Prestação de contas baseada em resultados dos programas e políticas públicas.

Por Davi Gabriel Poker Ferreira e Gabriel Peixer*

Como mensurar os resultados da ação pública? E como utilizar essa mensuração para aprimorar o regime democrático?

Essas e outras questões altamente complexas estão por dentro desta discussão a respeito da prestação de contas (accountability) baseada nos resultados dos programas e políticas públicas.  Sob a promessa de responsabilizar os agentes públicos frente aos cidadãos, aumentar a transparência dos negócios públicos e oferecer instrumentos aos cidadãos para uma participação política mais qualificada, iniciativas de accountability por resultados têm se disseminado em diversos países e níveis de governo.

Nas últimas décadas, o monitoramento e a avaliação de políticas públicas e programas governamentais assumiram relevância para as funções de planejamento e gestão, em muitos países, como uma reação às exigências da preservação fiscal e à pressão da sociedade por transparência nas decisões sobre a utilização dos recursos.

O Brasil conta com um modelo de gestão que detém para si alguns mecanismos de planejamento e controle de suas políticas e programas públicos. A Constituição Federal de 1988, no parágrafo primeiro do artigo 74, traz a obrigatoriedade de avaliar o cumprimento das metas previstas no plano plurianual, a execução dos programas de governo e dos orçamentos da União.  A Constituição do Estado de Santa Catarina, de 1989, no primeiro parágrafo do artigo 62, elenca os poderes  legislativo, executivo e judiciário para realizar o controle, de forma integrada, com a finalidade de avaliação do cumprimento das metas previstas no plano plurianual, a execução dos programas de governo e dos orçamentos do Estado.

Esses mecanismos atuam, principalmente, no momento em que os programas ou políticas públicas são criadas e planejadas, ou seja, uma avaliação antes da implementação do programa em si. Mas ao executar uma obra, dar início ou continuidade a um programa ou política pública existente, como podemos medir se esse investimento teve o retorno previsto para a sociedade? Como podemos saber se o programa ou política tem real efetividade na comunidade em que é aplicado? E através de quais dispositivos podemos, na prestação de contas baseada em resultados, ter uma verdadeira responsabilização dos agentes públicos e estatais quando os programas ou obras não são cumpridos?

É na atuação dos atores interessados da sociedade civil que se fortalece e surgem novas regras e procedimentos de fiscalização via participação social. Essa participação social parece ser o fator de mais relevância para constranger os agentes públicos, tanto a prestar contas de suas ações, como a se responsabilizarem por essas ações (ou omissões) na condução das políticas e dos programas avaliados, pois os mesmos, na próxima eleição, precisaram desses eleitores para se candidatar novamente.

A responsabilização dos agentes públicos está relacionada não apenas com características próprias do sistema de avaliação implementado, como as formas de apresentação e de divulgação dos dados das avaliações, também com a atuação dos atores interessados, sejam eles políticos ou a sociedade civil interessada na efetividade da aplicação dos seus impostos.

O cidadão passa a ser corresponsável de direitos e deveres, por desejar que o Estado atinja resultados eficientes e eficazes no momento de exercer e conduzir suas políticas e programas públicos. Com o objetivo de alcançar uma sociedade cada vez mais justa, solidária e desenvolvida em questões sociais. Para isso, é fundamental que haja transparência das informações das políticas e seus atores, bem como um canal aberto de comunicação entre gestores e a sociedade.

A legislação brasileira também precisa ser alterada, pois ela praticamente não trata sobre resultados e impactos na administração pública.

Existe hoje no Senado Federal um projeto de lei chamado de “Lei da Qualidade Fiscal” que visa exigir dos gestores públicos o estabelecimento de metas e objetivos claros para as políticas e programas governamentais.

Essa legislação pode contribuir para que os gestores públicos, que muitas vezes  resistem a se comprometer com metas de resultados e de impacto, passem a definir mais claramente metas e resultados passíveis de serem monitorados pela sociedade e pelos demais controles formais.

Outra mudança necessária é a mudança de comportamento dos tribunais de contas do país, que atualmente focalizam a conformidade legal, negligenciando a dimensão resultados e impactos. Os controladores externos podem passar a focalizar suas análises sobre os resultados das políticas públicas e não somente sua conformidade legal, pois precisamos ver uma maior responsabilização desses atores pelos fracassos de um programa de governo e não somente pela ausência de uma assinatura em um processo licitatório.

Existem também  outras ferramentas e instrumentos práticos que podem ser adotados ou ampliados para aperfeiçoar essa prestação de contas como:

  • Auditorias operacionais;
  • Relatórios de Gestão que tratam sobre a governança pública;
  • Estabelecimento claro e objetivo de acordos de resultados com metas e resultados a serem perseguidos pelos setores governamentais;
  • Maior autonomia aos Tribunais de Contas, pois hoje os conselheiros, indicados politicamente, muitas vezes aprovam contas e atividades que os técnicos recomendam reprovar.

Instrumentos e ferramentas como essas podem auxiliar na cobrança por resultados e uma melhor efetividade dos gastos públicos, fortalecendo com isso o processo democrático e tendo a sociedade civil organizada como parceira do Estado e do real cumprimento de sua função social igualitária e com mais isonomia na implementação de políticas e programas públicos.

Cabe aos acadêmicos das disciplinas relacionadas com a Administração Pública a criação de novos instrumentos, índices e métricas para que esse controle seja mais eficiente, já que medir o impacto das políticas públicas não é algo simples, esses novos instrumentos criados pela academia podem auxiliar em um maior esclarecimento para a população das políticas públicas em que o cidadão está inserido.

Para conhecer mais sobre o tema e contribuir para uma transparência mais abrangente no setor público, o leitor poderá:

  • Exercer sua cidadania participando e cobrando da política transparência sobre os programas e políticas públicas;
  • Punindo eleitoralmente os atores políticos que não propiciam o controle social (não firmando metas claras de resultado, não abrindo arenas para debate sobre as políticas públicas);
  • Usufruir da Lei de Acesso a Informação dados sobre os resultados das políticas públicas;
  • Participar do debate político;
  • Fiscalizar os atores governamentais por meio dos portais da transparência e seus relatórios de gestão que tratam sobre os resultados das políticas públicas.

Referências:

FARIA, Carlos Aurélio Pimenta de. A política da avaliação de políticas públicas. In: ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS, XXVIII, 2004, Caxambu. Anais… 2004.

Governo Federal, Avaliação de Políticas Públicas – Guia Prático de Análise Ex Ante – Volume 1

JANNUZZI, Paulo de Martino. Avaliação de programas sociais no Brasil: repensando práticas e metodologias das pesquisas avaliativas. Planejamento e Políticas Públicas – PPP, no 36, Jan/Jun, IPEA, 2011. Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/ppp/index.php/PPP/issue/view/30> Acesso em: 27 de maio de 2018.

O Efeito Lava Jato. Revista EXAME Nº117, Disponível em: <http://osbrasil.org.br/wp-content/uploads/2016/11/O-efeito-lava-jato_Revisa-Exame_09nov2016.pdf> Acesso em: 28 de maio de 2018.

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, Ranking Nacional da Transparência. Disponível em: <http://combateacorrupcao.mpf.mp.br/ranking> Acesso em: 28 de maio de 2018.

*Texto elaborado por Davi Gabriel Poker Ferreira (davipoker@hotmail.com) e Gabriel Peixer (dj.conga@gmail.com), estudantes de administração pública da Udesc Esag, no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, ministrada pela professora Paula Chies Schommer.