Como a transparência pública pode melhorar a alimentação escolar?

Por Maria Eduarda Amaral e Nathalia Azevedo*

A alta de preço dos alimentos é uma das grandes preocupações na atualidade. Mas o que isso interfere na alimentação escolar? De onde vem os recursos  para a compra dos alimentos servidos nas unidades públicas de ensino?  Fique aqui com a gente, que iremos te explicar neste texto  um pouquinho sobre o tema.

A alimentação escolar é direito dos alunos e dever do Estado, conforme expressa a lei federal n° 11.947 de 16 de junho de 2009 em seu artigo 3°, a saber: 

Art. 3° A alimentação escolar é direito dos alunos da educação básica pública e dever do Estado e será promovida e incentivada com vistas no atendimento das diretrizes estabelecidas nesta Lei (LEI n° 11947/2009).

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, em seu artigo 208, ressalta a participação do Estado na educação e alimentação aos educandos:

 Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:

(…)

 VII – atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por meio de programas suplementares de material didático escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde. (Redação dada pela Emenda Constitucional no 59, de 2009).(grifo da autora) (CRFB/1988).

Este artigo da Carta Magna, no inciso VII, prevê  a criação de programas suplementares na alimentação e demais áreas. O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), foi criado para isso. Sua  normatização legal vigente é a Resolução/CD/FNDE no 6, de 8 de maio de 2020.

O objetivo do PNAE conforme a Resolução, em seu artigo 4°, é:

Art 4° O PNAE tem por objetivo contribuir para o crescimento e o desenvolvimento biopsicossocial, a aprendizagem, o rendimento escolar e a formação de práticas alimentares saudáveis dos alunos, por meio de ações de educação alimentar e nutricional e da oferta de refeições que cubram as suas necessidades nutricionais durante o período letivo.

O Programa caracteriza-se como a política pública de maior longevidade na área de segurança alimentar e nutricional do país e o mais abrangente e duradouro programa na área de alimentação escolar do mundo (PEIXINHO, 2013). É por meio do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) que acontece o repasse mensal aos estados e municípios dos recursos do PNAE. O Fundo é responsável pela assistência financeira em caráter suplementar na alimentação escolar e cabe às Entidades Executoras (a Secretaria Municipal de Educação de cada município) complementar o repasse.

No município de Florianópolis, por exemplo,  o valor total gasto com gêneros alimentícios no ano de 2019 foi de R$ 11.315.165,60 (onze milhões e trezentos e quinze mil e cento e sessenta e cinco reais e sessenta centavos). Destes, R$ 4.804.528 (quatro milhões e oitocentos e quatro mil e quinhentos e vinte e oito reais) foram recursos vindos do FNDE e R$ 6.510.638 (seis milhões e quinhentos e dez mil e seiscentos e trinta e oito reais) se referem a contrapartida da SME para suplementação da alimentação escolar (PREFEITURA MUNICIPAL DE FLORIANÓPOLIS). Em uma média percentual, 42,46% foram recursos federais e 57,54% foram recursos do município.

São diversas as formas de gerir os recursos da alimentação escolar, tais quais: centralizada, descentralizada, semi-descentralizada e terceirizada. No município de Florianópolis, a administração da alimentação escolar é feita de maneira centralizada, ou seja, o município recebe o repasse do governo federal, acresce a contrapartida por parte da Secretaria Municipal de Educação de Florianópolis e faz a compra dos alimentos para as unidades educativas.

Neste município, a alimentação escolar é administrada pelo Departamento de Alimentação Escolar (DEPAE), vinculado à Diretoria Operacional (DIOP). O setor conta com 2 nutricionistas efetivas e outras 14 terceirizadas, bem como a chefia do departamento e uma estagiária na área administrativa. O setor é responsável pela contratação das empresas que fornecem os alimentos, formulação de políticas de serviço, monitoramento, avaliação da qualidade nutricional, prestação de contas junto ao Conselho de Alimentação Escolar (CAE), bem como pelos trâmites administrativos demandados.

No Brasil, durante a pandemia de Covid-19, a alimentação escolar foi extremamente afetada, enfrentando diversos desafios na distribuição. Desde o ano de 2020, a Lei Federal 13987/20 permitiu que alimentos que seriam servidos nas escolas públicas de todo o País fossem distribuídos para os alunos consumirem em suas casas, já que as escolas estavam fechadas por causa da pandemia de Covid-19.

Os estados adotaram medidas para que esses alimentos chegassem aos estudantes, porém muitos deles acabaram recebendo-os poucas vezes ou até mesmo não recebendo. De acordo com uma notícia divulgada no sítio eletrônico da Câmara de Deputados, 30% dos alunos da rede pública não receberam alimentação escolar durante a pandemia. 21% afirmaram que só receberam uma cesta uma vez em 15 meses de pandemia (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2021).

Segundo reportagem publicada no site Outras Mídias (Tavares, 2021), Alagoas, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Amapá, Rio Grande do Norte, Sergipe, Rio Grande do Sul e Tocantins, a cobertura se deu com distribuição de kits de alimentação para todos os estudantes matriculados na rede. No Espírito Santo, Acre e Minas Gerais, apenas os estudantes que constam no CadÚnico receberam cestas básicas. Na Bahia, no Ceará e no Pará, os alunos receberam um vale alimentação. No Distrito Federal, o modelo foi misto: começou com distribuição de alimentos e depois se reverteu em um benefício chamado ‘bolsa alimentação escolar emergencial’ (Tavares, 2021). 

O estado de Goiás realizou três iniciativas: auxílio alimentação (de abril a julho de 2020), entrega dos kits (agosto a dezembro de 2020 e fevereiro a junho de 2021) e distribuição de cartões (a partir de julho de 2021), sendo a primeira somente para estudantes com vulnerabilidade social. Já no Paraná, houve distribuição de alimentos a alunos beneficiários do Bolsa Família e em situação de vulnerabilidade. Em Pernambuco, São Paulo e Rio de Janeiro, foi oferecida uma espécie de cartão alimentação somente para estudantes de maior vulnerabilidade social com recursos próprios de cada estado. Em Pernambuco, no entanto, houve uma mudança e a alimentação escolar passou a ser oferecida nas escolas por conta da retomada das aulas presenciais. No Piauí, a partir do programa Merenda em Casa, famílias beneficiárias do Bolsa Família, com filhos matriculados na rede estadual de ensino, receberam auxílio mensal, assim como em Santa Catarina (Tavares, 2021). 

Esse breve panorama mostra que houve estratégias variadas e adaptações.

Cada município também buscou adaptar-se àquela realidade à época. Em Florianópolis, no início da pandemia, foi  iniciado um processo licitatório para contratação de empresa para o fornecimento de Kit alimentação. As entregas foram feitas durante quase 2 anos para as famílias que demonstraram interesse, junto à unidade em que seu filho(a) encontrava-se matriculado(a). 

Já antes da pandemia de Covid-19, alguns municípios vinham criando inovações para aproximar familiares e estudantes das informações sobre a alimentação escolar. Um exemplo disso é o município de São Paulo, com o aplicativo “Prato Aberto”. O aplicativo permite consultar o que é servido na alimentação escolar nas mais de 3 mil escolas municipais. A ferramenta, que pode ser acessada em computadores e dispositivos móveis, como celulares e tablets, mostra os cardápios por dia e por escola, sendo possível fazer uma avaliação da qualidade das refeições e interagir com usuários via Facebook e Telegram, por meio de um assistente virtual, o Robô Edu. O projeto é resultado da 1ª Seleção de Inovação Tecnológica do Pátio Digital, em que equipes de todo o país tinham o desafio de melhorar a disponibilização de informações sobre o cardápio escolar por meio da criação de um aplicativo.

O Prêmio “Gestor Eficiente”, realizado pela organização Ação Fome Zero, é também um exemplo que valoriza a boa gestão. A iniciativa identifica e reconhece ações criativas e responsáveis das prefeituras para aprimorar a aplicação dos recursos do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE).

Levando em consideração esses exemplos, bem como os desafios e inovações buscadas durante a pandemia na gestão da merenda escolar, é possível perceber que a transparência pública e a aproximação entre gestores, educadores, familiares e estudantes podem contribuir para a eficiência e a qualidade da  alimentação escolar. As inovações e melhorias são ainda mais importantes em um momento como o atual, com elevação do preço dos alimentos e insegurança alimentar de muitas famílias.

Sobre a alimentação escolar, os Estados e Municípios tem muito a aprimorar suas gestões. São diversos os problemas enfrentados ainda, a exemplo da verba pública destinada para este fim, pois os recursos oriundos do governo federal não acompanham os índices inflacionários aumentando mês a mês. O resultado disso? A baixa da qualidade na alimentação dos alunos da rede pública de ensino. Deixamos essa reflexão com vocês, leitores.

* Texto elaborado pelas acadêmicas de Administração Pública Maria Eduarda Amaral e Nathalia Azevedo, no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, no primeiro semestre de 2022.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Constituição 1988. Brasília, DF: Presidência da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 29 de jun. 20222.

BRASIL. Presidência da República. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar e do Programa Dinheiro Direto na Escola aos alunos da educação básica. Lei n° 11.947, de 16 de junho de 2009.

CÂMARA DOS DEPUTADOS. Pesquisa aponta que 30% dos alunos da rede pública não receberam merenda escolar durante a pandemia Fonte: Agência Câmara de Notícias. 2021. Disponível em: https://www.camara.leg.br/noticias/820583-pesquisa-aponta-que-30-dos-alunos-da-rede-publica-nao-receberam-merenda-escolar-durante-a-pandemia/#:~:text=Desde%20o%20ano%20passado%2C%20a,da%20pandemia%20de%20Covid%2D19. Acesso em: 28 de jun. 2022.

FIOCRUZ, epsjv. Na pandemia, a batalha pela merenda escolar. 2021. Disponível em: https://outraspalavras.net/outrasmidias/na-pandemia-a-batalha-pela-merenda-escolar/. Acesso em: 28 de jun. 2022.

G1, São Paulo. Pioneiras da ‘máfia da merenda’ nos anos 2000 criaram novo esquema para manter fraudes, diz Polícia Federal. 2018. Disponível em: https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/pioneiras-da-mafia-da-merenda-nos-anos-2000-criaram-novo-esquema-para-manter-fraudes-diz-policia-federal.ghtml. Acesso em: 28 de jun. 2022.

METRO. Aplicativo permite fiscalizar merenda nas escolas municipais de São Paulo. 2017.  Disponível em: https://www.metroworldnews.com.br/foco/2017/12/08/aplicativo-prato-aberto-fiscalizar-merenda-escolas-sao-paulo.html. Acesso em: 28 de jun. 2022.

MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Dispõe sobre o atendimento da alimentação escolar aos alunos da educação básica no âmbito do Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE. Resolução n° 6, de 8 de maio de 2020.

PEIXINHO, Albaneide Maria Lima. A trajetória do Programa Nacional de Alimentação Escolar no período de 2003-2010: relato do gestor nacional. Revista Ciência e Saúde Coletiva, v. 18, n. 4, p. 909-916, 2013.

Desinformação e a Caverna de Platão

Por Amanda Schlichting, Ana Carolina Mussi, Bruna Rafaela, Rebeca Tonnera Mattos* 

O termo fake news está vinculado a mensagens falsas divulgadas principalmente nas redes sociais. São boatos contendo inverdades que apelam para o emocional a fim de chamar a atenção do leitor. Costumam ser divulgados e compartilhados com o objetivo de legitimar um ponto de vista ou prejudicar uma pessoa ou grupo, geralmente figuras públicas. Algumas fake news têm poder viral, isto é, espalham-se rapidamente. As informações falsas geralmente são apelativas, fazendo com que as pessoas consumam o material “noticioso” sem confirmar se é verdade seu conteúdo.

Conforme o site Brasil Escola, o poder de disseminação das fake news é maior em populações com menor escolaridade e que dependem das redes sociais para obter informações. No entanto, as notícias falsas também podem alcançar pessoas com mais estudo, já que o conteúdo está comumente ligado ao viés político e emocional.

O que hoje é chamado de fake news é um fenômeno que esteve presente ao longo da história. O que mudou foi a nomenclatura, o meio utilizado para divulgação e o potencial de persuasão que o material falso adquiriu nos últimos anos, sobretudo com as plataformas digitais. A manipulação de imagens existe há muito tempo. Um exemplo é a intervenção em fotos oficiais do regime soviético, em meados do século XX. Uma foto de Stalin, em 1926, passou por duas alterações para excluir os inimigos políticos.


Conforme o site El País, séculos antes das redes sociais, os boatos e as inverdades alimentavam “pasquins” e “gazetas” na Europa, como se pode ver no filme francês Ilusões Perdidas, dirigido por Xavier Giannoli. Na longa história da desinformação, o surto atual de notícias falsas já ocupava seu lugar. Os folhetos foram métodos habituais para difundir notícias desagradáveis, em sua maioria falsas, sobre personagens públicos. 

Atualmente, as fake news são divulgadas e disseminadas por meio das plataformas digitais. Através de um click se espalham rapidamente. Segundo reportagem do Correio Braziliense, no ano de 2020 o Facebook foi a rede social apontada como a principal disseminadora de fake news nas Filipinas (47%), nos Estados Unidos (35%) e no Quênia (29%). No Brasil, o Whatsapp foi mencionado como principal canal por onde mensagens falsas são disparadas (35%), ficando o Facebook  em segundo (24%). Em países como Coreia do Sul e Japão, o Youtube e o Twitter ganharam destaque. 

Nesse movimento, governos, empresas de tecnologia e plataformas de redes sociais estão buscando criar mecanismos de defesa contra as notícias falsas como, por exemplo, a criação da Agência Lupa, fundada em 2015 e considerada a primeira agência de fact-checking criada no Brasil. O grupo Globo também criou um quadro denominado “Fato ou Fake”, apurando notícias que estão sendo muito compartilhadas nas redes sociais.

Em 2016, vivenciamos as eleições para a presidência dos Estados Unidos da América, na qual Hillary Clinton e Donald Trump travaram uma disputa em um cenário altamente polarizado. Donald Trump ficou conhecido por usar a rede social Twitter como uma de suas plataformas de comunicação preferidas. Com a interferência da Rússia, governada por  Vladimir Putin, as fake news fizeram parte das direções dessas candidaturas (PENA, 2018).  

As mídias digitais são grandes disseminadoras de conteúdo, conforme Sastre et. al (2018), tornando as redes sociais e os aplicativos para troca de mensagens plataformas estimuladoras dos debates democráticos, mas também um fértil terreno para distribuição de notícias falsas, conforme informa estudo do Departamento de Análise de Políticas-Públicas-DAPP da Fundação Getúlio Vargas.

Atualmente, temos acesso a uma diversidade de informações que estão disponíveis em diferentes meios. Populações de diferentes lugares do mundo, com diferentes culturas, estão interligadas e podem também nos “seguir” nas plataformas digitais, o que nos conecta com todo tipo de informação, ou desinformação – fake news. O filósofo sul-coreano Byung-Chul Han analisa o fim dos “homens-massa”, aqueles que, no passado, eram apenas mais um dentre muitos em uma população. Hoje, somos um perfil em diferentes plataformas digitais disponíveis para o mundo.

Ocorre que o acesso facilitado e a conexão momentânea nos fazem refém da cultura do dataísmo, ou seja, a cultura dos dados. Para tomar decisões, usa-se dados concretos, tirados de alguma fonte real, para analisá-los e, a partir daí, fazer escolhas. No entanto, conforme Byung-Chul Han, essa “prisão aos dados” acarreta a uma “crise da verdade”, uma vez que não conseguimos mais confiar na palavra do outro sem uma fundamentação teórica em dados palpáveis. Diante disso, nos perguntamos: como saber se o que estamos lendo e clicando na internet são fatos reais ou irreais? Byung-Chul Han afirma surgir um ceticismo (niilismo) sobre as mais variadas informações que atualmente estão à disposição da sociedade nas redes sociais, impossibilitando com que consigamos distinguir entre verdade e mentira.   

A era do dataísmo está nos ensinando que não devemos acreditar em tudo que vemos nas plataformas digitais, precisamos usar nossa sabedoria enquanto cidadãos e filtrar as informações que recebemos. Conforme a charge a seguir ilustra: 

Fonte: https://blogdoafr.com/2018/03/25/charge-fake-news/

A partir do aculturamento do dataísmo,  nossa sociedade se coloca em uma caverna do platão novamente, conforme a analogia de Byung-Chul Han, que  explica que a prisão digital é como se fosse uma zona de bem-estar inteligente e não há resistência ao regime prevalecente. O “like” excluiria qualquer revolução, ou seja, a partir dos nossos “likes”, a entrega das informações no mundo digital está atrelada a um algoritmo (microtargeting), causando uma  tribalização da rede. Isso porque recebemos apenas assuntos relacionados aos nossos “likes”,  reduzindo  as chances de acharmos que aquilo que está vinculado é irreal ou que há informações para além das nossas cavernas tribalistas. Dentro da caverna, não é comum se questionar e até mesmo desenvolver as habilidades para buscar, filtrar e interpretar essas informações.

Com a falta de conhecimento ou habilidade de ir atrás das informações veiculadas, se fortalece aqueles que desejam que a sociedade permaneça dentro da caverna, uma vez que, aqueles que vinculam as fake news sabem sobre a deficiência social e manipulam a percepção das pessoas, ou seja, as aprisionam nas cavernas.

* Texto elaborado pelas acadêmicas de administração pública Amanda Schlichting, Ana Carolina Mussi, Bruna Rafaela, Rebeca Tonnera Mattos, no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, em 2022.

REFERÊNCIAS 

Byung-Chul Han: Infocracia e a caverna digital. Disponível em: <https://outraspalavras.net/crise-civilizatoria/byung-chul-han-a-infocracia-e-a-caverna-digital/>. Acessado em: 18 de jun. de 2022.

Facebook é  a maior plataforma de fake news, aponta pesquisa. Disponível em: <https://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/tecnologia/2020/06/17/interna_tecnologia,864689/facebook-e-a-maior-plataforma-de-fake-news-aponta-pesquisa.shtml>. Acessado em: 18 de jun de 2022.

O que são Fake News?. Disponível em: <https://brasilescola.uol.com.br/curiosidades/o-que-sao-fake-news.htm>. Acesso em: 18 de jun de 2022.

TSE assina com o Supremo acordo para combater as fake news sobre o Judiciário. Disponível em: <https://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2022/Maio/tse-assina-com-o-supremo-acordo-para-combater-as-fake-news-sobre-o-judiciario>. Acessado em: 19 de jun de 2022. 

PL das Fake News: Webinar aborda o desafio de regular as redes sociais. Disponível em: <https://portal.fgv.br/noticias/pl-fake-news-webinar-aborda-desafio-regular-redes-sociais>. Acesso em: 19 de jun de 2022.

PENA, L. P. J. Fake news: uma breve análise acerca de sua trajetória internacional. Consequências políticas e perspectiva jurídica. Revista Dizer. 2018, p.136-150.

SASTRE, A., DE OLIVEIRA, C. S. P., BELDA, F. R. (2018). A influência do “filtro bolha” na difusão de fake news nas mídias sociais: reflexões sobre as mudanças nos algoritmos do facebook. Revista GEMInIS, 9(1):4–17.

Para saber mais sobre o tema:

Artigos, leis e projetos de lei estão a favor do uso responsável dos veículos de comunicação, a fim de garantir à população o acesso a informações de credibilidade. 

Projeto de lei Nº 6.812/2017: Dispõe sobre a tipificação criminal da divulgação ou compartilhamento de informação falsa ou incompleta na rede mundial de computadores e dá outras providências ( Aguardando Parecer do Relator na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática – CCTCI).

Lei 9.504/97 (alterada pela Lei 13.488/2017): Tipifica como crime a contratação de pessoas para propagar conteúdo falso que influencie no processo eleitoral. 

Lei 9.504/1997 (alterada pela Lei 12.891/2013) – Quadrilhas virtuais:

Art 57 H § 1º – Constitui crime a contratação direta ou indireta de grupo de pessoas com a finalidade específica de emitir mensagens ou comentários na internet para ofender a honra ou difamar a imagem de candidato, partido ou coligação. 

Pena: detenção de 2 a 4 anos e multa de R$ 15 a R$ 50 mil. 

Art 57 H § 2º – Quem é contratado também comete crime, punível com detenção de 6 meses a 1 ano e multa de R$ 5 a R$ 15 mil.

Art. 326-A- Dar causa à instauração de investigação policial, de processo judicial, de investigação administrativa, de inquérito civil ou ação de improbidade administrativa, atribuindo a alguém a prática de crime ou ato infracional de que o sabe inocente, com finalidade eleitoral: (Incluído pela Lei nº13.834, de 2019)

Pena: reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº13.834, de 2019) 

§ 3º Incorrerá nas mesmas penas deste artigo quem, comprovadamente ciente da inocência do denunciado e com finalidade eleitoral, divulga ou propala, por qualquer meio ou forma, o ato ou fato que lhe foi falsamente atribuído. (Incluído pela Lei nº13.834, de 2019) 

Código Civil : Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. 

Código Penal : Artigos 138 e 141. Crimes contra a honra, com aumento de 1 3 da pena em razão do uso da internet.

Livro que analisa o tema em vários países – Brasil, Índia, Filipinas e outros: https://www.companhiadasletras.com.br/livro/9788535933628/a-maquina-do-odio

Filme: A rede social – para entender melhor sobre a manipulação dos dados. 

https://www.netflix.com/pt/title/70132721

Outros sites que abordam o tema:

http://www.plataformademocratica.org/Arquivos/Sobrevivendo_nas_redes.pdf

Tecnologias, uso de dados e direitos reprodutivos: qual a relação?

Neste podcast, Isabella Ferro conversa com Hana Mesquita, Manu Halfeld e Marina Garrote sobre a relação entre as tecnologias, o uso de dados e os direitos reprodutivos.

Hana Mesquita é advogada e pesquisadora na área de proteção de dados e novas tecnologias. Graduada pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e integrante do grupo de pesquisa Legalite – PUC-Rio. É pesquisadora da Associação Data Privacy Brasil de Pesquisa desde junho de 2021.

Manu Halfeld é mestranda em Ciência Política (UFMG) e bacharel em direito pela mesma Universidade. Pesquisadora e especialista em Privacidade da Safernet Brasil.

Marina Garrote é advogada. Mestranda em Processo Civil pela Universidade de São Paulo. Especialista em Gênero e Sexualidade pelo Centro Latino-Americano em Sexualidade e Direitos Humanos do Instituto de Medicina Social da Universidade Estadual do Rio de Janeiro.

Hana e Marina são autoras do artigo “Direitos reprodutivos e vigilância: seus dados podem ser usados contra você” publicado em 27 de junho de 2022 no Portal Catarinas, texto que nos inspirou a trazer essa temática para reflexões e discussões.  

Este material foi idealizado pelo grupo composto pelas estudantes Bárbara Becker, Isabella Ferro, Maria Eduarda Machado, Mélanie Finkler e Natália Nunes, como parte de trabalho da disciplina de Sistemas de Accountability, ministrada pela Professora Paula Schommer no curso de Administração Pública da UDESC/ESAG. Foi gravado com Manu Halfeld e Marina Garrote no dia 06 de julho de 2022, e com Hana Mesquita no dia 14 de julho de 2022. 

Para aprofundamento no assunto, sugere-se a leitura completa do texto e de suas referências disponível neste link: https://catarinas.info/direitos-reprodutivos-e-vigilancia-seus-dados-podem-ser-usados-contra-voce/

Para acompanhar discussões sobre direitos humanos e tecnologias, sugere-se conhecer o trabalho das organizações: 

O podcast completo pode ser acessado através deste link no YouTube:  https://youtu.be/9I1VZ4qJ86w

Roteiro: Isabella Ferro e Mélanie Finkler
Edição: Maria Eduarda Machado e Natália Nunes
Apoio: Bárbara Becker

A transparência dos dados e a sobrevivência de transexuais

Por Shely de Farias, Valeska Boscato Eede e Carlos Eduardo Machado Massulo*

Entre os instrumentos para garantir os direitos básicos à vida dos transexuais e enfrentar as desigualdades históricas  que afetam essa população, estão as leis e o aparato estatal para seu cumprimento. Apesar da importância das leis, apenas isso não garante a proteção à vida dos transexuais. É importante que se tenha conhecimento dessas leis e que as informações sobre esse tema, que ainda hoje é um tabu, sejam difundidas para a sociedade. Os dados sobre o cumprimento ou não da legislação são também fundamentais para a manutenção e o aprimoramento das políticas que afetam diretamente a sobrevivência dos transexuais.  

O Brasil está dentro do grupo de países com maior número de leis em defesa das pessoas LGBTQIA+. A Constituição de 1988, apesar de não fazer menção explícita ao tema, assegura em diversos artigos a todo e qualquer cidadão o direito à vida, à educação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, à igualdade, à liberdade, bem como aos direitos civis e políticos. 

Há também  leis  específicas, como a Portaria nº 2.836 do Ministério da Saúde, em 2011, que estabeleceu a Política Nacional de Saúde Integral LGBT, com o objetivo de promover a saúde dessa população, instituindo mecanismos de gestão para atingir mais equidade no Sistema Único de Saúde, SUS, e a Resolução nº 175, de 2013, do Conselho Nacional de Justiça, que determinou proibição às autoridades competentes de recusarem habilitar ou celebrar o casamento civil entre pessoas do mesmo gênero. Ainda, em 2019, por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão nº 26, o STF decretou a possibilidade de atos homofóbicos e transfóbicos serem punidos como racismo, com base na Lei nº 7.716/1989, até que uma lei específica que trate sobre a homofobia e transfobia seja elaborada.

Na imagem 1, a seguir, é possível ver a situação atual quando o assunto são leis relacionadas à orientação sexual no mundo. A coloração varia entre aqueles com maior aparato protetivo legal – quanto mais intenso o azul, mais desenvolvido é o arcabouço legal de proteção de direitos – e aqueles com maior aparato legal voltado à criminalização, em que quanto mais intenso o  vermelho, mais fortes são as penalidades.

Imagem 1 – Leis de orientação sexual no mundo

Fonte: ILGA (2020)

Em contrapartida, ao buscar por dados em relação à violência às pessoas LGBTQIA+, podemos identificar que o Brasil é o país que mais mata transexuais no mundo há alguns anos, além de registrar outros atos de crueldade. Segundo o projeto de pesquisa Trans Murder Monitoring (TMM), que monitora, coleta e analisa os relatórios de homicídios de pessoas trans e com diversidade de gênero em todo o mundo, desde o início do levantamento, o Brasil tem sido o país que mais reporta assassinatos de pessoas trans no mundo. 

Dados atualizados em 2021 pela Transgender Europe (TGEU) mostram que, do total de 4.042 assassinatos catalogados, 1.549 foram no Brasil. Ou seja, sozinho, o país acumula 38,2% de todas as mortes notificadas de pessoas trans do mundo. A atualização de 2021 revelou, ainda, o total de 375 casos reportados de pessoas trans em 74 países em todo o mundo, entre 1 de outubro de 2020 e 30 de setembro de 2021. Conforme é possível visualizar no gráfico a seguir (Imagem 2), o Brasil permanece como o país que mais assassinou pessoas trans do mundo neste período, com 125 mortes, seguido do México (65) e dos Estados Unidos (53).

Imagem 2 – Gráfico: Levantamento Assassinatos TGEU

Fonte: Antra (2022)

Segundo a TGEU, no entanto, esses números não representam a transfobia no Brasil, já que não existem dados oficiais sobre a população trans. São redes como o Instituto Brasileiro Trans de Educação (IBTE), Antra e a Rede Trans que fazem o levantamento desses dados. Além disso, estima-se uma  quantidade gritante de casos não reportados e mortes com motivação transfóbica não registradas no sistema  de segurança pública. 

Mas quais os motivos para o contraste: um dos países que tem mais leis de proteção à diversidade de gênero é também o que mais mata? O caminho que buscamos para entender essa questão foi pela accountability e seus princípios, sendo ela uma obrigação que os governos e agentes públicos têm de justificar e explicar suas ações (answerability) e serem responsabilizados por seus atos e omissões (enforcement). Uma das dimensões essenciais para se garantir a accountability é a informação, disponibilizada de forma transparente e confiável, pois sem isso não é possível aplicar os instrumentos de controle e encontrar soluções para os problemas identificados.

A informação pública possibilita a accountability, enriquece o debate para a criação e avaliação das políticas públicas, reforça a defesa dos direitos humanos e ajuda a prevenir e  combater a corrupção. Com a transparência de dados e informações, os cidadãos podem inclusive apurar se tais informações estão de acordo com a realidade. O que vemos no Brasil com a falta de dados oficiais sobre as mortes dos transexuais parte de uma prerrogativa em que, se não há dados, não há responsabilização. A ausência de dados qualificados e disponíveis é um mecanismo que o governo e outros responsáveis utilizam para evitar a responsabilização.

Por isso, é importante que a sociedade cobre que essas informações sejam fornecidas de forma efetiva e que haja o cumprimento dos instrumentos legais já existentes. A confiança já está afetada, o espaço público, corrompido, a violência, difundida. Para que se possa (re)construir confiança nas relações entre as pessoas e entre cidadãos e governantes, para que se possa proteger a vida e os direitos, e desenvolver a democracia, há que promover continuamente a transparência, a accountability, a participação cidadã e o controle social. Para as pessoas transexuais, é uma questão de sobrevivência.

* Texto elaborado pelos acadêmicos de administração pública Shely de Farias, Valeska Boscato Eede e Carlos Eduardo Machado Massulo, no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, em 2022.

Referências 

BRUNA G. BENEVIDES (Brasília). ANTRA, 2022. Dossiê assassinatos e violências contra travestis e transexuais brasileiras em 2021.  Disponível em: <https://antrabrasil.files.wordpress.com/2022/01/dossieantra2022-web.pdf >. Acesso em: 08 jun. de 2022.

ILGA (Brasil, 2020). Mapas: leis de orientação sexual. Este mapa é apoiado pelos dados coletados em Homofobia Patrocinada pelo Estado 2020: Atualização da Visão Geral da Legislação Global (publicado em dezembro de 2020). Disponível em: <https://ilga.org/maps-sexual-orientation-laws >. Acesso em: 06 jun. 2022.

PINHEIRO, Ester. Há 13 anos no topo da lista, Brasil continua sendo o país que mais mata pessoas trans no mundo: segurança pública no país continua a ignorar questões de gênero e 11 estados brasileiros não têm dados sobre lgtbi+fobia. Segurança pública no país continua a ignorar questões de gênero e 11 estados brasileiros não têm dados sobre LGTBI+fobia. 2022. Disponível em: <https://www.brasildefato.com.br/2022/01/23/ha-13-anos-no-topo-da-lista-brasil-continua-sendo-o-pais-que-mais-mata-pessoas-trans-no-mundo >. Acesso em: 09 jun. 2022.

Para saber mais sobre a luta para sobrevivência dos transexuais no Brasil:

[NUGEN – Núcleo De Gênero e Diversidade] Dia da Visibilidade Trans: uma linha do tempo da luta e dos direitos de travestis, transexuais e transgêneros

[UNIPÊ] Travestis-e-Transexuais-desigualdade-e-exclusão-social-.pdf (unipe.edu.br)

[POLITEIA] Pessoas autodeclaradas LGBTQIA+ no sistema penitenciário brasileiro: o que dizem (e não dizem) os dados – POLITEIA

[Associação Nacional de Travestis e Transexuais] https://antrabrasil.org/

[No Corpo Certo]  https://nocorpocerto.com/tag/trans/    

Como fiscalizar as proibições das propagandas eleitorais? 

Por Estefani Silva, Guilherme Althoff, Lízia Lessa e Marcelo Caldas* 

A Pré-Campanha é algo relativamente recente na legislação eleitoral brasileira. O período de Pré-Campanha foi instituído no processo eleitoral brasileiro em 2015, através da Lei Federal nº 13.165. Antes dessa reforma eleitoral, nenhum tipo de propaganda eleitoral era permitido antes das convenções partidárias. Com a mudança, foi permitida a pré-campanha, desde que não contenha pedido de votos. Historicamente, o tempo de campanha era de 90 dias. Após a reforma, visando a redução dos gastos de campanha, este prazo foi reduzido pela metade. Um dos objetivos foi o de promover mais paridade entre os candidatos, visto que aqueles que possuíam mais recursos poderiam manter sua campanha/propaganda por mais tempo do que os concorrentes com menos disponibilidade de recursos. Outro fator está relacionado ao interesse dos eleitores. Com um prazo menor de campanha, busca-se obter mais atenção dos eleitores quanto ao processo eleitoral como um todo. As novas regras passaram a valer nas eleições municipais de 2016. 

Não apenas durante a pré-campanha, quando se trata de eleições, muitas dúvidas vêm à mente dos eleitores. Trataremos de algumas delas a seguir.

Afinal, o que é permitido e o que é proibido?

De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral, TSE, na pré-campanha, desde que não haja pedido explícito de voto, o artigo 36 da chamada Lei das Eleições (Lei nº 9.504/1997) prevê que não configura propaganda eleitoral antecipada situações como mencionar uma eventual candidatura e exaltar as qualidades pessoais dos pré-candidatos. Neste ano, a campanha terá apenas 46 dias de ações nas ruas e na internet, entre 16 de agosto e 1º de outubro. 

Outro tema que costuma gerar dúvidas é o impulsionamento de conteúdo, ou seja, a promoção de candidatos e propostas através da inserção de anúncios e divulgação de posts segmentados em redes sociais. 

Como funciona o impulsionamento de conteúdo nas propagandas eleitorais? O que pode e o que não pode nesse quesito? 

● É permitido a partir da pré-campanha; 

● Não pode haver disparo em massa de conteúdo por meio de aplicativos de mensagem instantânea; 

● Não pode haver pedido explícito de votos; 

● O limite de gastos deve ser respeitado, afinal cada partido tem o valor a ser gasto.

Conforme destacado pelo TRE-MG, quem pode realizar o impulsionamento:

“Apenas as empresas cadastradas na Justiça Eleitoral poderão realizar o impulsionamento de propaganda eleitoral, uma vez que é necessário identificar quem contratou os serviços.” 

Entrevistas são permitidas? 

As entrevistas são uma forma de levar conteúdo aos eleitores. É liberada a participação de pessoas filiadas a partidos políticos ou pré-candidatos em entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na internet, inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos. No entanto, as emissoras de rádio e de televisão têm o dever de dar o mesmo tratamento a todos. 

O órgão que assegura e monitora essas questões é o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), segundo a resolução TSE nº 23.610 “ […] não é permitido dar tratamento privilegiado a determinada candidatura, legenda, federação ou coligação e veicular filmes, novelas e qualquer tipo de programa que faça alusão ou crítica aos participantes da eleição.” 

Em debates, por exemplo, é necessário que todos sejam convidados, mas o programa pode ser levado ao ar sem a presença daqueles que não aceitarem o convite, desde que haja no mínimo três concorrentes. 

Roberto Carlos Martins Pontes, Consultor legislativo da Câmara dos Deputados na área de Direito Constitucional, Administrativo e Eleitoral, explica a importância das leis e normas nas propagandas eleitorais. Segundo Roberto, desta forma é possível estabelecer uma igualdade entre os candidatos, conforme se pode ver no vídeo Regras de Propaganda Eleitoral, Jornada de Debates Eleitorais 2022, disponível no canal Escola da Câmara no Youtube.

Quando e como o eleitor pode se manifestar

Anterior à data da eleição, é permitido o uso de alto-falantes e amplificadores de som em horários determinados, no primeiro turno (dentre as datas de 16 de agosto à 01 de outubro), no eventual segundo turno após 24 horas do encerramento da votação do primeiro turno (dentre as datas de 03 de outubro à 29 de outubro). É permitido o uso de camisas e itens como broches e adesivos e, em seus automóveis adesivos e plotagem. 

No dia da eleição o eleitor poderá revelar a sua preferência por determinado candidato, desde que seja por meio de manifestação silenciosa. São permitidos o uso de exclusivamente: broches, bandeiras, dísticos, adesivos e camisetas.

Outras proibições de pré-campanhas e campanhas eleitorais 

Desde 2006, não é permitido qualquer tipo de propaganda eleitoral em outdoors, em qualquer época, uma vez que extrapola o tamanho permitido por lei (50 centímetros por 40 centímetros de dimensão – Lei das Eleições – artigo 38, parágrafo 3º). Os partidos políticos, as federações, as coligações, as candidatas e os candidatos e até mesmo a empresa responsável por instalar outdoor poderão pagar multa no valor de R$ 5 a R$ 15 mil reais. 

Durante a campanha eleitoral em geral, incluindo a pré-campanha, é proibida a realização, presencial ou transmitida pela internet, para promoção de candidatos e a apresentação, remunerada ou não, de artistas com a finalidade de animar comício e reunião eleitoral. A única exceção é a realização de shows e eventos com o objetivo específico de arrecadar recursos para a campanha, sem que haja pedido de voto. 

A propaganda antecipada também é proibida, entretanto são muitos os impasses, conforme se vê neste trecho que cita Acacio Miranda da Silva Filho, especialista em direito constitucional e eleitoral:

“Existe muita dificuldade na interpretação. Sobre a questão dos outdoors, em regra, o próprio candidato não pode custear. Os do Bolsonaro foram custeados por terceiros, e aí entra na questão da liberdade de manifestação. A bandeira do Lollapalooza também foi usada por terceiros, sem o número da campanha. Não há, até o momento, um caso realmente de propaganda antecipada (entre os presidenciáveis)” 

Agora que conhecemos as proibições, como podemos ajudar a fiscalizar? 

É responsabilidade de cidadãos, candidatos, partidos ou coligações fiscalizar e reportar às autoridades (Ministério Público Eleitoral e Juízes Eleitorais) possíveis irregularidades vistas. Existem alguns meios para isso e um deles é o aplicativo Pardal, do TSE. Está disponível tanto na loja google play, quanto na app store. Este aplicativo permite que o fiscalizador denuncie de forma rápida a irregularidade encontrada. 

Nas denúncias feitas por meio do Pardal, deverão constar, obrigatoriamente, o nome e o CPF do cidadão que as encaminhou, além de elementos que indiquem a existência do fato, como vídeos, fotos ou áudios, resguardada ao denunciante a opção pelo sigilo de suas informações pessoais. Via aplicativo, é possível ter acesso a todas as proibições nas propagandas eleitorais. 

Mesmo com o auxílio do aplicativo possibilitando o conhecimento sobre as regras e meios de controle estipulados, as constantes novidades nas campanhas tornam mais difícil a fiscalização e a coibição de irregularidades durante a campanha. Alguns casos poderão ser investigados e punidos depois, como por exemplo no caso julgado pelo TSE, que pune o deputado Heitor Freire por ter impulsionado vídeo com propaganda negativa de seus adversários nas eleições de 2020. Outros casos poderão ser perdoados, como no caso em que a Câmara aprovou anistia a partidos que descumprem verba a mulheres e negros. Outros casos que venham a ocorrer neste ano talvez serão coibidos em legislação futura e outros sequer serão considerados. 

* Texto elaborado pelos acadêmicos de administração pública Estefani Silva, Guilherme Althoff, Lizia Lessa e Marcelo Caldas, no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, em 2022.

Referências

CASOY. Boris. Na calada da noite, Câmara aprova anistia a partidos que descumprem verba a mulheres e negros. Disponível em: 

<https://www.cnnbrasil.com.br/politica/na-calada-da-noite-camara-aprova-anistia-a-p artidos-que-descumprem-verba-a-mulheres-e-negros/>. Acesso em: 13 de junho de 2022. 

CORREIA, Victor. Correio Braziliense. Pré-campanha eleitoral está mais flexível, mas pedir voto é proibido. Disponível em: <https://www.correiobraziliense.com.br/politica/2022/05/5009780-pre-campanha-mai s-flexivel.html>. Acesso em 10 de junho de 2022. 

MENDES. Lucas. TSE multa por vídeo impulsionado com propaganda negativa. Disponível em:  <https://www.poder360.com.br/justica/tse-multa-por-video-impulsionado-com-propag anda-negativa/. Acesso em: 13 de junho de 2022. 

SCALCO, Patrick. Impulsionamento de conteúdo em pré-campanha – Migalhas. Migalhas. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/depeso/364943/impulsionamento-de-conteudo-em-pr e-campanha>. Acesso em: 13 de junho de 2022. 

TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL, TSE. Aplicativo Pardal permite denunciar irregularidades em campanhas. Disponível em: <https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2020/Setembro/aplicativo-pardal-permi te-denunciar-irregularidades-em-campanhas>. Acesso em 12 de junho de 2022. 

TSE. Conheça as regras para exibição de propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão. Disponível em: <https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2022/Janeiro/eleicoes-2022-conheca-a s-regras-para-exibicao-de-propaganda-eleitoral-gratuita-no-radio-e-na-televisao>. Acesso em: 13 de junho de 2022.

TSE. Resolução nº 23.610, de 18 de dezembro de 2019. <https://www.tse.jus.br/legislacao/compilada/res/2019/resolucao-no-23-610-de-18-de -dezembro-de-2019>. Acesso em: 13 de junho de 2022. 

TSE. Denúncia eleitoral. Disponível em: <https://www.tse.jus.br/eleicoes/eleicoes-2018/denuncias-eleitorais>. Acesso em 12 de junho de 2022. 

TSE. Eleições 2022: confira ações antes do início oficial da campanha. Disponível em: <https://www.tse.jus.br/comunicacao/noticias/2022/Marco/eleicoes-2022-confira-aco es-permitidas-antes-do-inicio-oficial-da-campanha>. Acesso em 10 de junho de 2022. 

Lei de Acesso à Informação e Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais: Conflito ou Harmonia?

Por Eliézer Firmiano, Jessica Medeiros, Patricia Corrêa e Thael Rosa*

Quais são os limites entre a transparência pública e a proteção dos dados pessoais? 

Para descobrirmos se a Lei de Acesso à Informação (LAI) e a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) estão em conflito ou em harmonia, precisamos antes compreender o que é o acesso à informação e, em seguida, entender essas leis.

O acesso à informação pública no Brasil é definido sobretudo na Lei nº 12.527 (Lei de Acesso à Informação), de 18 de novembro de 2011, e por decretos regulamentadores de órgãos públicos. O interesse coletivo é o balizador do acesso à informação. Isto permite o acesso a diversos dados e documentos relativos, por exemplo, a processos licitatórios, planejamento e execução orçamentária, execução de obras, prestação de contas e serviços públicos, com exceção de informações definidas como sigilosas.

Além das informações que já são publicadas pelos órgãos públicos, a LAI garante que qualquer pessoa, física ou jurídica, possa solicitar acesso às informações públicas, desde que não sejam classificadas como sigilosas. O procedimento deverá respeitar os prazos, regras, instrumentos de controle e recursos previstos na LAI e suas regulamentações em cada órgão. Há prazos estipulados para resposta e, em caso de indeferimento do pedido, cabe recurso ao próprio órgão, às demais instâncias administrativas ou a judicialização.

A LAI segue um dos princípios basilares da administração pública, a publicidade, sendo este o argumento para embasar os pedidos de acessos. Conforme o Artigo 5º, inciso XXXIII, da Constituição Federal:

Todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.

A importância da LAI é inquestionável, uma vez que ela preza pela democracia e pela abertura do governo, além de funcionar como um mecanismo essencial para a transparência. As informações obtidas através da LAI são necessárias para a integração da população com o Estado.

Já a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, LGPD, Lei n° 13.709, de 14 de agosto de 2018, que dispõe sobre a proteção de dados pessoais, estabelece diretrizes importantes e obrigatórias para a coleta, o processamento e o armazenamento de dados pessoais. Esta lei tem como principal objetivo proteger os direitos fundamentais de liberdade, privacidade e personalidade dos cidadãos. 

É importante ressaltar que a LGPD não se aplica para fins jornalísticos, acadêmicos e de segurança pública, para fins particulares e não econômicos e para investigações e expressões de infrações penais. Além disso, a LGPD é de interesse particular, isso significa que apenas o titular dos dados tem o direito de fazer a  solicitação ao controlador dos dados pessoais, conforme o artigo 18 da LGPD, onde estão definidos os direitos que o titular dos dados possui e que podem ser exercidos.

A LGPD também estipula prazos e obriga o ente público a disponibilizar as informações pessoais do titular dos dados. Entretanto, em caso de negação, os órgãos a serem acionados são a Associação Nacional dos Profissionais de Privacidade de Dados – ANPPD, as instâncias administrativas e o judiciário.

A figura 1, a seguir, apresenta dois exemplos de solicitação de informações, tanto pela LAI quanto pela LGPD. O pedido do projeto pedagógico da escola pelos pais de um aluno é fornecido pela escola através da LAI. Já o pedido do histórico escolar de seu filho é embasado pela LGPD. Estes pais não conseguiriam o histórico escolar de outra criança que não fosse seu filho, pois esta criança estaria protegida pela LGPD. 

Figura 1 – Exemplo dos filtros de informaçãoC:\Users\patricia.correa\Desktop\Capturar.PNGFonte: Elaborado pelos autores (2022)

A LGPD preocupa-se com violações dos dados e obriga as empresas privadas de qualquer porte e pessoas jurídicas de direito público a nomearem um encarregado de dados, com a finalidade de identificar falhas, mapear fluxos de dados e elaborar um relatório de análise de impacto no caso de vazamento de informações pessoais.

O dado ou a informação, conforme ilustrado na figura 2, tem um ciclo de vida, que se inicia com sua coleta, seu uso, armazenamento e descarte apropriado. Em todas essas etapas é preciso certificar que esta informação pessoal estará segura, para manter algumas de suas características essenciais. A confidencialidade é um atributo que garante que a informação seja acessada somente a quem é de direito. Integridade corresponde à preservação da precisão, consistência e confiabilidade dessa informação. Já a disponibilidade tem relação com a possibilidade de consulta a qualquer momento.

Figura 2 – Tratamento da InformaçãoC:\Users\patricia.correa\Desktop\Capturar2.PNGFonte: Elaborado pelos autores (2022)

A ANPPD elencou as dez principais características da LAI e da LGPD (Figura 3), facilitando comparar e identificar particularidades e a complementaridade  entre ambas.

Figura 3 – Principais Pontos LAI x LGPDFonte: Teixeira (2020)

Não há contradição evidente entre LAI e LGPD. Ambas as leis tratam da transparência no fluxo e no acesso de informações. É assegurado o acesso às informações de interesse público e coletivo, que não sejam sigilosas e nem sensíveis, resguardando o direito que tanto a Administração Pública quanto as pessoas possuem de proteger seus dados sensíveis, particulares e sigilosos. Portanto, não é razoável que se use de uma das leis como subterfúgio para dificultar o acesso à informação pública, ou para publicizar dados propriamente privados. 

*Texto elaborado pelos acadêmicos de administração pública Eliézer Firmiano, Jessica Medeiros, Patricia Terezinha Corrêa e Thael Rosa, no âmbito da disciplina sistemas de accountability, da UDESC/ESAG, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, no primeiro semestre de 2022.

Referências 

TEIXEIRA, Ilderlândio. Acesso à Informação vs. LGPD. Brasília: Anppd, 2020.

BRASIL. Lei Nº 12.527, de 18 de novembro de 2011. LEI DE ACESSO A INFORMAÇÃO (LAI), 2011. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12527.htm>. Acesso em: 04 jul. 2022BRASIL.

BRASIL. Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/L13709.htm>. Acesso em: 04 jul. 2022.

Prestação de Contas e Organizações da Sociedade Civil: processo, resultados e confiança

Por Laís Dorigon Rodrigues, Julianna Luiz Steffens e Juliana Sartori*

A atuação das Organizações da Sociedade Civil (OSC) é indispensável para a garantia dos direitos fundamentais, para complementar e equilibrar a ação do  Estado, além de suprir  demandas coletivas da população. Essas organizações nascem com a intenção de reafirmar o caráter autônomo, a finalidade pública e a voz própria da sociedade civil organizada.

No Brasil, o crescimento do número e a diversidade de OSCs ocorre com a democratização do Estado e a ampliação de direitos de cidadania, como fruto de conquistas de movimentos sociais e outros segmentos, que reivindicavam ao Estado direitos sociais para a sociedade, tais como o direito à educação, saúde, alimentação e trabalho, dispostos no título II da Constituição Federal de 1988 (Brasil, 1988), e que por muito tempo foram menosprezados pelas elites que compunham parte do aparato estatal (ALVES, 2013). 

As organizações da sociedade civil fazem parte do chamado terceiro setor, um termo que remete ao conjunto de relações sociais diferentes das do Estado e do mercado de caráter privado, mas que se dedicam ao bem-estar e ao aperfeiçoamento social (FERREIRA, 2009). Elas não possuem fins lucrativos, entretanto precisam de recursos para proverem suas atividades. Dentre as fontes de recursos possíveis, estão as doações, que podem ser  dedutíveis ou não dedutíveis do imposto de renda, de pessoas físicas e jurídicas, patrocínios, subvenções e auxílios, entre outros. Entre os financiadores da ação das OSCs, podem estar os governos e o setor privado, geralmente a partir de editais de fomento.

A partir da Lei 13.019/2014, conhecida como o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC), foram  criadas novas regras para as relações de parceria entre governos e organizações, possibilitando mais segurança e visibilidade ao trabalho que a sociedade civil organizada desenvolve no Brasil. Isso é reflexo da abertura do Estado à participação social e do reconhecimento aos resultados que essas organizações podem ter  na busca de uma comunidade mais justa e participativa. Isso reforça a importância da sociedade organizada para a criação e o desenvolvimento de novas tecnologias sociais e para a formulação e execução das políticas públicas.  (LOPES; SANTOS; XAVIER, 2014)

De acordo com Willian Narzetti, gerente executivo do Instituto Comunitário da Grande Florianópolis, (ICOM), a Lei n. 13.019/2014 trouxe uma nova ótica para o terceiro setor, desta vez orientada para resultados, ou seja, as organizações precisam cumprir aquilo que elas se propõem a fazer em projetos específicos. O mais importante na atuação das OSCs é o impacto que geram para a sociedade.

Figura 1: Entrevista com Willian Narzetti | Disponível em: https://youtu.be/6prUhec51s8

O ICOM participa da Plataforma MROSC, uma rede de articulação de organizações sem fins lucrativos e de interesse público, que tem por objetivo aprimorar o ambiente social e legal de atuação das organizações. Um dos objetivos da Plataforma é garantir que não haja diferença na interpretação do que foi acordado no Congresso Nacional, através da Lei 13.019/2014, tentando manter o espírito dessa lei que busca fortalecer as organizações da sociedade civil e suas relações de parceria com o Estado.

Uma das frentes de trabalho do ICOM é auxiliar organizações da sociedade civil a terem uma gestão mais eficiente e a servirem como canais de participação dos cidadãos para melhorarem a qualidade de vida na Grande Florianópolis e em Santa Catarina. As principais áreas de atuação do Instituto são: investimentos sociais na comunidade, apoio técnico e financeiro a OSCs e produção e disseminação de conhecimento. 

Dentre as atividades de apoio técnico, estão as de orientação para as organizações a respeito de prestação de contas quando elas participam de editais de fomento, ou seja, quando recebem recursos financeiros para algum projeto social e precisam se submeter ao processo de prestação de contas desse dinheiro. Esse processo está relacionado com a accountability, ao trazer informação e justificação do uso do recurso e a responsabilização sobre o seu  uso correto ou inadequado. Aqui entra também o aspecto de enforcement – quando a OSC presta contas corretamente, ela é premiada, ganhando legitimidade por sua capacidade e correção e podendo obter recursos novamente, ou punida, quando fica impedida, por exemplo, de obter o próximo recurso até sanar as pendências na prestação de contas.

Para William, a prestação de contas é algo bastante delicado, pois muitas vezes quem analisa a prestação de contas não  observa  a finalidade de cada  organização, ou seja, não se pensa no benefício maior e no impacto que a instituição exerce na sociedade, mas sim, se verifica apenas os meios. Esse é um dos aspectos que se relaciona com um tipo de accountability mais formal ou institucional, que focaliza os  padrões  estabelecidos por leis, normas, regulamentos e procedimentos. Isso se reflete  em muitos  editais e suas exigências de prestação de contas, com mais  apego ao processo e não ao fim.

Ao analisar os diversos editais de fomento que a organização já participou, é notória a diferença entre editais nacionais e internacionais, com ênfase na etapa de prestação de contas. Na entrevista realizada com a Guardiã de Relacionamentos do ICOM, Mariana de Assis, foi possível entender as diferenças dos editais. Organizações internacionais como a CFLeads e a Mott Foundation – que possuem o objetivo de auxiliar as fundações da comunidade no mundo inteiro a acessar ferramentas para reunir recursos e desenvolver projetos que promovam uma sociedade justa, equitativa e sustentável – adotam  um tipo de prestação de contas que prioriza o resultado e o impacto que determinada ação causou na sociedade. É um formato menos burocrático, indo além do valor monetário e dos documentos fiscais.

Em relação às instituições nacionais, podemos citar o Fundo para a Infância e Adolescência, FIA, um fundo vinculado aos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente Municipais e Estaduais, criado para captar e aplicar recursos financeiros destinados especificamente para a área da infância e adolescência. Os fundos especiais são constituídos por receitas definidas em lei, que estão vinculadas à realização de determinado objetivo ou serviço. Os fundos públicos geralmente possuem  uma estrutura de prestação de contas complexa e burocrática, ao cobrar documentos físicos com carimbos específicos e previsão de  devolução de recursos não utilizados. Em diversos editais,  as regras para prestação de contas e devolução de recursos não são claras, divulgadas depois  das inscrições para o edital. 

Na entrevista com gestores do ICOM, foi comentado que muitas organizações não possuem sequer estrutura para fazer uma prestação de contas elaborada em tantas minúcias como as exigidas em certos editais, pois não dispõem de recursos humanos excedentes para isso, o que torna ainda mais difícil cumprir esse processo. Isso vai na contramão do que propõe a Lei do Marco Regulatório das OSCs, cuja orientação é voltada para resultados e não para processos. Isso contribui para uma cultura ainda mais burocrática e para o engessamento dessas organizações, tornando seu trabalho mais moroso e menos efetivo.

A partir  das reflexões dos nossos entrevistados, percebemos a necessidade de utilização efetiva dos mecanismos disciplinados no Marco Regulatório das organizações da sociedade civil e da proposição e consolidação de mudanças no processo de prestação de contas das OSCs, entre elas:

  • Mudança do foco do controle financeiro para um controle de resultados; 
  • Processos de prestação de contas mais adaptáveis conforme o contexto de cada projeto;
  • Divulgação das exigências dos processos de prestação de contas em conjunto com a divulgação os editais de fomento; 
  • Mais flexibilidade na utilização dos recursos recebidos; 
  • Trâmites menos burocráticos, apoiados em novos recursos virtuais, como a utilização de documentos assinados de forma digital; 
  • Capacitação das OSCs para estarem aptas a prestarem contas ao órgão de fomento, de preferência incluindo essa qualificação nos editais.

Cabe nos apoiarmos mais no Princípio da Confiança e partir do pressuposto que as organizações da sociedade civil, assim como os cidadãos e os agentes públicos estatais, trabalham de forma íntegra com os recursos públicos, visto que poucas são exceção. Ou seja, talvez seja necessário punir a exceção e não tornar a punição – o endurecimento das regras de prestação de contas – uma regra geral, e assim punir a todos, o tempo todo.  As OSCs  devem direcionar seus esforços para aquilo em que são excelentes, ou seja, seu escopo de atuação. A informação e a transparência devem caminhar junto ao processo de responsabilização, de forma a ampliar a visibilidade para as causas e seus resultados alcançados. 

Você pode acessar a entrevista completa do Gerente Executivo do ICOM, Willian Carlos Narzetti neste link: https://youtu.be/6prUhec51s8 

Você pode acessar a entrevista completa da Guardiã de Relacionamento com a Sociedade Civil Organizada do ICOM, Mariana de Assis neste link: https://youtu.be/ou2x1nucrvQ 

*Texto elaborado pelas acadêmicas de administração pública Laís Dorigon Rodrigues, Julianna Luiz Steffens e Juliana Sartori, no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, em 2022.

REFERÊNCIAS  

ALVES, Mario Aquino. Empresas, Sociedade Civil e Desenvolvimento Local. In: Ecossistema do Desenvolvimento Local no Brasil: Diálogos sobre a Relação e o Papel do Governo Da Iniciativa provada e da Sociedade Civil Organizada. São Paulo: ICE, GIDE, IBRF, FGV: 2013. P. 15 – 19. Disponível em: http://gife.issuelab.org/resource/ecossistema_do_desenvolvimento_local_no_brasil_dialogos_sobre_a_relacao_e_o_papel_do_governo_da_iniciativa_privada_e_da_sociedade_civil_organizada

CFLeads. Disponível em: <https://cfleads.org/>. Acesso em: 08, jul 2022.

FERREIRA, Sílvia. Terceiro sector. Dicionário internacional da outra economia, p. 322-327, 2009.

LOPES, Laís de Figueiredo; SANTOS, Bianca dos; XAVIER, Iara Rolnik (orgs.). Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil: A Construção da Agenda no Governo Federal – 2011 a 2014. Secretaria-Geral da Presidência da República – Brasília: Governo Federal, 2014. 240 pp. I

MÂNICA, Fernando Borges. O que muda com o novo Marco Regulatório das organizações da sociedade civil lei 13019/2014. Atuação. Disponível em: <https://saotomedasletras.mg.gov.br/wp-content/uploads/2022/03/cartilha_do_marco_regulatorio_terceiro_setor.pdf > . Acesso em: 07, jul  2022.

Mott Foundation. Disponível em: <https://www.mott.org/>. Acesso em: 08, jul 2022.

TJSC. Fundo para a Infância e Adolescência – FIA. TJSC. Disponível em: <https://www.tjsc.jus.br/web/infancia-e-juventude/fundo-para-a-infancia-e-adolescencia-fia>. Acesso em: 02, jul 2022.

SOBRAL, Miriam Oliveira de Aguiar. O novo marco regulatório das organizações do terceiro setor: o que muda na captação e gestão de recursos públicos? 2016.

Para saber mais sobre o tema:

Plataforma OSCs – Plataforma por um Novo Marco Regulatório para as Organizações da Sociedade Civil – Articulação de organizações e pessoas que vem trabalhando para aprimorar e estudar a implementação do MROSC.

Coprodução e lógicas institucionais no processo de implementação do Marco Regulatório… (usp.br) Dissertação  de Bruna Holanda e da Patrícia Mendonça sobre o tema.

OSC Legal – organização que produz conteúdos (textos blog, vídeos e debates sobre MROSC e outros aspectos da gestão de OSCs.

A Associação dos Pacientes Renais de Santa Catarina e como a prestação de contas pode ser aliada para a credibilidade de organizações da sociedade civil – POLITEIA (politeiacoproducao.com.br) – texto de colegas em semestre anterior que possui relação com o tema.