Fake news no cenário brasileiro em tempos de pandemia

Por Amanda Amaral de Menezes, Gustavo Marques Adão e Isabel Cristina Chagas *

Fake news é um termo em inglês usado para se referir a informações falsas, publicadas por veículos de comunicação, geralmente redes sociais, como se fossem reais. Para Allcott e Gentzkow (citados por Carvalho et al., 2020), “as fake news são as notícias intencionais e comprovadamente falsas, que podem induzir as pessoas ao erro”. Grande parte dessas informações é viral, ou seja, se espalha de maneira rápida.

Hoje em dia, a internet é uma ferramenta de extrema importância para acessar informações referentes a vários assuntos. Em tempos de pandemia, a internet auxilia a população em relação às notícias sobre saúde, doença e cuidados. Entretanto, com a evolução da tecnologia, as fake news também podem ser disseminadas com mais facilidade, sendo divulgadas em diversos canais e transmitidas aos usuários como sendo verdadeiras, porém não condizem com a realidade (Neto et al., 2020). A partir do momento em que as fake news passaram a ser difundidas no cenário da COVID-19, tornaram-se um problema de saúde pública. 

De acordo com Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura, Unesco (2020), a diferença entre a pandemia da COVID-19 para outras que já existiram no mundo é que, em outros tempos, a tecnologia não era tão forte como atualmente. Segundo a Organização das Nações Unidas, ONU, (2020), a tecnologia é uma ferramenta digital valiosa, trazendo informações em tempo real para o mundo inteiro, mas também vinculam informações de cunho enganoso ou falso, ameaçando a saúde física e mental da população. 

Desde o começo da pandemia, diversas informações novas, sobre temas complexos e que ainda estão sendo compreendidos por cientistas e gestores públicos, vem sendo divulgadas. Muitas delas, entretanto, caracterizam-se como fake news, o que aumenta as incertezas frente ao desafio que já é imenso. Evidências científicas são contestadas inclusive por alguns governantes, o que acaba por confundir e influenciar parte da população a adotar práticas inadequadas, gerando desinformação e aumento de risco para as pessoas.

A Organização Pan-Americana da Saúde, OPAS, (2020) alerta para os riscos das desinformações sobre a COVID-19 sobre formas de prevenção, transmissão e origem da doença, que se difundem de forma muito rápida e entendidas como verdadeiras na mesma velocidade, modificando o comportamento da população e consequentemente fazendo com que as pessoas assumam riscos desnecessários. 

Assim, alguns órgãos públicos como a Organização Mundial da Saúde, OMS, Ministérios da Saúde e outros órgãos de governo, a exemplo de Taiwan, desenvolveram estratégias que tem como intuito identificar e corrigir essas informações duvidosas veiculadas principalmente por redes sociais, reforçando o enfrentamento à desinfodemia da COVID-19 (Neto et al., 2020). 

O Ministério da Saúde brasileiro criou em 2020 uma página para o combate a fake news sobre a COVID-19. Nessa página, consta um número de WhatsApp por meio do qual a população pode tirar dúvidas referentes a informações duvidosas, com auxílio de uma equipe técnica do Ministério, que faz a checagem das informações. Ainda, as informações no site são categorizadas como “Isto é fake news” ou “Esta notícia é verdadeira”. 

Existem, ainda, agências especializadas em checar a veracidade de notícias suspeitas e de boatos, entre elas: o portal de fake news do site do Ministério da Saúde; Projeto Comprova – Jornalista colaborativo contra a desinformação, onde estão os principais jornalistas do país; Lupa, a primeira agência de fact-checking (checagem de fatos) do Brasil, da Folha de São Paulo; Aos Fatos e UOL Confere

O quadro 1 exemplifica tipos de fake news sobre a pandemia encontradas por algumas dessas agências especializadas.

Quadro 1 – Exemplos de fake news relacionadas à pandemia de COVID-19

Fonte: Adaptação dos autores, com base em Neto et al., 2020.

Segundo o Instituto Reuters e a Universidade de Oxford (2020), as principais fontes de desinformação sobre a pandemia da COVID-19 são: influenciadores digitais, políticos, celebridades, figuras públicas e as redes sociais. Tal grupo é responsável por cerca de 70% das notícias que são veiculadas e, desse total, 20% eram notícias falsas (Institute Business Education, 2020).

A disseminação de fake news, de acordo com a diretora geral da Organização Europeia de Consumidores, BEUC, Monique Goygens, em entrevista para o Portal R7 (2018), ocorre sobretudo por meio de plataformas de empresas como Facebook e Google, que se beneficiam maciçamente de usuários lendo e compartilhando notícias falsas e devem assumir responsabilidade para combater o fenômeno. Para ela, não deve ser responsabilidade da população desbancar notícias falsas. De todo o modo, algumas dicas (Figura 1) podem ser úteis para que as pessoas consigam identificar notícias falsas:

Figura 1 – Dicas para identificar notícias falsas

Fonte: IFLA (International Federation of Library Associations and Institutions), 2017.

Um estudo realizado pela organização Avaaz divulgado em maio de 2020 revelou que 9 em cada 10 brasileiros foram alvo de notícias falsas sobre a pandemia. Para Flora Arduini, coordenadora da Avaaz, há muito dinheiro nas campanhas de desinformação, tendo pessoas poderosas por trás. A pesquisadora ainda afirma que as pessoas não consomem só uma fake news, o algoritmo influencia na entregabilidade e recomenda para cada vez mais pessoas, e por isso, elas acreditam que aquela fake news é uma verdade (Lopes, 2020).

Para Batista (2020), a identificação e punição dos autores das fake news ainda é uma tarefa difícil para as autoridades. No Brasil, ainda não há legislação específica para esse tipo de crime, mas existe o Projeto de Lei n° 2.630, de 2020, em tramitação, que visa estabelecer normas relativas à transparência de redes sociais e o combate às fake news. Essas medidas de combate às fake news ganham espaço e se relacionam aos trabalhos da  Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) das fake news, que atua para investigar e responsabilizar empresas, políticos e organizações que financiam e disseminam essas notícias (Neto et al., 2020).

Em meio às dificuldades de coibir as informações falsas e os responsáveis por difundi-las, a pandemia de COVID-19 se agravou no Brasil e as fake news seguem presentes em nosso cotidiano. A pandemia vem mostrando que, independente de classe ou cor, todos estão sujeitos a se contaminar com o novo coronavírus. Assim como o vírus se espalha de forma rápida, as fake news também alcançam grande proporção, trazendo prejuízo à população em relação às informações divulgadas. Durante a pandemia, o crescimento das notícias falsas ocorreu exponencialmente. Neste contexto, fica evidente que a saúde pública é prejudicada com a desinformação, pelo simples fato que essas prejudicam as medidas de prevenção e tratamento em saúde e desorientam a população.

* Texto elaborado pelos acadêmicos de administração pública Amanda Amaral de Menezes, Gustavo Marques Adão e Isabel Cristina Chagas, no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, com a mestranda Bárbara Ferrari, entre 2020 e 2021.

REFERÊNCIAS

AVAAZ. Estudo O Brasil está sofrendo uma infodemia de Covid-19. Disponível em: https://secure.avaaz.org/campaign/po/brasil_infodemia_coronavirus/ . Acesso em: 28 mar 2021.

BATISTA, Rafael. Fake News. Mundo Educação, 2020. Disponível em: https://mundoeducacao.uol.com.br/curiosidades/fake-news.htm. Acesso em: 21 mar. 2021.

CARNEIRO, Fabiana Lumena. Fake News Propagandas por Meio Digital no Brasil: Desafios para a Governança e a Gestão Pública Contemporânea. Belo Horizonte. 2018. Disponível em: http://monografias.fjp.mg.gov.br/bitstream/123456789/2446/1/Fake%20news%20propagadas%20por%20meio%20digital%20no%20Brasil.pdf. Acesso em: 21 mar. 2021.

CARVALHO, Leonardo de Souza Lourenço; et al. Fake News na Pandemia da COVID-19: Um desserviço à Sociedade Brasileira. Revistas Cenas Educacionais, 2020. Disponível em: https://www.revistas.uneb.br/index.php/cenaseducacionais/article/view/9300/7128. Acesso: 15 mar. 2021.

IFLA (International Federation of Library Associations and Institutions). Como Detectar Notícias Falsas. Disponível em: https://www.ifla.org/publications/node/11174. Acesso em: 22 mar. 2021.

INSTITUTE BUSINESS EDUCATION. Especialistas Falam sobre o Impacto das Fakes News. Fundação Getúlio Vargas, 2020. Disponível em: https://www.ibe.edu.br/dia-da-imprensa-fake-news. Acesso em: 26 de mar. 2021.

LOPES, Rodrigo. “Há muito dinheiro nas campanhas de desinformação, há pessoas poderosas por trás”, diz coordenadora da Avaaz. Gaúcha ZH, 2020. Disponível em: https://gauchazh.clicrbs.com.br/tecnologia/noticia/2020/05/ha-muito-dinheiro-nas-campanhas-de-desinformacao-ha-pessoas-poderosas-por-tras-diz-coordenadora-da-avaaz-ckar1ggp800ds015n4dxqyivn.html.Acesso em: 23 mar. 2021

NETO, Mercedes; et al. Fake News no Cenário da Pandemia de COVID-19. Cogitare enferm, 2020. Disponível em: http://dx.doi.org/10.5380/ce.v25i0.72627. Acesso em: 15 mar. 2021.

Organização Pan-americana da Saúde – OPAS. Entenda a Infodemia e a Desinformação na Luta contra a COVID-19. Disponível em: https://iris.paho.org/handle/10665.2/52054. Acesso em: 27 mar. 2021.

Organização das Nações Unidas – ONU. Desinformação: Uma Arma Secreta em Tempos de Pandemia. Disponível em: https://nacoesunidas.org/desinformacao-uma-arma-secreta-em-tempos-de-pandemia. Acesso em: 27 mar. 2021.

Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura – UNESCO. Desinfodemia: Decifrar a desinformação sobre a COVID-19. Paris: ONU, 2020. Disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000374416_por.  Acesso em:  27 mar. 2021.

R7. Facebook e Google se beneficiam das notícias falsas”, diz organização. Disponível em: https://noticias.r7.com/tecnologia-e-ciencia/facebook-e-google-se-beneficiam-das-noticias-falsas-diz-organizacao-13032018. Acesso em: 23 mar. 2021.