Fundo de Impacto para a Justiça Social, Linha Emergencial Coronavírus, viabilizou a doação de alimentos e produtos de higiene como fraldas geriátricas a essas associações voluntárias, como ocorrido, por exemplo, com o Hospital Governador Celso Ramos. O projeto contempla também uma Campanha para arrecadar fundos para a aquisição e doação de dispositivos tecnológicos como tablets e roteadores de wifi para facilitação da comunicação entre pacientes hospitalizados e seus familiares

Esse projeto se apresentou no sentido de formar uma construção colaborativa de coprodução de serviços públicos, uma vez que se identifica essa necessidade de atendimento ao cidadão. Entretanto, aprende-se na prática que há diversos desafios na tentativa de construção de um trabalho de coprodução, de colaboração. Dificuldades como à maneira de mencionar o nome dos hospitais junto à Campanha, o que ratifica a credibilidade da ação e é fator relevante para a coprodução (por mais que tenha sido bem aceita pela gestão das instituições hospitalares, há impedimentos legais quanto à participação em unidades hospitalares na divulgação); no entendimento do fluxo operacional e legal quanto à doação para estes hospitais (pois há regramentos a serem seguidos, critérios que por vezes dificultam a concretização das ações). Também pode ser evidenciado a necessidade de controle social, em pensar o modo correto de acompanhamento e prestação de contas aos envolvidos quando da arrecadação, suscitando a governança pública. Diante de cada desafio, se buscou uma alternativa, e a Campanha foi lançada, esperando-se alcançar um bom volume de doações, cumprir seus objetivos e apresentar os resultados, neste mesmo canal( blog), nas próximas semanas.

Enfim, a pandemia, que ainda no início do segundo semestre de 2021 parece longe do fim, deixará um legado de tristeza, de sofrimento; mas também de aprendizados. E coproduzir, trabalhar em colaboração pode ser bastante desafiador, e mesmo que extremamente importante e necessária, exige credibilidade nas instituições, engajamento e participação das pessoas, e por fim, a devida prestação de contas.

Saiba mais sobre a Campanha e participe fazendo sua doação via Vakinha online.

*Texto elaborado por Sueli Farias Kieling, André Luiz Caneparo Machado, Maxiliano de Oliveira e Luana Casagrande, no âmbito da disciplina de mestrado Governança e Redes de Coprodução, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, na Udesc Esag, no primeiro semestre de 2021.

Processo eleitoral brasileiro – você confia?

Como a polêmica voto de papel versus urna eletrônica pode minar a confiança na democracia e de que forma contrapor esse risco.

Por Joanna Daudt Prieto Farias, Lorenzo Scheidt Breda e  Thiago Guerra de Gusmão*

A cada dois anos temos eleições no Brasil e, esperançosos ou não com a “festa” da democracia, todos nós precisamos nos dedicar a fazer uma boa escolha ou nos esquivar dela. Se, por um lado, isso não é novidade, o que surpreende é a recorrência da preocupação com esse tema no dia-a-dia dos brasileiros. Mesmo em meio a uma pandemia, com diversos assuntos que têm impacto no curtíssimo prazo, muito já se conversa sobre as eleições de 2022.

As eleições no Brasil vêm sendo realizadas por meio de urnas eletrônicas desde 1996, o que não é uma exclusividade nossa, pois outros 15 países possuem processo informatizado – que é recorrentemente criticado pelo Presidente Jair Bolsonaro. Apesar de ser um ferrenho crítico dessa forma de votação, seja ou não de forma fantasiosa, o Presidente (que afirma ter provas de fraudes nas eleições de 2018, mas nunca as apresentou) não é o primeiro a questionar a confiabilidade das urnas.

Na minirreforma eleitoral de 2015, elaborada pelo Congresso Nacional durante o mandato da ex-presidente da república Dilma Rouseff, foi proposta a impressão do voto para conferência do eleitor – Art. 12 da Lei n. 13.165, de 29 de setembro de 2015. O que é semelhante ao que Jair Bolsonaro propõe ao afirmar que trabalhará junto ao Congresso para aprovação de um novo “sistema eleitoral confiável”, que contaria, além da impressão do comprovante do voto, com uma segunda urna para este ser depositado.

O Supremo Tribunal Federal (STF), entretanto,  decidiu de forma liminar em 2018 e definitiva em 2020 que a impressão do voto para conferência do eleitor seria uma medida que violaria o sigilo do voto, ferindo uma cláusula pétrea e sendo, portanto, inconstitucional.

Para reflexão: até que ponto faz sentido que um princípio constitucional, o sigilo do voto, possa limitar a transparência do processo eleitoral e que o cidadão consiga entender o que ocorre "de fato" com o seu voto?

Seja qual for a resposta, em algumas cidades do Brasil – nas eleições de 2002 e de forma experimental – já houve voto impresso junto com o voto na urna eletrônica. Além de tornar o processo mais caro e demorado, os eleitores que participaram do teste não sentiram que a eleição ficou mais confiável e a classificaram como “confusa”.

Na antiguidade, na Ágora grega, os cidadãos manifestavam seu direito de forma explícita por meio da fala, em um único ambiente. Isso ainda ocorre em alguns tipos de votação de representantes políticos, como no Congresso, em Câmaras de Vereadores e Conselhos. Mas o voto do cidadão passou a ser secreto. Conquista essa que abre margem para questionamentos sobre a apuração.

Um exemplo recente de controvérsia na apuração  ocorreu em nosso País, na eleição para a presidência do Senado Federal de 2019, quando foram contabilizadas 82 cédulas de papel na votação – enquanto possuímos apenas 81 senadores – mesmo sendo acompanhada ao vivo por diversos canais de comunicação. 

A questão central do tema não deveria ser se o voto é eletrônico, de papel, por correio ou por ‘fumaça’ – se assim fosse possível votar. O que de fato interessa é se existe alguma verificação que garanta, não apenas que aquele voto do cidadão foi computado, mas também que foi para o candidato por ele escolhido.

A certeza de que a escolha do eleitor foi computada corretamente estabelece uma relação de confiança entre o cidadão e o sistema eleitoral, que fortalece um dos instrumentos basilares da democracia: o voto. A partir dele também há elo entre o eleitor e o candidato – representante e representado.

Cabe sempre lembrar que o poder é do povo, que delega responsabilidades para que outrem faça valer a sua vontade. Daí a importância de que haja uma relação transparente e de confiança entre as partes, pois se fraudes são passíveis de acontecer em todos os lugares, o importante é que seja possível, se não preveni-las, ao menos minimizá-las e – caso venham a ocorrer – identificá-las, para então remediá-las e puni-las.

Certo nível de erro é inclusive aceitável – um provérbio que sintetiza bem isso é “o ótimo é inimigo do bom”. Como todo sistema é passível de  falhas, sempre há um certo grau de risco e por vezes não vale a pena buscar melhorias por conta do alto custo de oportunidade. 

Vale mencionar uma declaração dada a respeito da última eleição americana, que contou com número recorde de eleitores pelos correios e que ficou conhecida pelos questionamentos dos derrotados sobre a  apuração. Donald Trump, candidato à reeleição vencido por Joe Biden, afirma que houve fraude e moveu uma série de processos questionando o resultado das eleições. Sem provas contundentes, a Suprema Corte rejeitou vários recursos e o Secretário de Justiça dos Estados Unidos declarou em dezembro do último ano que “até a data, não vimos fraudes em uma escala que pudesse ter dado à eleição um resultado diferente”.

Atualmente, no Brasil, o nível de confiança do cidadão no processo eleitoral está mais baseado em uma espécie de ‘confiança na instituição’ – no caso, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), do que na compreensão ou na transparência do processo de apuração dos votos.

É razoável pensar que a participação mais ativa  de outros atores envolvidos – para além da Justiça Eleitoral, dos partidos políticos e dos eleitores – possa melhorar a transparência do processo eleitoral brasileiro como um todo, o que pode ser feito, por exemplo, por meio de debates abertos sobre riscos e caminhos para minimizá-los, bem como  auditorias. 

O mais importante é que o processo eleitoral seja transparente e a apuração do sistema eleitoral seja a mais fidedigna possível. Entretanto, alegações de fraudes sem provas e críticas desacompanhadas de debates profundos acerca das urnas eletrônicas minam a confiança no sistema como um todo. Enfraquecem, para além da instituição Tribunal Superior Eleitoral, a nós cidadãos, ao debilitar o principal instrumento de nossa recente democracia.

De qualquer forma, a intenção é que as participações e questionamentos, para além de interesses legítimos ou puramente eleitorais, venham somar ao processo e contribuam para  tornar as eleições algo mais fácil de ser compreendido. Por meio de um debate qualificado e responsável, voltado a aprimorar os diversos elementos do processo de votação e apuração, articulando e engajando os atores públicos e a sociedade, poderemos seguir nessa tarefa permanente de construir a confiança necessária para o avanço da democracia, com  mais legitimidade ao processo eleitoral brasileiro.

*Texto elaborado pelos acadêmicos de administração pública Joanna Daudt Prieto Farias, Lorenzo Scheidt Breda e  Thiago Guerra de Gusmão, no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, com a mestranda Bárbara Ferrari, entre 2020 e 2021.

REFERÊNCIAS

BORGES, Bruna. Urna eletrônica pode ser fraudada? Especialistas explicam. Uol, 2014. Disponível em: https://eleicoes.uol.com.br/2014/noticias/2014/08/29/especialistas-alertam- para-possibilidade-de-fraudes-na-urna-eletronica.htm. Acesso em: 27 dez 2020.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso em: 25 dez 2020.

BRASIL. Presidência da República. Lei n. 13.165, de 29 de setembro de 2015. Para reduzir os custos das campanhas eleitorais, simplificar a administração dos Partidos Políticos e incentivar a participação feminina. Brasília: 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13165.htm. Acesso em: 25 dez 2020.

CASTRO, Juliana. Bolsonaro retoma a teoria da conspiração sobre a confiabilidade das urnas. Veja, 2020. Disponível em: https://veja.abril.com.br/brasil/bolsonaro-retoma-a-teoria-da-conspiracao- sobre-a-confiabilidade-das-urnas/. Acesso em: 27 dez 2020.

DINIZ, Iara. Voto impresso que Bolsonaro quer já foi testado no Brasil e não funcionou. Gazeta, 2021. Disponível em: https://www.agazeta.com.br/es/politica/voto-impresso-que-bolsonaro-quer-ja-foi-testado-no-brasil-e-nao-funcionou-0121. Acesso em: 02 fev 2021.

PONTES, Felipe. STF declara inconstitucional a impressão do voto pela urna eletrônica. Ebc, 2020. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2020-09/stf-declara-inconstitucional-impressao-do-voto-pela-urna-eletronica. Acesso em: 17 mar 2021. 

SHALDERS, André. Eleição do Senado: como foi a conturbada disputa que deu vitória a Davi Alcolumbre. BBC, 2019. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-47098597. Acesso em: 16 fev 2021.

STF. Supremo Tribunal Federal. Impressão de registro põe em risco sigilo e liberdade de voto. Imprensa, 2020. Disponível em: http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=451785&ori=1. Acesso em: 03 mar 2021.

VALOR. Secretário de Justiça de Trump diz que não há evidência de fraude eleitoral. Valor Econômico, 2020. Disponível em: https://valor.globo.com/mundo/noticia/2020/12/01/secretario-de-justica-de-trump-diz-que-nao-ha-evidencia-de-fraude-eleitoral.ghtml. Acesso em: 21 jan 2021.

Para se aprofundar no tema:
Fragilidades do sistema de voto eletrônico
Possibilidades de auditoria da votação eletrônica
Teste Público de Segurança feito pelo TSE