Tendências na padronização e divulgação de dados contábeis dos clubes de futebol brasileiros

Por Atila Alencar Rodrigues e João Felipe Dorneles Tournier*

O aumento da profissionalização dos clubes no futebol brasileiro vem gerando novos interesses e demandas dos atores envolvidos com os clubes, sejam eles os torcedores, associados, conselheiros, imprensa especializada, patrocinadores, investidores, entre outros. A informação contábil das entidades esportivas vem causando curiosidade e questionamento entre os chamados stakeholders devido aos esquemas de corrupções nos clubes, federações e confederações, e também pelo alto endividamento dos clubes brasileiros.

A divulgação das informações contábeis dos clubes que participam de competições com atletas profissionais está prevista na Lei nº 9.615 de 24 de março de 1998, conhecida como a Lei Pelé, que promoveu um avanço na regulamentação do futebol profissional no Brasil. O artigo 46-A da Lei Pelé define como prazo, para a publicação das demonstrações contábeis e dos balanços patrimoniais, o último dia do mês de abril. O artigo ainda apresenta uma série de punições aos gestores dos clubes que não cumprirem a determinação da publicação dos balanços. 

Outra ação que influencia a transparência dos clubes é o Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro (PROFUT), que vai além do parcelamento de dívidas. Inclui o objetivo de melhorar a gestão financeira através de comprovações de responsabilidade fiscal que demonstrem a regularidade do pagamento de tributos, salários e direitos de imagens dos atletas. 

No artigo Fatores Explicativos do Nível de Disclosure da Informação, Martins e Santos (2022) mostram a evolução da divulgação das informações contábeis dos clubes brasileiros da série A de 2018. Em comparação aos estudos de Souza et al (2016), Campeonato Brasileiro de 2013, e Mayer, Martins e Kronbauer (2018), 22 clubes foram analisados no período de 2012 a 2015, a média de divulgação foi de 68,66%, de 53,04% e 65,70% respectivamente.  

Com a obrigatoriedade da publicação anual do balanço patrimonial, muitos clubes passaram a informar seus balanços de forma complexa, sendo  que parte dos torcedores não possui conhecimento sobre análise contábil, deixando informações incompletas e despadronizadas. Conforme aumenta a profissionalização e o interesse dos stakeholders nos dados financeiros, vêm surgindo relatórios mais completos do futebol brasileiro, que agrupam elementos de outras áreas e cruzam com as informações financeiras, a fim de criar um contexto compreensível e que abarque diversos atores interessados. Em 2022, por exemplo, foi publicado o Relatório Convocados | XP: Finanças, História e Mercado do Futebol Brasileiro, da Convocados, empresa de consultoria focada em investidores no futebol, em conjunto com a XP Investimentos, que visa trazer uma visão completa da indústria. A figura 1, a seguir, ilustra a receita total dos clube da série A no ano de 2021:

Imagem 1: Receitas Totais por Clubes da Série A em 2021

Fonte: Relatório Convocados | XP: Finanças, História e Mercado do Futebol Brasileiro

A partir desse panorama, em que a transparência se tornou obrigatória e mais valorizada,  a divulgação contábil mais frequente mostrou ao público a necessidade de manter a situação financeira dos clubes saudável. A correlação entre desempenho esportivo e o endividamento dos clubes passou a ser mais visível e questionada, mostrando que os clubes endividados que montam times com performance positiva se tornaram esporádicos. Assim, a profissionalização da gestão dos clubes se torna peça fundamental na evolução esportiva e na aproximação com os torcedores.  A figura 2  ilustra a receita de transmissão por clube nos anos de 2020 e 2021:

Imagem 2: Direitos de Transmissão – Receitas por Clube (Clubes do Campeonato Brasileiro da Série A de 2022)

 Fonte: Relatório Convocados | XP: Finanças, História e Mercado do Futebol Brasileiro

A influência do desempenho esportivo não acontece apenas na arrecadação de receitas dos clubes, em que normalmente os clubes com maiores ganhos alcançam objetivos mais ambiciosos e recebem maiores cotas por isso. Influenciam também o nível de transparência e qualidade das informações contábeis divulgadas. No mesmo estudo de Martins e Santos (2022), a variável Ranking da CBF, colocada como fator de desempenho esportivo dos clubes da série A do campeonato brasileiro de 2018, confirma a relação positiva entre os dois fatores, confirmando que os clubes que obtiveram melhores resultados dentro de campo acabaram apresentando melhores níveis de divulgação contábil no período.

* Texto elaborado pelos acadêmicos de administração pública Atila Alencar Rodrigues e João Felipe Dorneles Tournier, no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, em 2022.

Referências

MARTINS, W. M.; SANTOS, R. R. dos. Fatores explicativos do nível de disclosure da informação contábil dos clubes de futebol brasileiros. CONTABILOMETRIA – Brazilian Journal of Quantitative Methods Applied to Accounting, Monte Carmelo, v. 9, n. 1, p. 57-72, jan.- jun./2022. 

MAYER R., MARTINS, V. Q.; KRONBAUER, C. A. A evidenciação de informações contábeis obrigatórias e voluntárias: um estudo em clubes de futebol brasileiros. In: Congresso Brasileiro de Custos, 25., 2018, Vitória. Anais […]. São Leopoldo, RS: Associação Brasileira de Custos, 2018. 

PROFUT – Mais do que o parcelamento de dívidas, uma esperança de dias melhores. Disponível em:

<https://universidadedofutebol.com.br/2020/08/08/profut-mais-do-que-o-parcelamento-de-dividas-uma-esperanca-de-dias-melhores/>. Acesso em: 04 dez. 2022.

A obrigatoriedade da publicação de balanços pelos clubes de futebol e … Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/depeso/328686/a-obrigatoriedade-da-publicacao-de-balancos-pelos-clubes-de-futebol-e-a-pandemia>. Acesso em: 03 dez. 2022.

Por que torcedores se interessam cada vez mais pelas finanças dos clubes. Disponível em: <https://oglobo.globo.com/esportes/por-que-torcedores-se-interessam-cada-vez-mais-pelas-financas-dos-clubes-25231763>. Acesso em: 07 dez. 2022.

Os torcedores de futebol: uma visão atual, seus riscos e oportunidades – Opinião. Disponível em:

<https://www.infomoney.com.br/colunistas/cesar-grafietti/os-torcedores-de-futebol-uma-visao-atual-seus-riscos-e-oportunidades/>. Acesso em: 06 dez. 2022.

Privatização da Eletrobras: reflexão a partir de mudanças na fase interna preparatória de aquisições

Por Maria Fernanda Cunha Cordeiro*

Uma das empresas líder em transmissão de energia elétrica do país, a Eletrobras, Centrais Elétricas Brasileiras, passou por diversas tentativas de privatização ou capitalização até deixar de ser uma empresa estatal. Em 1990, o processo de privatizações encabeçado pelo ex-Presidente da República Fernando Collor de Mello gerou o Programa Nacional de Desestatização, PND, através da Lei nº 8.031/1990. A intenção de privatizar a Eletrobras foi fortalecida pelo governo de Itamar Franco. De acordo com um relatório elaborado pelo Banco Nacional do Desenvolvimento (BNDES), o programa continuou com suas metas mesmo com a renúncia de Collor, e promoveu a venda de Usiminas em 1991, a desestatização de 15 empresas no período de 1993 a 1994, a venda da Companhia Vale do Rio Doce, em 1997, a venda da Gerasul, em 1998, a venda do controle de outras três importantes geradoras de energia elétrica, em 1999, entre outros efeitos. Em 2003, o Congresso Nacional votou pela Medida Provisória nº 144,  que foi convertida na Lei nº 10.848 de 15 de março de 2004, que removeu a Eletrobras do PND. 

Em 2017, no contexto do Programa de Parcerias de Investimento, foi recomendada a inclusão da organização no PND, o que foi confirmado em 2018 pelo governo de Michel Temer, através de decretos que permitiram estudos para capitalização, conforme relata reportagem do G1. O Projeto de Lei 9463/2018 foi a primeira iniciativa legal de Temer para a privatização da organização. Esses estudos perderam a validade, pois os parlamentares estavam divididos, diversos debates aconteceram e o projeto ficou parado, sem chegar à fase de votações. Sendo assim, a empresa foi retirada do PND novamente. Em 2019, o Governo Bolsonaro conduziu ao Congresso Nacional o PL 5877/2019, que dizia respeito à redução da participação da União no quadro acionário da Eletrobras, através de uma capitalização da companhia, no entanto esse projeto também ficou parado no Poder Legislativo.

Em 2021, a elaboração de uma Medida Provisória 1.031, de 23 de fevereiro, definiu os planos do governo para a capitalização e obteve sucesso após uma longa trajetória de tentativas. A privatização foi uma promessa do Ministro da Economia, Paulo Guedes, concretizada em junho de 2021, próximo ao fim do mandato de Jair Bolsonaro. A promessa de capitalização da Eletrobras foi uma das poucas concretizadas pelo governo, e vinha sendo pretendida desde o início do mandato, sob a justificativa de possibilidade de gerar mais investimentos no setor elétrico e estimular a oferta de energia no país.

De modo geral, as privatizações podem trazer amplas reações sociais sustentadas pelos medos do que podem trazer a um país, em  aspectos sociais, econômicos e ambientais. Neste texto, busca-se refletir sobre os riscos relacionados à accountability dentro da empresa, em específico nas fases preparatórias para um processo de compra. Com a privatização, a Lei 13.303/2016, que rege as empresas públicas, incluindo seus processo de licitações, passa a não ser mais aplicável à Eletrobras, assim como os regulamentos internos associados a ela. Os processos aqui analisados se referem à subsidiária CGT Eletrosul, sediada  em Florianópolis, onde atuei como estagiária no Setor de Administração de Materiais (SETAM) do Departamento de Operações e Logísticas.

Antes da privatização, o processo para realizar uma  compra seguia as seguintes etapas: análise da demanda, gestão de estoque (na qual são calculadas as quantidades necessárias para compra), contato com fornecedores, mapa de preço (incluindo cálculo de ICMS, IPI e DIFAL), elaboração de um Termo de Referência completo, conforme determinado pela lei, análise detalhada do Termo pelo setor de Análise Crítica, correção do Termo após a análise (quantas vezes necessário) e, por fim, o envio do documento e processo para o setor responsável pela licitação. 

É notável a profundidade que um processo de aquisição requeria. Isso  mudou completamente após a capitalização, uma vez que as etapas (logo após a privatização) tornaram-se as seguintes: análise da demanda, gestão de estoque, relatório de preços anteriores, elaboração de um Termo de Referência muito mais simples, revisão básica da análise crítica e envio para o setor responsável pela licitação.

Com a mudança, pode-se observar, por exemplo, que os dados utilizados nos relatórios de preços não foram atualizados, pois eram usados os de processos antigos. A revisão pelo setor de análise crítica, por reflexo, tornou-se  mais simples. Sem regulamentos, a padronização dos procedimentos foi afetada, pois cada setor passou a  desenvolver seu trabalho conforme considerou pertinente, sem uma referência ou orientação. Além disso, podemos refletir acerca do setor de Análise Crítica, que era um dos principais mecanismos de fiscalização dentro da fase preparatória, mas como se baseava na Lei, ficou sem saber o que fiscalizar. Ainda nos primeiros dias de empresa privada, o setor estava cobrando informações e procedimentos que pareciam ser sem sentido do ponto de vista da eficiência.

A experiência vivenciada permitiu observar que, em processos de desestatização, principalmente em empresas de grande porte, existem dificuldades naturais nos andamentos de algumas atividades, incluindo aquelas mais específicas, como os procedimentos acerca da fase preparatória de uma licitação. No entanto, é válido refletir sobre o tempo que a empresa teve para se preparar para a efetiva capitalização. Em procedimentos como esse, a organização poderia ter conhecimento e orientação sobre as atividades, como um regulamento para ações durante o período de transição, visto que a mudança organizacional é uma consequência do processo de privatização (OLIVA, 2002).

*Texto elaborado pela acadêmica de administração pública, Maria Fernanda Cunha Cordeiro, no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, em 2022.

Referências:

BNDES. Histórico. Disponível em: https://www.bndes.gov.br/wps/portal/site/home/transparencia/desestatizacao/processos-encerrados/Historico#:~:text=1990%2F1992,-Cria%C3%A7%C3%A3o%20do%20PND&text=Em%201990%2C%20com%20a%20cria%C3%A7%C3%A3o,da%20privatiza%C3%A7%C3%A3o%20foram%20significativamente%20ampliados. Acesso em: 10 de dezembro de 2022.

CRISÓSTOMO, V. L.; GIRÃO, A. M. C. Análise do compliance das empresas brasileiras às boas práticas de governança corporativa. REVISTA AMBIENTE CONTÁBIL – Universidade Federal do Rio Grande do Norte – ISSN 2176-9036, [S. l.], v. 11, n. 2, p. 40–64, 2019. DOI: 10.21680/2176-9036.2019v11n2ID16369. Disponível em: https://periodicos.ufrn.br/ambiente/article/view/16369. Acesso em: 31 de outubro.

BRASIL. PL 5877/2019. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2228666. Acesso em: 3 de novembro de 2022.

BRASIL. PL 9463/2018. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2167572. Acesso em: 3 de novembro de 2022.

CGT Eletrosul, 2022. Disponível em: https://www.cgteletrosul.com.br/. Acesso em: 10 de dezembro de 2022.

Eletrobras, 2022. Disponível em: https://eletrobras.com/pt/Paginas/Home.aspx. Acesso em: 10 de dezembro de 2022.

GONÇALVES, Júlia, Privatização no Brasil: descomplicando um tema econômico polêmico!. Politize!, 2022. Disponível em: https://www.politize.com.br/privatizacao-no-brasil/. Acesso em: 3 de novembro de 2022. 

MAZAUI, Guilherme; CASTILHOS, Roniara. Temer assina decreto que inclui a Eletrobras no programa de desestatização. G1 Globo, 2018. Disponível em: https://g1.globo.com/politica/noticia/temer-assina-decreto-que-inclui-a-eletrobras-no-programa-de-desestatizacao.ghtml. Acesso em: 10 de dezembro de 2022.

OLIVA, Eduardo de Camargo. A privatização de empresas siderúrgicas brasileiras: reflexos na gestão de recursos humanos. Revista de Administração Contemporânea [online]. 2002, v. 6, n. 1 [Acessado 11 Dezembro 2022], pp. 141-161. Disponível em: <https://doi.org/10.1590/S1415-65552002000100009>. Epub 30 Mar 2009. ISSN 1982-7849. https://doi.org/10.1590/S1415-65552002000100009.

PINHEIRO, Armando Castelar. Privatização no Brasil: por quê? Até onde? Até quando? In: GIAMBIAGI, Fabio; MOREIRA, Maurício Mesquita (Org). A economia brasileira nos anos 90. 1. ed. Rio de Janeiro : Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, 1999. p. 147-182.

Privatização da Eletrobras: entenda o que está sendo discutido! Politize!, 2021. Disponível em: https://www.politize.com.br/eletrobras-o-que-e/. Acesso em: 3 de novembro de 2022. 

Transparência e accountability na prestação de serviços públicos digitais

Por Naiala dos Santos e Tiago Batista*

Com as transformações sociais e tecnológicas contemporâneas, as Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) expressam e contribuem para mudanças nas políticas públicas e nas formas de prestação do serviço público. Busca-se melhorias em processos, produtos e serviços, além do aumento na transparência e accountability das ações públicas.

A partir de mudanças na operação governamental, a presença de algoritmos na tomada de decisão tem sido crescente. A utilização de algoritmos tem o intuito de automatizar as decisões e torná-las mais efetivas, mas seu uso também pode dificultar o acesso claro às informações (Saldanha, 2020) e às decisões que estão por trás de sua produção.

Prado (2009) destaca que a democracia eletrônica deve garantir ao público a oportunidade de consultar eletronicamente as informações e não apenas obter uma permissão formal de acesso. Afirma que essa democracia eletrônica deve ser estabelecida em dois pilares: acesso, entendido como a possibilidade de obter a informação, e acessibilidade, ou a facilidade de aproximar-se da informação**. De modo que, quando não se tem bons acessos eletrônicos e acessibilidade correta das informações governamentais, não existirá o poder de julgamento, uma vez que não se consegue verificar quais são as decisões e planos da administração pública.

Isso pode ser observado quando alguém vai até uma concessionária de automóveis para comprar um carro e, a partir do seu CPF, o sistema utilizado pela loja disponibiliza os dados do cliente e quais as condições de pagamento podem ser estabelecidas no caso. Sem acesso à forma de decisão do sistema, o cliente tem dificuldades, ou não tem como contestar as decisões das condições de pagamento, podendo apenas aceitar as possibilidades ou não de comprar o carro.

Saldanha (2020) afirma que esses algoritmos não são simples e objetivos, mas estão fundamentados em diferentes percepções e entendimentos da sociedade, contendo vieses que podem em muitos casos refletir em práticas discriminatórias.

Sendo assim, torna-se importante a disponibilização para o conhecimento da população sobre a forma de funcionamento dos algoritmos que controlam a prestação de serviços públicos eletrônicos. A transparência é um instrumento que possibilita a identificação e a correção de eventuais erros. Em decorrência disso, surge o termo accountability de algoritmos, representando a responsabilização algorítmica, segundo a qual, se houver dano, este pode ser avaliado, controlado e reparado. Segundo New e Castro (2018), a accountability de algoritmos tem por objetivo promover resultados desejados ou benéficos, proteger contra resultados indesejáveis ou prejudiciais e garantir que as leis para decisões humanas possam ser utilizadas em decisões algorítmicas. 

No Brasil, a Lei 13.709/2018, chamada Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais – LGPD, assegura o direito à explicação sobre os critérios utilizados em uma tomada de decisão automatizada. No art. 20, § 1º afirma que “O controlador deverá fornecer, sempre que solicitadas, informações claras e adequadas a respeito dos critérios e dos procedimentos utilizados para a decisão automatizada […]”. Pode inclusive ser realizada uma auditoria em caso de não oferecimento das informações.

A LGPD assegura, ainda, o direito à revisão da decisão tomada unicamente por tratamento automatizado, como explicitado no art. 20:

“O titular dos dados tem direito a solicitar a revisão de decisões tomadas unicamente com base em tratamento automatizado de dados pessoais que afetem seus interesses, incluídas as decisões destinadas a definir o seu perfil pessoal, profissional, de consumo e de crédito ou os aspectos de sua personalidade” (BRASIL, 2018).

A redação original do art. 20 da LGPD possibilita a revisão por um ser humano, entretanto, em 2019, a possibilidade foi vetada pelo presidente, tornando possível apenas a revisão por outra máquina, também baseada em algoritmos.

Isto posto, podemos concluir que a tecnologia aplicada aos sistemas de e-GOV deve ser objeto de muita discussão e análise crítica, estando a e-transparência brasileira ainda em estágio embrionário, já que a disponibilização de um serviço mais célere, sem mecanismos de transparência e accountability suficientes, acaba tornando-se não democrático (SALDANHA, 2020).

*Texto elaborado pelos acadêmicos de administração pública Naiala dos Santos e Tiago Batista, no âmbito da disciplina sistemas de accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, em 2022.

** Em 2005, foi lançado o Modelo de Acessibilidade de Governo Eletrônico (e-MAG), que recomenda a acessibilidade dos portais e sítios eletrônicos da administração pública ao maior número de pessoas possível, considerando as necessidades especiais de diferentes públicos que os utilizam.

Referências 

BRASIL. Lei nº 13709, de 14 de agosto de 2018. Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). 14 ago. 2018. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/l13709.htm. Acesso em: 23 nov. 2022.

BRASIL. Do Eletrônico ao Digital. Ministério da Economia, 25 nov. 2019. Disponível em: https://www.gov.br/governodigital/pt-br/estrategia-de-governanca-digital/do-eletronico-ao-digital. Acesso em: 6 dez. 2022.

NEW, Joshua. CASTRO, Daniel. How Policymakers Can Foster Algorithmic Accountability. 21 mai. 2019. Disponível em: http://www2.datainnovation.org/2018-algorithmic-accountability.pdf. Acesso em: 06 dez. 2022. 

PRADO, Otávio. GOVERNO ELETRÔNICO, REFORMA DO ESTADO E TRANSPARÊNCIA: O PROGRAMA DE GOVERNO ELETRÔNICO DO BRASIL. 2009. Tese (Doutorado em Administração Pública e Governo) – Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, 2009. Disponível em: https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/2501/72050100746.pdf?sequence=2&isAllowed=y. Acesso em: 23 nov. 2022.

SALDANHA, Douglas Morgan Fullin.Transparência e accountability em serviços públicos digitais. 2020. Dissertação (Mestrado em Administração Pública) – Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FACE) da Universidade de Brasília, Brasília, 2020. Disponível em: https://repositorio.unb.br/bitstream/10482/38702/1/2020_DouglasMorganFullinSaldanha.pdf. Acesso em: 23 nov. 2022.

Outros artigos e links de assuntos relacionados:

AMERICAN Civil Liberties Union. Disponível em: <https://www.aclu.org/issues/racial-justice/accountability-in-artificial-intelligence>.

INSTITUTO de Tecnologia e Sociedade. Disponível em: <https://itsrio.org/pt/home/>.

SALDANHA, DOUGLAS MORGAN FULLIN e SILVA, MARCELA BARBOSA DA. Transparência e accountability de algoritmos governamentais: o caso do sistema eletrônico de votação brasileiro. Cadernos EBAPE.BR [online]. 2020, v. 18, n. spe pp. 697-712. Disponível em: <https://www.scielo.br/j/cebape/a/gQ4YDzBjxFp7PpK5SZHbdHL/>.

O controle interno no processo licitatório: uma análise a partir dos exemplos do Tribunal de Contas da União e do município de Itajaí

Por Thiago Pedroso, Thamiris Pereira, Larissa Santos e Sara Stelzenberger*

Até 1808, existia no Brasil uma administração colonial relativamente aparelhada. Entretanto, o marco da construção do Estado nacional brasileiro se deu a partir do desembarque da Coroa portuguesa no Rio de Janeiro e a posterior elevação de Brasil a parte integrante do Reino Unido de Portugal, de modo a gerar um aparato governamental necessário à afirmação da soberania e ao funcionamento do autogoverno (LUSTOSA, 2008).

Tal período, da elevação do Brasil a Reino Unido de Portugal, Brasil Império e até 1930, a chamada Primeira República (1889-1930), ficou marcado pela gestão patrimonialista, centralização de poder e alternância de oligarquias no poder. Após a revolução varguista em 1930, apesar da manutenção de vícios de outrora, buscou-se mitigar o patrimonialismo existente, isto é, a incapacidade ou relutância do governante em distinguir seus bens privados do patrimônio público, por meio de um modelo administrativo pautado na burocratização weberiana do Estado (LUSTOSA DA COSTA, 2008).

Desde então, diferentes mecanismos que visam garantir o bom uso dos recursos públicos foram instaurados. Entre eles, a obrigatoriedade do processo licitatório para firmar contratos acerca de obras, serviços e aquisição de bens no âmbito da administração pública (AMORIM, 2019). Trata-se de procedimento administrativo pelo qual o poder público analisa e seleciona a proposta mais vantajosa para o interesse público, respeitando os princípios da impessoalidade, isonomia, eficiência e publicidade dos atos. Apesar de introduzida no direito público brasileiro há mais de 140 anos, a licitação somente recebeu status constitucional com o advento da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988),  posteriormente regulamentada pelas Leis 8.666/93 e 14.133/21 (POSSIDÔNIO, TORRES, 2019; AMORIM, 2019). 

Ademais, a CF de 88 constituiu o município como um dos entes da federação, atribuindo-lhe auto-organização, autogoverno, autolegislação e autoadministração (HARAGUCHI, 2009). Entretanto, dada a sua heterogeneidade, Haraguchi (2009) questiona a adequabilidade da Lei de Licitações aos municípios, sobretudo os pequenos. Segundo Haraguchi (2009), o principal problema é a complexidade da lei e a falta de conhecimento de quem tem a incumbência de aplicá-la. Destaca também que os órgãos de controle acabam por se ater demasiadamente à lei e ignorar que os gestores públicos e licitantes mal intencionados são a exceção. Em consonância, França et. al (2022), em um estudo quanto à institucionalização da nova lei de licitações, salientam que as principais dificuldades são a falta de conhecimentos específicos sobre a legislação por parte do quadro de pessoal para colocar a lei em prática; a quantidade de pessoas que trabalham no setor, insuficiente para atender as demandas; e as resistências culturais por parte de outros setores envolvidos no que diz respeito aos documentos e procedimentos na fase de planejamento da licitação.

Faccioni (2009, p. 138) comentava que as principais irregularidades encontradas nas licitações monitoradas pelo TCE/RS são “realizar modalidade imprópria de licitação; diferenças entre o objeto contratado e a realização da obra, resultando em pagamento de serviços não realizados; desdobramento de despesas visando evitar o procedimento licitatório; não aplicação de sanções por descumprimento de cláusulas contratuais; obras e serviços de engenharia com preços acima dos de mercado ou com quantitativos superestimados, quando não, obras e serviços incompletos ou mal executados”. 

Órgãos de diferentes níveis da administração pública brasileira, mesmo os de controle, possuem dificuldades na gestão e monitoramento de compras e contratações públicas, denotando a complexidade do processo licitatório.

Faccioni (2009) cita que tais irregularidades exigem cuidados tanto prévios, como concomitantes e, igualmente, após a prestação respectiva. Ainda, Haraguchi (2009) salienta que esses empecilhos ensejam ações no sentido de melhorar a capacitação dos responsáveis pelos procedimentos licitatórios e de aperfeiçoar os mecanismos de controle exercidos pelos órgãos fiscalizadores, pela própria administração interna e pela sociedade. 

De tal modo, haja vista a importância do processo licitatório para garantir os princípios da administração pública, bem como as dificuldades dos municípios na aplicação da Lei de Licitações, o presente texto apresenta como a accountability está presente na gestão interna do Tribunal de Contas da União (TCU), por meio do acompanhamento de processos licitatórios desenvolvido durante o estágio de uma das autoras. Além disso,  busca realizar um paralelo com a Prefeitura Municipal de Itajaí, por meio de entrevista com uma servidora sobre o  controle interno acerca do processo licitatório. Na sequência, há uma breve descrição do TCU, o detalhamento do controle dos processos licitatórios, seguida de apresentação da Prefeitura e das respostas da entrevista.

Conforme site oficial do TCU (2022), “o TCU é o órgão de controle externo do governo federal e auxilia o Congresso Nacional na missão de acompanhar a execução orçamentária e financeira do país e contribuir com o aperfeiçoamento da Administração Pública em benefício da sociedade”. 

No âmbito da Secretaria de Licitações, Contratos e Patrimônio (SELIP) do TCU, foi realizado em 2021 um mapeamento dos processos de trabalho, que deu origem ao acompanhamento semanal das etapas em que se encontram os processos de aquisições de bens e serviços por licitação. Esse mapeamento e o acompanhamento continuado foram identificados como necessários, uma vez que constava atraso nos processos de compras e não era possível  detectar quem eram os  responsáveis  e em qual etapa os atrasos aconteciam.

O acompanhamento dos processos licitatórios é feito para verificar se os prazos de cada etapa estão sendo cumpridos e agir para sanar dificuldades ou rever processos. Por exemplo, para estimar preço e elaborar termo de referência, o tempo de execução é de 15 dias úteis. Caso contrário, haverá atraso em outras partes, prejudicando o tempo ideal definido previamente. O tempo médio esperado em cada tipo de compra foi estipulado por meio de reuniões com as diretorias e com todos os envolvidos no trâmite processual, trazendo mais transparência sobre as etapas dos processos, bem como mais possibilidades de responsabilização aos servidores envolvidos, em caso de falhas ou omissões.

Esse acompanhamento se cumpre por meio de planilhas, cuja atualização é feita regularmente todas as segundas-feiras. Para conferir as etapas e os prazos estabelecidos, é utilizado o mapeamento do processo de trabalho “Aquisição de bens e serviços por licitação”, conforme Figura 1, a seguir.

Figura 1: Mapeamento do processo “Aquisição de bens e serviços por licitação” no âmbito do TCU

 Fonte: Documento interno Selip (2021).

Tratamos, agora, do município de Itajaí e seu controle interno. A escolha de Itajaí se deu porque um dos autores desenvolveu sua pesquisa para o Trabalho de Conclusão de Curso, TCC, em administração pública nesse município, de modo que a comunicação foi facilitada. Além disso, em 2017, a Prefeitura de Itajaí instituiu um modelo de gestão pública pautado no planejamento estratégico participativo. 

O município de Itajaí localiza-se no litoral norte de Santa Catarina (SC), possui área territorial de 289,215 km2, estimados 223.112 habitantes, densidade demográfica de 636,11 hab./km2, escolarização de 97,9% e Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) de 0.795 (IBGE, 2020). Para o exercício de 2021, a receita orçamentária foi de 1.801.675.237,00 (um bilhão, oitocentos e um milhões, seiscentos e setenta e cinco mil e duzentos e trinta e sete reais) e os contratos totalizaram o montante de 575.842.133,03 (quinhentos e setenta e cinco milhões, oitocentos e quarenta e dois mil, cento e trinta e três reais e três centavos) (PREFEITURA MUNICIPAL DE ITAJAÍ, 2021; TRIBUNAL DE CONTAS DE SANTA CATARINA, 2021).

Focalizamos a Diretoria Executiva de Licitações e Contratos do município, por meio de questionário com a servidora Fernanda Feller, diretora executiva do setor e especialista em licitações e contratos. A partir das respostas do questionário identificamos que Itajaí utiliza o Sistema Integrado de Processo Eletrônico (SIPE) para acompanhar as compras e contratações no município, assim como o TCU também faz uso do Sistema de Gestão Processual do TCU (e-TCU). Ambos possuem uma variedade de recursos, como expor o trâmite dos processos, as modificações e movimentações que ocorrem, disponibilizar diferentes relatórios, documentos e informações diversas acerca do processo. 

Assim sendo, constata-se que, a partir da implementação do SIPE, os processos de compras e contratações no município de Itajaí foram aperfeiçoados, uma vez que o sistema permite o acompanhamento e controle do processo licitatório eletronicamente, bem como favorece a interação entre os setores responsáveis, de modo a evitar atrasos e garantir a responsabilização por equívocos. 

Acerca do acompanhamento, Fernanda destaca que: 

O acompanhamento é imensamente importante para garantir o interesse público através das aquisições e prestações de serviço, garantindo a eficiência da Administração para a realização das demandas acompanhadas pelas respectivas Secretarias/Fundos/Fundação. Assim, com a utilização do novo sistema ficou demonstrado a todos servidores envolvidos como viabilizou o acompanhamento dos seus respectivos processos.

Consoantemente, Francismary Souza, Secretária da SELIP, em vídeo sobre o acompanhamento do TCU, salienta também quanto à iniciativa de mapear e acompanhar os processos licitatórios e destaca que: 

Quando começamos a fazer esse acompanhamento e os dados começaram a ser divulgados, preparando semanalmente um relatório e enviando para as caixas postais de todos, a gente percebeu que não só os gargalos diminuíram como ganhamos transparência no processo inteiro. Todos sabem o que todo mundo faz e o tempo que faz. Essa transparência gerou um senso de responsabilização nas equipes, e o resultado foi além do que estávamos esperando. As pessoas se adonaram dos processos de um jeito que todos ficaram responsáveis, sendo um ganho de accountability muito relevante.

Logo, é possível constatar que o SIPE proporcionou à prefeitura de Itajaí o acompanhamento e controle dos processos de compras e contratações, além de mais transparência aos servidores quanto às informações processuais e senso de responsabilidade para com a coisa pública, apresentando-se como um bom exemplo na gestão do processo licitatório.

Entretanto, conforme salientamos durante o texto, os municípios brasileiros, principalmente os pequenos, e até mesmo grandes órgãos, como os Tribunais de Contas, possuem dificuldades na aplicação da Lei de Licitações. De tal modo, destacamos a importância do controle interno do processo licitatório e a implementação de inovações, uma vez que Mafra et al. (2020) citam, a partir de entrevistas com especialistas em gestão de processos, que o mapeamento de processos, identificação de gargalos e proposição de soluções trazem ganhos substanciais para a gestão pública e tornam-se essenciais para favorecer o bom desempenho e a boa aplicação de recursos públicos.

* Texto elaborado pela(o)s acadêmica(o)s de administração pública Thiago Pedroso, Thamiris Pereira, Larissa Santos e Sara Stelzenberger, no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, em 2022.

Referências

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MAFRA, Ayla; VIANA, Icleusa; BERNARDES, Rosana; CUNHA, Tatiane. Gestão de processos no setor público: uma ferramenta de accountability. uma ferramenta de accountability. 2020. Disponível em: https://politeiacoproducao.com.br/gestao-de-processos-no-setor-publico-uma-ferramenta-de-accountability/. Acesso em: 06 dez. 2022.

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O Alzheimer não esquece o amor:  participação cidadã na política nacional de enfrentamento à doença de Alzheimer e outras demências

Por Juliana Korb Nogueira*

Em 16 de novembro de 2021, foi aprovado no senado federal o Projeto de Lei 4364/20, que institui a Política Nacional de Enfrentamento à Doença de Alzheimer e Outras Demências. O processo de elaboração e discussão do Projeto de Lei contou com a participação ativa do Conselho Nacional de Saúde e da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, além da participação de instituições de pesquisa, comunidade acadêmica e científica e várias outras organizações da sociedade civil.

O texto aprovado pelo Senado Federal agora está em análise na Câmara dos Deputados, onde passará por duas comissões e depois pelo plenário para então seguir para a sanção do Presidente da República.

Nesta análise sobre o processo em curso de elaboração da Lei Nacional de Cuidado Integral às Pessoas com a Doença de Alzheimer e Outras Demências (PL 4364/2020), identificamos a participação da sociedade civil e discutimos as implicações dessa participação na elaboração da Lei e como tende a se refletir na sua implementação.

A ocorrência do envelhecimento populacional mundial é vista como um dos principais ganhos sociais do século XX, mas também como um fator de risco para o desenvolvimento global. Como consequência, torna-se necessária a adoção de políticas públicas voltadas para os idosos. Mais do que isso, o aumento da expectativa de vida da população, que vinha crescendo antes da ocorrência da pandemia, traz à tona uma preocupação com o número de pessoas afetadas por doenças relacionadas à idade, como é o caso do mal de Alzheimer. 

Segundo Burlá et al. (2013), estima-se que existam no mundo cerca de 35,6 milhões de pessoas com a Doença de Alzheimer. A Doença de Alzheimer é a 6ª principal causa de morte nos EUA. Em média, uma pessoa com Alzheimer vive 4 a 8 anos após o diagnóstico, mas pode viver até 20 anos, dependendo de outros fatores.

Como dito, o envelhecimento da população já vem sendo sentido em diversos países. Países como. Japão, China, países da Europa e da América do Norte já convivem há muito tempo com um grande contingente de idosos e com todas as conquistas e as adversidades associadas ao envelhecimento.

Países em desenvolvimento, começam perceber essa nova atualização de sua população de idosos e necessitam de estudos que possibilitem concretizar e desenvolver políticas racionais para lidar com as consequências sociais, econômicas e de saúde do envelhecimento.

O contingente de pessoas acima de 60 anos no Brasil é expressivo e representa 13,44% da população, o que repercute na visibilidade social e de saúde.

Uma das instituições brasileiras voltadas ao cuidado do idoso, o Instituto Velho Amigo, enfatiza em seu website: 

velho para algumas pessoas é alguém que já deu o que tinha que dar na vida. coitados, não dos velhos, mas dos que pensam assim. A gente quer dar um novo significado à palavra velho. que essa palavrinha tenha o seu exato sentido na expressão “velho amigo”. algo precioso, indestrutível, que perdura. instituto velho amigo. apoie. respeite. valorize. velho é o seu preconceito!

Estudo da Fundação Oswaldo Cruz revela que, no mundo, um caso de demência é diagnosticado a cada 3 segundos. “As demências tornaram-se uma epidemia mundial. É preciso um despertar urgente para esse problema”, alerta o geriatra Otávio Castello, da Associação Brasileira de Alzheimer do DF.

No Brasil, 1,5 milhão de brasileiros sofrem de demência, a maioria Alzheimer, conforme dados do relatório do Projeto de Lei mencionado. No Brasil, a maior parte deles ainda sem diagnóstico. Estimava-se um total de aproximadamente 5,4 milhões de indivíduos com Doença de Alzheimer nos Estados Unidos no ano de 2016, com uma taxa em torno de 11% para indivíduos com 65 anos ou mais e 32% para aqueles com 85 anos ou mais. 

À medida que as pessoas envelhecem, suas necessidades advindas das características peculiares ao processo de envelhecimento, requerem respostas multidimensionais e personalizadas dos serviços de saúde.

Em 2006, foram promulgadas, no Brasil, a Política Nacional de Saúde da Pessoa Idosa (PNSPI) e o Pacto pela Vida, definindo que a atenção à saúde da população idosa deve ter como porta de entrada a Atenção Primária à Saúde (APS), por meio da Estratégia Saúde da Família (ESF), tendo como referência a rede de serviços especializada de média e alta complexidade. Segundo o documento da PNSIP (2006, np.), 

a atenção coordenada possibilita aos profissionais reagir às necessidades individuais do idoso e, por conseguinte, oferecer melhor provisão de cuidados integrados, menos os serviços de saúde especializados.

Dados apresentados na Portaria Conjunta nº 13, de 28 de novembro de 2017, mostram que as projeções para 2050 estimam que naquele país, em torno de 7 milhões de pessoas com 85 anos poderão ter Doença de Alzheimer, representando acometimento de metade (51%) da população com 65 anos por esta doença. 

No Brasil, como salienta Araújo (2020), um dos marcos na atribuição de direitos e defesa dos idosos é o Estatuto do Idoso.

Segundo Minozzo (2021, np.), “os marcos legais para o cuidado de pessoas e famílias acometidas por demências são importantes instrumentos sociais para organizar a ação do SUS e da Assistência Social”. Mesmo que haja diversos grupos de pesquisadores envolvidos nas pesquisas sobre o mal de Alzheimer e na busca da aprovação de um plano nacional de demência em nosso país, cabe observar que as iniciativas legislativas “não são concorrentes, mas formas de garantir que as ideias e demandas da sociedade civil tenham respaldo legal e perenidade para serem implementadas” (Minozzo, 2021, np.).

De acordo com o relatório “Global status report on the public health response to dementia”, divulgado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), o número de pessoas que vivem com demência está crescendo. Para a OMS, é preciso dar respostas para as pessoas com demência, desde o cuidado básico, que inclui “a atenção primária à saúde, cuidados especializados, serviços baseados na comunidade, reabilitação, cuidados de longo prazo e cuidados paliativos”.

Em 2017, a OMS aprovou, em Genebra, Suíça, o Plano de Ação Global para as Demências 2017 – 2025, adotado por 194 países, ressaltando a necessidade de medidas, por parte dos governos, quanto ao cuidado às pessoas com demência. Em resposta a essa demanda, o governo brasileiro, por meio da Coordenação de Saúde da Pessoa Idosa na Atenção Primária, com intuito de contribuir para ampliar a discussão e reflexão sobre o tema, subsidiando, também, a tomada de decisão por parte dos gestores, desenvolveu diversas iniciativas, como “a validação da plataforma iSupport, em curso, voltada para os cuidadores de pessoas idosas com demência; e a elaboração de guias com orientações técnicas para a identificação e o rastreio das síndromes geriátricas, incluindo os problemas cognitivos (demências e transtornos cognitivos leves)”. 

Vemos que as políticas públicas em saúde voltadas aos idosos portadores de Alzheimer têm   sido   objeto   de   recomendações   e   encontros   internacionais realizados pela Organização Mundial de Saúde. No Brasil, ainda há grande dificuldade em cuidar das pessoas e das famílias que convivem com a doença de Alzheimer ou outras formas de demências, como a demência vascular e a causada pela doença de Huntington. O relatório mundial da Doença de Alzheimer divulgado pela Associação Brasileira de Alzheimer (ABRAz) compartilha o estudo da Escola de Economia e Ciências Políticas de Londres feito com mais de 70 mil pessoas de 100 localidades diferentes em todo o mundo. O estudo constata que a falta de informação da população em relação à demência de forma geral é alarmante.  Dois terços dos entrevistados acreditam que a demência é normal e faz parte da velhice. Essa percepção, indica que a falta de orientação sobre o tema prejudica o diagnóstico precoce e o tratamento adequado. 

A aprovação de uma lei que estimule o Estado a melhorar esse cuidado se mostra fundamental para garantir o acesso dessas pessoas e de suas famílias a direitos que preservem sua dignidade. A partir desse marco legal, poderemos ter ações de longo prazo, como um plano nacional, com envolvimento dos vários atores – governantes, profissionais, familiares e pessoas idosas. 

Mas quais as formas de participar, acompanhar, debater, e até mesmo fiscalizar a construção de uma lei que envolve uma parcela tão significativa da sociedade? Como fazer com que as relações entre governo e cidadãos ocorram de forma clara, transparente e colaborativa no processo de criação de uma legislação? Está o Estado preparado ou engajado na construção desses arranjos participativos?

Uma abordagem que surge para propiciar o envolvimento da sociedade civil na política são os governos abertos e os mandatos abertos. A “agenda de governo aberto representa um conjunto de ações voltadas a conduzir o Estado a um desempenho superior nos níveis de transparência, participação social e accountability” (GUERZORVICH e SCHOMMER, 2022).

Segundo Andrade e Raupp (2017), está em evidência a influência das novas tecnologias da informação nas sociedades modernas e nas estruturas dos estados e governos. Para os autores, é possível observar esforços alavancados pelo potencial tecnológico para o redesenho da administração pública no intuito de expandir a eficiência e a accountability. 

O governo eletrônico passa a ser estratégia para redução de custos e aperfeiçoamento da capacidade de transparência das informações e de respostas do governo aos cidadãos. Segundo Andrade e Raupp (20017), “o desafio da administração pública brasileira para dar efetividade às garantias legais de transparência e acesso às informações públicas não reside somente no desenvolvimento de transações entre governo e cidadãos utilizando a web”. Consiste, principalmente, na reforma e reorganização da gestão institucional, integrando essas operações. Para os autores, a construção do estado virtual inclui não apenas novas tecnologias disponíveis, mas sobretudo um modelo estratégico de governança (ANDRADE e RAUPP, 2017). 

Segundo Tormers (2017), a definição de accountability é compreendida, atualmente, como “um processo de prestação de contas públicas, em que se destacam as facetas da responsividade e da possibilidade de punição”. Segundo Rocha (2011, pg. 84), podemos conceituar accountability como “processos de avaliação e responsabilização permanente dos agentes públicos que permitam ao cidadão controlar o exercício do poder concedido aos seus representantes.” Já a accountability social focaliza a colaboração entre governantes e cidadãos para que as expectativas sobre bens e serviços públicos em cada contexto sejam alcançados

Em seu trabalho sobre a criação da lei de acesso à informação pública e seus possíveis desdobramentos para a accountability democrática no Brasil, Angélico (2012, pg. 40) discute a informação pública tanto como uma “arma pela governança”, como na defesa de direitos humanos e como instrumento de combate à corrupção. Conforme Angélico (Ibid.),

a informação parece ser ingrediente fundamental para a accountability; no entanto, nota-se que entre uma coisa e outra, exige-se a participação da sociedade civil, seja por meio do voto ou de controles sociais, seja como um meio de ativar a accountability horizontal (via cobranças a órgãos fiscalizadores).

Em 2012, o Senado Federal criou o e-Cidadania, um portal com o objetivo de estimular e facilitar a participação dos cidadãos nas atividades legislativas, orçamentárias, de fiscalização e de representação do Senado. Ele é administrado pela Coordenação de Apoio ao Programa e-Cidadania, unidade que integra a Secretaria de Comissões, subordinada à Secretaria-Geral da Mesa do Senado Federal, conforme regulamentado pela Resolução do Senado Federal nº 19 de 2015, e responsável pelas consultas públicas. Existem três ferramentas de participação disponíveis no e-Cidadania, que são: 

Ideia Legislativa: permite enviar e apoiar ideias legislativas, que são sugestões de alteração na legislação vigente ou de criação de novas leis. As ideias que receberem 20 mil apoios serão encaminhadas para a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), onde receberão parecer; 

Evento Interativo: possibilita participar de audiências públicas, sabatinas e outros eventos abertos. Para cada audiência/sabatina/evento, é criada uma página específica onde haverá: a transmissão ao vivo; espaço para publicação de comentários; apresentações, notícias e documentos referentes ao evento e;   

Consulta Pública: permite opinar sobre projetos de lei, propostas de emenda à Constituição, medidas provisórias e outras proposições em tramitação no Senado Federal até a deliberação final (sanção, promulgação, envio à Câmara dos Deputados ou arquivamento).

Esta última ferramenta serve para que o cidadão possa opinar em todos os processos legislativos em trâmite no Senado Federal. Na figura 01, podemos observar que a consulta pública sobre a matéria do PL 43644/2020, realizada no portal do Senado Federal, na área de e-cidadania, reuniu 36 votos. 

Figura 01: Consulta pública do Projeto de Lei nº 4364/20.

Podemos listar outras formas de participação em espaços institucionais:

  • Conselho de políticas públicas – são instâncias colegiadas permanentes, permitindo diálogo entre governo e sociedade civil e participação decisória e na gestão de políticas públicas.
  • Comissão de políticas públicas – são criadas para objetivos específicos, com prazo de funcionamento vinculado ao cumprimento de seus objetivos.
  • Conferência nacional – prevista da Constituição de 1988, são precedidas de conferências municipais e estaduais com participação de todas as instâncias de governo, visando propor diretrizes e ações acerca do tema tratado;
  • Ouvidoria pública federal – instância de controle e participação social responsável pelo tratamento das reclamações, solicitações, denúncias, sugestões e elogios relativos às políticas e aos serviços públicos;
  • Mesa de diálogo – mecanismo de debate e de negociação com a participação dos setores da sociedade civil e do governo em episódios de conflito social;
  • Fórum interconselhos – mecanismo para o diálogo entre representantes dos conselhos e comissões de políticas públicas intersetoriais;
  • Audiência pública – mecanismo participativo de caráter presencial, consultivo, aberto a qualquer interessado, com a possibilidade de manifestação oral dos participantes, cujo objetivo é subsidiar decisões governamentais;
  • Consulta pública – mecanismo participativo para receber contribuições por escrito da sociedade civil sobre determinado assunto, na forma definida no seu ato de convocação;

Relacionada à participação, temos a coprodução, uma estratégia para a produção dos serviços públicos por meio do compartilhamento de responsabilidades e poder entre agentes públicos, agentes privados e cidadãos (SALM e MENEGASSO, 2010). Ao iniciante do estudo dessa temática, segundo Salm e Menegasso (2010), se exige, no mínimo, a compreensão sobre a participação do cidadão na esfera pública, as organizações formais e as do terceiro setor, além de estudos sobre redes e políticas públicas. Os mesmos autores salientam que o poder do cidadão sobre o estado é uma forma de participação que está associada ao empowerment (empoderamento), ou seja, ao poder que nasce na comunidade mercê da sinergia que se estabelece entre os seus membros.

Ansell e Torfing (2016) sugerem que “precisamos entender melhor como os processos de colaboração de vários atores são conduzidos e gerenciados em uma ampla gama de arenas de governança”. Fica evidenciado a necessidade contínua de um modelo de governança mais equilibrado, no qual as necessidades dos cidadãos sejam conhecidas, satisfeitas e atendidas. O enfoque da participação cidadã é também referenciado no Guia da política de governança pública da Casa Civil da Presidência da República (2018):

O paradigma da governança pressupõe a implementação de um constante e gradual processo de melhoria institucional, no qual são tratados problemas como a assimetria de poder, dando ao cidadão maior capacidade de colaborar no processo decisório, e a legitimidade da atuação pública, reconstruindo a relação de confiança entre cidadãos e instituições públicas.

Conforme Mateos (2011), na Revista Desenvolvimento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA

a participação popular na elaboração, implementação e fiscalização das políticas públicas ganhou amplitude sem precedentes, contribuindo para aumentar tanto a eficácia e abrangência das ações públicas, como a capacidade de formulação dos movimentos sociais. 

Desde seu início, o Projeto de Lei 4364/20, foi apoiado pela SBGG, e contou com a participação de instituições de pesquisa, comunidade acadêmica e científica e sociedade civil.  Quando do relatório realizado pelo Senador Romário Faria, que incluiu melhorias importantes, houve diálogo entre as equipes dos senadores e todas as sugestões apresentadas pelo grupo GRAZ (formado por especialistas e representantes de entidades ligadas ao Alzheimer) foram consideradas e geraram adequações no texto inicial.  O GRAZ – Grupo de Alzheimer reúne profissionais de diversos segmentos e instituições e surgiu em função da discussão e elaboração da atual Lei Alzheimer no município de São Paulo – Lei 17.547/2021.

Mapeamos os envolvidos nos debates do Projeto de Lei 4364/20, e a seguir listamos os stakeholders:

– Poder público: Conselho Nacional de Saúde;  Órgãos gestores do Sistema Único de Saúde (SUS); Legisladores:  Senador Paulo Paim (PT-RS), autor do PL; Senador Romário (PL-RJ), relator do PL; Deputado Alexandre Padilha (PT-SP), relator do PL; Deputada Tereza Nelma (PSDB/AL), solicitou audiência pública

– Comunidade Nacional: Associação Brasileira de Alzheimer (ABRAz); Associação de Parentes e Amigos de Pessoas com Alzheimer (APAZ); Federação Brasileira das Associações de Alzheimer (Febraz) ;  Instituto Alzheimer Brasil; Blog LongeVIDA

– Comunidade Internacional: Alzheimer’s Disease International;  Alzheimer’s Association

– Instituições de pesquisa: Comunidade acadêmica e científica;  Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG)

– Sociedade civil:  Médicos; Pacientes e cuidadores

Considerações finais

Mas então? Está o Estado preparado ou engajado na construção desses arranjos participativos? Como vimos com os exemplos no texto, mesmo com o avanço da nossa Constituição Federal/88, com algumas ferramentas de acesso do cidadão ao legislativo, e a participação de várias instituições na concepção da lei de política nacional de enfrentamento à doença de Alzheimer e outras demências, ainda precisamos avançar na coprodução e participação da sociedade civil das políticas sociais do Estado. Destarte, a pressão e participação popular podem acelerar a criação de agendas políticas e sua efetiva participação tende a favorecer a implementação mais concreta e eficaz das políticas públicas, e o papel dos estudiosos do tema e dos administradores públicos está em ajudar a fomentar a participação social e popular.

Para Araújo (2020), “embora  de  conhecimento  das  autoridades  públicas  o  avanço  no  crescimento da população de idosos no Brasil, e consequentemente do aumento no número de casos de  idosos  com  doenças  crônico-degenerativas,  ainda  não  há  uma  resposta  política  e social  à  altura  do  problema”. Talvez estejamos diante de um primeiro avanço neste sentido.

Abreu e Val (2015) defendem que, com a elevada incidência da doença de Alzheimer entre idosos, justificaria ao Brasil que seguisse exemplos de outros países, elaborando o que chamaram de “Plano Brasileiro de Combate ao Alzheimer, adequado às condições sociais, políticas, econômicas e culturais brasileiras.” Entretanto, fazem a ressalva de uma ampla participação no debate deste plano, argumentando que é relevante o apoio dos gestores federais, estaduais e municipais; da Associação Brasileira de Alzheimer (ABRAZ) e seus associados; das instituições privadas e públicas; da sociedade brasileira.  Este plano teria por objetivos:  reunir condições para um diagnóstico mais precoce; otimizar a saúde física, cognitiva e o bem-estar do doente; a proteção e o tratamento de doenças psíquicas concomitantes; a detecção e o tratamento de sintomas psicológicos e comportamentais; a prestação de informações e o apoio a longo prazo para aqueles que prestam os cuidados. Suas grandes orientações seriam: o reforço da dimensão ética no apoio aos acometidos pela doença; o desenvolvimento de pesquisas médicas a seu respeito; a simplificação e a melhora do curso da doença para aquele que é por ela afetado e para a sua família, em todas as dimensões possíveis; a melhora das condições para um diagnóstico mais precoce da patologia.

Outra forma de participação que pode se tornar efetiva é a consolidação e o fomento dos Conselhos dos idosos. Maciel e Oliveira (sd.,np.), levantam que a participação política e a interação entre o conselho do idoso, estadual ou municipal, e outros órgãos governamentais e a sociedade potencializa sua atuação e promove a troca de informações e conhecimento que enriquecem o debate sobre as políticas públicas e os serviços voltados ao idoso. Sobretudo, aproxima o poder público e o idoso, na medida em que os canais para demandas e soluções são ampliados.

Todas as formas que gerem e concretizem a participação cidadã, principalmente quando nos referimos a uma população de idosos, normalmente mais vulneráveis, se transformam em um ato de respeito, responsabilidade e amor. 

*Texto elaborado pela acadêmica de administração pública Juliana Korb Nogueira, no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, em 2022.

Referências

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Transparência e cidadania em serviços públicos: análise de três municípios no Vale Europeu 

*Por Laís Bratti, Rafaela Politi e Thiago Mattos 

Com a interação através da internet, as obras de pavimentação em regime de mutirão nos municípios catarinenses de Blumenau, Pomerode e Brusque, no Vale Europeu, propiciaram à população a busca pela produção do bem público de forma mais eficiente e transparente, em diferentes graus e aspectos.

Os princípios do novo serviço público, assim como reflexões sobre inovação no âmbito governamental, demonstram a necessidade de incorporar preceitos de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) na administração pública (Osborne e Brown, 2011).

A gestão de TIC cresceu em importância com a chegada do governo eletrônico na administração pública (Marques, Cunha e Meirelles, 2002). O portal mantido pelo governo federal do Brasil – https://www.gov.br/pt-br – define e-government (governo eletrônico ou e-gov) como “uso da tecnologia para aumentar o acesso e melhorar o fornecimento de serviços do governo para cidadãos, fornecedores e servidores” (ZUGMAN, 2006, p. 39).

A dinâmica empregada pelo Executivo municipal das três cidades, envolvendo também o setor privado e a sociedade civil organizada, disponibiliza por meio de suas plataformas governamentais dados referentes às fases das obras, evidenciando esforços em torno da e-governança, os quais tem sua base na arquitetura de governo eletrônico, acrescida de elementos da governança pública, bem como das TIC (Pacheco et al, 2015).  

A governança pública, que é o modo pelo qual o controle e o poder são exercidos pelo governo, na administração dos recursos sociais e econômicos, visando o desenvolvimento (The World Bank, 2008), somada aos princípios da administração pública previstos na Constituição Federal de 1988 (Brasil, 1998) – legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e ao uso das TIC, enseja a e-governança.   

A e-governança, que se busca observar nos três municípios, atua através de ações integradas como o uso das TIC, princípios de governança pública e e-governança, buscando eficiência governamental, além da tentativa de melhorar o relacionamento entre poder público e a sociedade. Um dos efeitos da governança pública pode ser compreendido na chamada coprodução de serviços públicos, a qual pode gerar sinergia a partir da interação entre Estado, mercado e sociedade civil, no compartilhamento de responsabilidades, cooperação e diálogos com a sociedade (JANN, 2002).   

Desta forma, sustenta-se tanto as bases democráticas e o interesse da administração pública, quanto a e-cidadania – que, aos moldes do que detalha o governo federal (SENADO FEDERAL, 2012), descreve-se como a possibilidade de maior participação dos cidadãos nas atividades legislativas, orçamentárias, de fiscalização e execução, na tentativa de oportunizar a participação cidadã, como, também, a transparência no ambiente online.

Importante destacar que cada um dos três municípios conta localmente com o seu “Observatório Social”, que, por sua vez, está associado à rede do “Observatório Social do Brasil – OSB”, órgão que orienta e controla os demais países através da Rede de Controle Social. As equipes dessas organizações integram um movimento atuante em prol da transparência na administração pública. Vale destacar, ainda, que Brusque é pioneiro no estado na dinâmica de transparência, junto ao seu observatório

O uso de TIC na gestão de obras em cada município

Blumenau

Blumenau possui o Programa de Mutirão denominado ‘PavimentAção’. Em seu site, apresentam-se planilhas atualizadas com diversos dados em relação às obras realizadas desde 2013. O Programa é uma parceria entre os moradores e a prefeitura. A comunidade arca com cerca de 30% da obra e o município com o restante. Critérios técnicos, conforme a prefeitura, regulamentam com clareza a ordem das ruas participantes, intentando, assim, maior credibilidade e transparência às execuções, provendo um ambiente favorável à cidadania (Rocha et al, 2019). Os dados disponibilizados na página da prefeitura mostram que mais de 80 ruas já foram pavimentadas neste regime até o momento (PMB, 2022). 

Outra alternativa oportunizada ao blumenauense é a busca pela pavimentação particular, regulamentada pelo Decreto municipal n° 11.671/2018. Neste caso, os moradores têm a autonomia para negociar a obra com terceiros, desde que o projeto atenda aos requisitos exigidos pela prefeitura e tenha o aval técnico da secretaria de obras. Contudo, trabalhos feitos sem o conhecimento do executivo municipal são considerados irregulares. Além de o município não se responsabilizar pelas obras, futuras manutenções também não serão realizadas. 

Pomerode

No município de Pomerode, percorrendo seu website na aba ‘Portal da Transparência’, há menção de que se busca, por meio deste site “assegurar a boa e correta aplicação dos recursos públicos aumentando a transparência da gestão pública, permitindo que o cidadão acompanhe como o dinheiro público está sendo utilizado e ajude a fiscalizar”, (PMP – 2022).   

Nesse município, ocorre o programa ‘Pavimentação Comunitária’, equivalente ao projeto blumenauense. A prefeitura de Pomerode disponibiliza um canal de comunicação com o munícipe em seu site.  Na aba ‘Obras Públicas’, contudo, constam os dados referentes ao que foi executado, com uma variada quantidade, almejando a transparência tanto com o gasto, quanto na execução pública, de forma detalhada.  

Brusque

Já na cidade de Brusque, de acordo com as informações correspondentes ao seu Programa de Pavimentação Comunitária, pelo advento da Lei Municipal 4.420 de 2021, novos critérios técnicos de transparência foram implantados, pretendendo oferecer maior segurança e controle aos cidadãos. Porém, na página do programa, até este momento, havia apenas a indicação de baixar o documento e o telefone da Diretoria de Pavimentações Comunitárias, não apresentando, contudo, dados concernentes ao planejamento e à execução das obras. 

Desta forma, recorremos ao jornal ‘O Município’, que atua na região. A inquietação de “como o município de Brusque, pioneiro na soma de forças em prol da transparência, não apresentava nenhum dado referente ao programa?” encontrou, na reportagem de Bruno da Silva, em 05/10/2022, possível resposta para este anseio público.        

Nessa reportagem, é possível perceber que, em setembro de 2021, a Câmara de Vereadores aprovou o projeto de lei referente ao programa de Pavimentação Comunitária. Embora a lei tenha sido homologada naquela data, o Diretor de Parcerias Comunitárias da Secretaria de Obras, Marcos Deichmann, esclarece que o decreto que regulamenta a legislação só foi publicado em 18 de agosto do ano seguinte.  

Deichmann afirma ainda que, como aconteceram alterações da antiga lei para a nova, “é normal os primeiros processos serem mais demorados devido às adequações que vão surgindo”. O diretor presume que, após a padronização dos processos, isso será agilizado. 

Ainda que existam a manutenção do website e readequação da lei, como é o caso de Pomerode e Brusque, não se enfraquece o fato de que são cidades que somam esforços orientados à prática da transparência, em torno de suas gestões e para com seus munícipes.  

O Vale em números

O Conselho Federal de Administração divulga anualmente o Índice de Governança Municipal (IGM/CFA), cuja estrutura é baseada numa hierarquia bottom-up (de baixo para cima), na qual constam os dados brutos como variáveis, cuja média serve de base para a criação dos Indicadores. 

Visando propiciar mais celeridade na entrega de bens e serviços públicos, as referidas cidades revelam persistência na tomada de decisões assertivas junto à sua população. Através de legislações pertinentes, demonstram esforços na apresentação de resultados e ações integradas via e-governança, como, também, na prestação de contas e no fomento ao processo accountable em suas gestões. 

O Projeto denominado “Proposta de padronização para a Geração de Dados abertos em Compras e Contratações Públicas”, desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa Politeia da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC-ESAG), com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Estado de Santa Catarina (FAPESC), é outro bom exemplo de como a Prefeitura de Blumenau se direciona quanto ao tema accountability

Direitos, recursos, accountability e cidadania

Na obra Rights, Resources and Politics of Accountability (2006, p. 5-6), Peter Newell e Joanna Wheeler demonstram que as mobilizações populares que reivindicam direitos podem produzir novas formas de accountability, apenas pelo fato de terem ciência dos seus direitos e reivindicá-los, pois se considera que há uma relação de accountability entre o Estado e os cidadãos. 

Através da representação na Figura 1, a seguir, revela-se a interação entre os pontos ora mencionados:

Figura 1 – A sinergia entre os tópicos

Fonte: Adaptado de The Relationship Between Rights, Resources and Politics of Accountability (2006, p. 5-6)

Dessa triangulação entre direitos, recursos e accountability, há um fortalecimento da cidadania. Com isso, para Newell e Wheeler (2006), o conceito de cidadania relaciona as reivindicações que as pessoas acreditam ser capazes de fazer às instituições, bem como os seus direitos de ter acesso aos recursos materiais.

Considerações finais

Desse modo, pela soma desses fatores, a accountability é fortalecida e se constitui como ferramenta no desenvolvimento da e-Governança, fomentando, assim, a coprodução de serviços públicos e a e-Cidadania, resultando em potenciais benefícios aos cidadãos e eficiência aos processos públicos. Pela relação entre direitos, recursos e accountability, clarifica-se a noção básica de cidadania, esta encontrada como elemento na sinergia gerada a partir da interação contínua entre servidores públicos municipais e população, bem como, seus direitos e acesso a recursos materiais.   

Como efeito da análise dessa região catarinense e seus programas de mutirão, com as lentes do novo serviço público proposto por Denhardt e Denhardt (2003), infere-se um tipo de accountability ‘multifacetada’, sendo classificada como democrática, com a característica em que servidores devem cumprir a lei, atender aos valores comunitários, às normas políticas e profissionais e ao interesse dos cidadãos.

* Texto elaborado pelos acadêmicos de administração pública Laís Bratti, Rafaela Politi e Thiago Mattos, no âmbito da disciplina sistemas de accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, em 2022.

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Núcleo de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas (NEABIs) como indutores da cultura da transparência nas organizações públicas

Por Flávio Facha Gaspar e Vinicius Fernandes Sousa Pereira*

Todo o processo de transformação implica em tensões, mudanças de interesses, deslocamento do centro de poder e decisão. Um espaço no qual podemos observar esses elementos na área da educação é o das Instituições de Ensino Superior (IES). 

Nesta breve reflexão, buscamos analisar como os Núcleos de Estudos Afro-brasileiros e Indígenas (NEABIs) podem se constituir como indutores na criação da cultura por transparência, produção, aperfeiçoamento e tratamento de dados sobre as populações afrodescendentes, quilombolas, indígenas e ribeirinha no ensino superior. 

Para isso, abordamos um pouco da história dos NEABIs e apresentamos a abordagem da accountability social e sua relação com esses Núcleos, enquanto produtores de conhecimento e demandantes de informações, bem como sua influência e participação na formulação de políticas públicas e na vigilância e controle social. Finalmente, analisamos em que medida os NEABIs poderiam ser considerados como indutores na criação da cultura da transparência nas IES.

Os Núcleos de Estudos Afro-brasileiro e Indígenas (NEABIs)

A história dos Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros (NEABs) teve início em 1959, desde sempre vinculados às IES no Brasil. O pioneiro foi o Centro de Estudo Afro-Orientais (CEAO), criado em 1959, na Universidade Federal da Bahia (UFBA). No ano 2000, houve a criação da Associação Brasileira de Pesquisadores/as Negros/as (ABPN), e o primeiro Congresso Brasileiro de Pesquisadores/as Negros/as (COPENE).

Os Núcleos de Estudos Afro-brasileiros (NEABs) mais tarde passaram a ser chamados de Núcleos de Estudos Afro-brasileiro e Indígenas (NEABIs), com o acréscimo da letra I de Indígenas. Os NEABIs “são núcleos que produzem conhecimentos no âmbito do Ensino, da Pesquisa e da Extensão sobre África, diáspora africana, afro-brasileiros e indígenas, além de manterem diálogos permanentes com Black Studies das Américas, África e outros continentes” (NEABI – UNIPAMPA, 2010).

Em algumas universidades públicas, privadas e regionais, a nomenclatura NEAB permanece, porque, dependendo da região, estado e município, cada instituição tem a sua particularidade. No entanto, os núcleos provêm do mesmo movimento de organizações. Portanto, NEAB ou NEABI, ambas possuem no seu bojo a produção de conhecimento sobre as populações africanas, afrodescendentes, indígenas, quilombolas e ribeirinhas. 

Atualmente, existem em torno de 191 NEABIs, Núcleos de diversidades e outros correlatos, que têm em seu horizonte o trabalho para diminuição das desigualdades raciais e étnica em todo o Brasil (NEAB/UDESC, 2018). 

Os NEABIs são relevantes articuladores e impulsionadores para implementação das Leis Federais 10.639/2003 e 11.645/2008, que versam sobre as culturas Africanas e afro-brasileiras e indígenas no Ensino Brasileiro em escolas públicas e privadas. 

Podemos observar diversos pilares de atuação em diferentes setores, mas em prol de um objetivo comum. A exemplo do NEAB/UDESC e o Coletivo Negro Guerreiro Ramos (CNGR/Esag), que demandam dados sobre estudantes afro-brasileiros, indígenas e pardos, pois esses dados não estão disponíveis para acesso. A obtenção desse tipo de dado é fundamental para a realização e o aprimoramento da gestão e das políticas públicas referentes ao tema. 

Ademais, buscam fomentar discussões sobre o assunto no âmbito universitário, visto que muitas vezes a própria universidade não toma à frente das discussões e acaba por delegar essa função aos NEABIs. Já em outras universidades, como é o caso da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), existe uma pró-reitoria da diversidade com foco na abordagem destes assuntos, demonstrando a relevância que a instituição atribui a essas agendas.

Accountability social e a atuação dos NEABIs

O conceito de accountability social está ligado à forma pela qual o estado se relaciona com a sociedade. Dentro desta abordagem, existem várias maneiras e ferramentas do modo como se operacionaliza, através de controle, mobilização social etc. A accountability social busca contribuir para, a partir dos cidadãos que demandam e colaboram com os agentes públicos, tornar os governos mais responsivos diante das demandas da sociedade (PERUZZOTTI e SMULOVITZ, 2006).

Como produtores de estudos e conhecimento, os NEABIs têm produzido já há algum tempo sobre variadas temáticas como: a saúde da população negra no Brasil, a inserção de indígenas no mercado de trabalho a título de exemplo. Essas produções contribuem para os debates mais qualificados e ajudam na formulação de políticas públicas, tecnicamente embasados e mais assertivas. 

Enquanto um ator que demanda informações, estão vinculados, por exemplo, aos pedidos de informações detalhadas nas IES sobre quantidade de pessoas negras/pardas e indígenas nas universidades e como está sendo a passagem desses sujeitos na academia com o fito de entender melhor o seu processo formativo. 

Como um ator com participação ativa, estamos querendo dizer que os NEABIs participam na formulação de leis, normativas e políticas públicas. 

Enquanto uma instituição de controle social e vigilância, os NEABIs contribuem, por exemplo, em situações em que há fraudes no sistema de cotas nas IES.

Ao observarmos os NEABIs e sua atuação na arena dos IES, e tendo em conta a abordagem da accountability social, podemos concluir que os NEABIs se constituem como atores relevantes nas mudanças de paradigmas no ensino superior brasileiro. 

A atuação desses Núcleos pode induzir a maneira como as Pró-reitorias e outras instâncias nas universidades públicas e privadas lidam com a questão do ensino da história e cultura Africana e Afro-brasileira, a implementação de políticas de ações afirmativas e diversidade. Os NEABIs também produzem conhecimento sobre esses sujeitos e sua inserção na faculdade. 

Os NEABIs têm o poder para se articular com núcleos em todas as partes do país com o intuito de troca de experiência e conhecimento baseados na forma de atuação única de cada unidade e sua importância para a sociedade universitária.  

Desta feita, finalizamos dizendo que a accountability social, enquanto base analítica, contribuiria para o entendimento e aprofundamento dos NEABIs como um ator primacial na democratização do ensino no Brasil.

*Texto elaborado pelos acadêmicos de Administração Pública Flávio Facha Gaspar e Vinicius Fernandes Sousa Pereira, no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, em 2022.

Referências 

Universidade Federal do Pampa – UNIPAMPA. Link: https://sites.unipampa.edu.br/adafi/neabis/historia-dos-neabs/. Acesso em 27/11/2022.

Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP. Disponível em: https://www.unifesp.br/reitoria/proec/neab. Acesso em 25/11/2022.

Associação Brasileira de Pesquisadores/as  Negros/as – ABPN. Disponível em: https://abpn.org.br/conneabs-2/ . Acesso em 24/11/2022.

Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros – NEAB/UDESC. Disponível em: https://www.udesc.br/neab/biblioteca . Acesso em 23/11/2022. 

PERUZZOTTI, Enrique;  ENRIQUE, Catalina. Social Accountability: An Introduction.  University of Pittsburgh Press,  Pennsylvania – USA,  2006. 

Coletivo Negro Guerreiro Ramos – CNGR. Localizada na Universidade do Estado de Santa Catarina – Udesc /Esag.