Reparou algo diferente nas eleições de 2018? O uso do marketing digital eleitoral e seus efeitos

Por Ana Paula Campos, Bruna Dédalo Gorjão, Bruna Cristina Sanches e Mara Fritsche*

Santinhos espalhados pelo chão, 45 minutos seguidos de propaganda eleitoral, cavaletes e outdoors anunciando os candidatos políticos, carros de som às 9 horas da manhã de um domingo. Isso tudo soa como eleição? Não mais. 

Consideradas por muitos especialistas como atípicas, as eleições de 2018 chegaram transformando o cenário brasileiro por suas características singulares de polarização e a propagação de ideias em meios inusitados de divulgação. Fatores que sinalizam para episódios inéditos no cenário político brasileiro.

O clássico marqueteiro político não é mais suficiente. Mídias tradicionais, como a TV, não conseguem atingir a mesma quantidade de eleitores de antes. Uma pesquisa executada pelo IdeiaBigData com eleitores brasileiros constatou que ao menos 70% dos entrevistados tinham a intenção de acompanhar os seus candidatos pela internet, enquanto 52% preferiam pela televisão. O marketing político digital, por outro lado, ganha força. Seu baixo custo de investimento, combinado aos 139 milhões de brasileiros (IBGE) que estão nas mídias sociais, parece gerar um fator decisivo para os resultados.

Em sintonia com essas mudanças, vê-se a candidatura e eleição de pessoas que há pouco se mostravam desconhecidos pela população, enquanto rostos já conhecidos não conseguiram obter votos suficientes para alcançar o almejado cargo político.

Em Santa Catarina, apenas seis candidatos conseguiram ser reeleitos para uma posição entre os 16 deputados do estado na Câmara Federal, em Brasília. Em âmbito nacional, 51 políticos que buscavam a reeleição e estavam sendo investigados na Operação Lava Jato, alguns deles tradicionais no cenário político brasileiro, foram derrotados nas urnas. No próximo ano, poderão ser investigados de forma regular, pois não terão mais o foro privilegiado.

A pesquisa do IdeiaBigData confirma que há forte descrença da população com os políticos brasileiros. O levantamento aponta que ao menos 95% dos entrevistados avaliam que os atuais políticos não são transparentes e 89% acreditam que os políticos não se preparam para desempenhar bem seu mandato – números estes que impactam diretamente nas decisões eleitorais.

Se antes era natural a imperícia do saber político e a tomada de decisão sem o conhecimento da população, hoje, ações políticas desfavoráveis à opinião pública promovem impactos sem precedentes.

Durante o processo eleitoral, muitos indivíduos utilizaram os canais de comunicação digitais para exigir explicações em assuntos relevantes, tais como as propostas e trajetória dos políticos, bem como motivos e valores de ações que antes se mantinham fora da alçada da sociedade. Além da prestação de contas mais célere e descomplicada nos meios digitais, houve possibilidade de interação bilateral entre campanhas e eleitores.

O marketing digital eleitoral, por um lado, carrega em si a transparência e a accountability direta na relação entre candidatos e eleitores. Isso facilita o controle das ações dos políticos no uso dos recursos públicos e permite monitorar as doações para as campanhas, por exemplo. Em parte, isso aconteceu, mas não foi só isso. Há também possibilidade de explorar a desinformação e as brechas da lei.

Os tribunais eleitorais, TREs e TSE, receberam diversas denúncias sobre esquemas de impulsionamento ilegal de mensagens via Whatsapp. Segundo Marcelo Vitorino, consultor de marketing digital da campanha de Geraldo Alckmin, do PSDB, foram apresentadas mais de 20 propostas de empresas que ofereciam o serviço ilegal. Vitorino também disse que, em 2017, foram feitas denúncias aos órgãos de controle, mas estes ignoram a dimensão do problema.

Em meio a uma avalanche de mensagens difundidas via Twitter, Whatsapp e Facebook, o Tribunal Superior Eleitoral depara-se com lacunas na lei e até mesmo no entendimento do fenômeno. Além da quantidade de mensagens, boa parte delas continha informações falsas, as famosas fake news. Trata-se de um problema crescente, uma poderosa ferramenta que pode influenciar os resultados eleitorais.

Esse cenário tem relação com o de outros países. Ao longo da campanha política para a presidência americana, Donald Trump gastou cerca de US$ 70 milhões para exibir cerca de 50 mil posts patrocinados por dia, não apenas para promover sua candidatura, mas também para atacar sua concorrente, Hillary Clinton, buscando diminuir a quantidade de votos que ela receberia.

Os candidatos brasileiros não atingiram o mesmo patamar de gastos que o presidente americano. Apesar de não existir um limite específico para gastos com posts patrocinados, houve um teto máximo de recursos investidos nas campanhas, de acordo com o cargo. Isso busca prevenir o excesso de informações políticas nas mídias sociais e garantir certo equilíbrio de presença entre os candidatos. Entretanto, houve difusão de mensagens sob patrocínio de indivíduos, supostamente sem o conhecimento dos partidos e candidatos.

Embora tenham havido iniciativas pontuais de controle, não foi articulada uma ação eficiente sobre o que se postou nas plataformas, não houve capacidade de prever ou monitorar o que se tornou essa avalanche de informações, tanto reais quanto fake. Os partidos políticos também falharam ao não monitorar o ambiente virtual dos debates. Portanto, a legislação nova evidenciou falhas, os Tribunais Eleitorais e a sociedade tiveram pouca capacidade para compreender e conter o incontrolável que se tornou o ambiente virtual.

De um lado, temos a liberdade de expressão das pessoas e dos meios de comunicação, algo essencial para a democracia. De outro, cidadãos que recebem uma enxurrada de informações e não tem experiência e conhecimento para buscar sua validação, o que dificulta a formação de um processo eleitoral justo que consiga levar à responsabilização dos políticos que não correspondem às necessidades da população.

Nosso país se encontra em meio a profundas mudanças no processo eleitoral. As expectativas da sociedade e modos de expressá-las e os meios de responsabilização democrática dos candidatos políticos também estão mudando. Se não forem compreendidos e monitorados, o clima de desconfiança pode aumentar, fazendo crescer ainda mais o descontentamento político pelo qual nossa nação está passando.

O interesse político de parte da população, o clima de incerteza e desconfiança no país, combinado à disponibilização de meios digitais para as grandes massas, fez com que as eleições de 2018 gerassem um processo quase inédito no Brasil. As lições desse processo ainda estão sendo compreendidas. Portanto, perguntamos: diante das surpresas das eleições em 2018, como isso afetará o exercício dos mandatos daqui para a frente? E como os órgãos de controle e fiscalização, partidos políticos, candidatos e cidadãos vão se preparar para as próximas eleições?

Para saber mais sobre o tema, entrevistamos o jornalista e empresário Cícero Mendes, que por meio de sua empresa “Em Pauta” comandou campanhas digitais de políticos em todo o país nas últimas eleições. Ouça aqui :

Referências

 FOLHA UOL. Redes são o novo normal na política. Disponível em:                                                               

<https://www1.folha.uol.com.br/colunas/marco-aurelio-ruediger/2018/10/redes-sao-o-novo-normal-na-politica.shtml?loggedpaywall> Acesso em 28 out. 2018.

Gestor Político. Software. Disponível em: <https://neritpolitica.com.br/> acesso em 05 out. 2018

IdeiaBigData Pesquisa. Disponível em: <https://ideiabigdata.com/pesquisa/> Acesso em 12 out.2018.

JUSTIÇA ELEITORAL – Cartilha sobre Propaganda Eleitoral na Internet. Disponível em:

<http://www.justicaeleitoral.jus.br/arquivos/propaganda-eleitoral-na-internet>

acesso em 05 out. 2018

UOL tecnologia. Whatsapp é o novo vilão da eleição.  Disponível em:                                                                                  

<https://www.uol/tecnologia/especiais/whatsapp-e-o-vilao-da-eleicao.htm#frases-1> Acesso em 17 out. 2018.

TI Inside Online. Mais de 30% dos brasileiros ainda não tem acesso à Internet  Disponível em:                                                                     

<http://tiinside.com.br/tiinside/home/internet/21/05/2018/mais-de-30-dos-brasileiros-ainda-nao-tem-acesso-a-internet/> Acesso em 31 out. 2018.

*Texto elaborado por Ana Paula Campos, Bruna Dédalo Gorjão, Bruna Cristina Sanches e Mara Fritsche, no segundo semestre de 2018, no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, da graduação em administração pública da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer.

O papel do Ministério Público no processo de prestação de contas das fundações de direito privado

Por Arthur Bernardo Corrêa, Leticia Macedo, Mariana Silva e Vitor Antonio Celso*

Você conhece a relação entre as fundações e o Ministério Público? Será que o processo atual é o mais eficiente e efetivo?

As fundações, em especial as fundações de direito privado, possuem o propósito de prestar serviços que sejam relevantes à sociedade e que colaborem com o Estado. Elas exercem uma função social e algumas podem se caracterizar como entidades beneficentes, dependendo de sua finalidade, consoante ao artigo 62, do Código Civil.

O Controle das Fundações

A partir da criação de uma fundação de direito privado, ela passa a ser fiscalizada (velada) pelo Estado, que fica responsável pela fiscalização quanto ao cumprimento de seus propósitos e regras.

Para uma fiscalização mais presente, a responsabilidade é atribuída aos Ministérios Públicos localizados nos respectivos estados em que está a sede de cada fundação.

Esse controle é regulamentado pelos artigos 62 a 69 do Código Civil Brasileiro, Código de Processo Civil (arts. 1199/1204) e Lei de Registros Públicos (arts. 114/120).

Em Santa Catarina…

O Processo de Fiscalização

No Ministério Público de Santa Catarina, o processo de velamento ocorre de três formas:

  1. Por meio da promotoria responsável por instaurar os procedimentos administrativos e fiscalizando se a atividades que estão sendo desenvolvidas pelas fundações vão ao encontro do seu estatuto, elaborados nos moldes dos artigos 1199 a 1204, do Código de Processo Civil;
  2. Por meio do Centro de Apoio Operacional de Direitos Humanos e o Terceiro Setor, que atua no suporte técnico para as fundações e na criação de campanhas que conscientizem sobre o tema;
  3. Há, ainda, o Centro de Apoio Operacional Técnico (CAT), que realiza a auditoria das prestações de contas das fundações.

O Processo de Prestação de Contas

Todo processo de prestação de contas é facilitado pela utilização do Sistema de Cadastro e Prestação de Contas – SICAP.

Um software por meio do qual as fundações preenchem suas informações cadastrais e seus demonstrativos contábeis. As prestações de contas, após análise realizada pelo CAT, são remetidas à Promotoria de Justiça da respectiva comarca, até seis meses após o encerramento do exercício financeiro.

Esse controle é regulamentado pelo artigo 19 Ato N. 168/2017/PGJ

A Accountability e o Ministério Público

O processo de accountability nos remete um princípio básico da administração pública, que é a transparência dos atos públicos, tendo em vista que o próprio conceito se volta mais à fiscalização e responsividade de tais atos.

O MP atua fiscalizando e gerando informações qualificadas e disponíveis ao público.

O que se vê na atuação do Ministério Público de Santa Catarina ao agir no controle de fundações, é uma ação de controle institucional sobre organizações da sociedade civil e que busca defender o interesse público.

  • Accountability institucional: é quando acontece o processo de avaliação e responsabilização no âmbito do próprio Estado.

Além disso, a fiscalização não se refere apenas à atuação ex post e à aplicação de sanções, se for o caso. Trabalha-se de modo preventivo e buscando oferecer  apoio técnico. O que caracteriza outro conceito ou tipo de accountability:

  • Accountability horizontal: processo que acontece por meio das agências governamentais que ajudam a monitorar as atividades entre os poderes, deixando nesse caso os cidadãos mais distantes desse processo de fiscalização.

Então, observa-se que o MPSC possui uma função imprescindível para com a sociedade e o Poder Público. É uma instituição que auxilia nas ações das autoridades públicas diante de tais fundações, ao mesmo tempo que fornece um apoio e vela pelas mesmas. Porém, mesmo aplicando algumas estratégias que promovam a transparência, o Ministério Público de Santa Catarina não possui envolvimento ativo da sociedade em todo seu processo de fiscalização.

A Relação entre as Fundações e o MP

As fundações precisam – obrigatoriamente – prestar contas de forma clara e formal ao Ministério Público. Mas por quê? As fundações recebem amparo do Poder Público  e, por isso, precisam mostrar que estão cumprindo com suas obrigações legais e seu estatuto, de modo a validar o respectivo apoio. A forma de demonstrar isso seria através do velamento realizado pelo órgão do Ministério Público, que também oferece apoio técnico e feedbacks às fundações.

Este é uma espécie de fomento às fundações de modo a apoiar sua finalidade, através do Poder Público, atuando o Ministério Público como um fiscalizador da respectiva instituição, que avaliará se faz jus ao provimento ou não.

Por exemplo, existem imunidades tributárias, segundo as quais as fundações não precisam pagar impostos sobre o que é destinado às suas finalidades. Ilustrando…

  • Um território de propriedade de uma fundação, que possui o fim específico de ser utilizado em seus serviços, tem imunidade no IPTU.

O artigo 150, inciso VI, alínea “c”, da Constituição Federal, é explícito quanto à vedação de instituir impostos às fundações sem fins lucrativos que seguem em conformidade com a lei.

Deveres das Fundações

Com toda essa fiscalização, cabe à instituição seguir as normas para atingir o apoio e imunidades já citados. Veja algumas das diretrizes que as fundações precisam seguir:

  • aplicar integralmente seus recursos na manutenção e desenvolvimento dos objetivos sociais;
  • apresentar demonstrativos contábeis e relatório de atividades;
  • seguir em conformidade com seu estatuto previamente elaborado;
  • atuar de modo a atingir seu objeto social, sendo através de atividades lícitas e sem a finalidade de almejar lucros;

A eficiência e a efetividade do processo

Todo esse procedimento de fiscalização e controle imposto pelo Estado faz questionar sobre a eficiência e a efetividade do processo, considerando as fundações existentes em Santa Catarina.

Além disso, a crescente carga de trabalho atribuída às mais variadas áreas do Ministério Público acaba tornando difícil para se ter um controle, fiscalizar todas as fundações. Ainda, a partir de suas funções, prestar suporte técnico a todas às fundações, devido a uma certa sobrecarga do órgão. Essa situação faz com que surjam algumas incógnitas recorrentes:

  • Deveria existir mais incentivos para que a população ajudasse de alguma maneira nesse processo?
  • A concentração do poder de controle pelo Estado não se tornae um agravante dessa falta de atuação mútua com a sociedade?

Para ilustrar

Fomos atrás de especialistas no assunto! Em uma conversa com Dr. João Carlos Teixeira Joaquim, pudemos entender melhor o cenário.

Ficou interessado? Veja só o que o Promotor de Justiça e Coordenador do CAT e do LAB-LF, do Ministério Público de Santa Catarina, nos respondeu:

Dada a experiência em Santa Catarina, como o MP avalia o processo de velamento de fundações? O propósito da lei que o define é cumprido? O que poderia ser aprimorado?

A norma geral de regulamentação nesse tema é o Código Civil (art. 62 a 69) que, apesar de sucinta, orienta sobre os preceitos básicos do velamento pelo Ministério Público.

No âmbito do Ministério Público de Santa Catarina, a atividade de velamento das Fundações privadas é regulamentada pelo Ato n. 168/2017/PGJ. Tal atividade contempla desde o acompanhamento da instituição (aprovação de estatutos) e o desenvolvimento das atividades (prestações de contas e atas de reuniões dos órgãos de gestão), até o encerramento das atividades (extinção administrativa ou judicial).

Oportunidades de aprimoramento ocorrem em todos os aspectos do velamento, especialmente uma potencial agilização dos processos a partir de sua automatização e da digitalização dos procedimentos de fornecimentos de dados por parte das fundações. Bases de dados digitais podem ser analisadas com maior agilidade, facilitando o fornecimento dos dados e potencializando resultados mais efetivos do velamento.

Existem canais de comunicação entre o MPSC e as fundações de direito privado para que os envolvidos recebam feedback e busquem em conjunto o aprimoramento dos processos?

O principal canal de comunicação à disposição da Fundação é a Promotoria de Justiça, que tem a atribuição na área de Fundações e Terceiro Setor, na comarca onde está situada a entidade. De forma complementar, uma equipe técnica composta por servidores com formação em contabilidade pode auxiliar no esclarecimento de dúvidas quanto ao preenchimento das prestações de contas enviadas anualmente ao Ministério Público.

O MPSC consegue atender à demanda existente por apoio técnico e outras atividades relativas ao velamento das fundações de direito privado?

Atualmente há 150 fundações privadas em atividade em Santa Catarina, distribuídas por 56 Comarcas (cerca de 40 foram extintas, tendo como motivo principal a inatividade nos últimos anos). Cada promotoria de Justiça tem seus próprios controles de acompanhamento e fiscalização.

No que tange ao apoio técnico, a equipe técnica conta com três servidores, que tem prazo de 120 dias para apresentar relatório técnico-contábil das análises realizadas nas prestações de contas. Normalmente ocorre acúmulo de demandas nos primeiros meses do segundo semestre, pois as fundações têm até o dia 30 de junho para prestarem contas do ano anterior, e acabam enviados seus arquivos bem próximos à data limite.

Como o MPSC vê a participação dos conselhos das fundações e suas comunidades para auxiliar na transparência e cumprimento das expectativas sobre o papel das fundações na sociedade?

A partir do pressuposto de que “conselhos das fundações” sejam os órgãos de gestão, tais como Conselho Curador e Conselho Fiscal, tem-se que o Conselho Fiscal atua como principal fonte de informações de eventuais irregularidades, em função da sua atribuição (parecer sobre as contas) e autonomia funcional. Quanto à participação das partes relacionadas, sociedade civil, fornecedores, beneficiários, funcionários ou dirigentes, não há atuação efetiva em termos de controle social, apesar de ser importante fonte secundária de informações.

Então

Nota-se que as fundações são constituídas para um fim específico de interesse público.

Assim, poderia existir um trabalho em conjunto com a população, para que além de solucionar os problemas citados, também ajudaria a fortalecer a confiança da sociedade para com o terceiro setor.

E como você enxerga as soluções?

Referências

BARROS, Vitor. Entrevista concedida para equipe. Florianópolis, 29 nov. 2018. Disponível  em: <https://docs.google.com/document/d/e/2PACX-1vQUDIpIloxpsvhHBqNOaE-X5J1VY7YA6LdAr7JL5iBHPUwNvS9qa1ZAbSdVT48DBliXvquKqz5DDHJl/pub> 

BRASIL. Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973. Dispõe sobre os registros públicos, e dá outras providências. BRASIL, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6015compilada.htm>. Acesso em: 31 out. 2018.

BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002.  Institui o Código Civil. BRASIL, Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6015compilada.htm>. Acesso em: 31 out. 2018.

BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015.  Código de Processo Civil. BRASIL, Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm>. Acesso em: 31 out. 2018.

MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA. Terceiro Setor, Disponível em: < https://www.mpsc.mp.br/areas-de-atuacao/terceiro-setor>. Acesso em: 01 out. 2018.

SCHOMMER, Paula Chies. Coprodução do Controle e Accountability Social: panorama de iniciativas e tendências. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=q6kusUUhgd0>. Acesso em: 25 nov. 2018

*Texto elaborado por Arthur Bernardo Corrêa (arthurbernardocorrea@gmail.com), Leticia Macedo (macedoleticiam@gmail.com), Mariana Silva (marianasilva270897@gmail.com) e Vitor Antonio Celso (vitorcelss@gmail.com), no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, ministrada no segundo semestre de 2018 pela professora Paula Chies Schommer, no curso de administração pública da Udesc Esag.

Quanto custa uma campanha política? De onde vem o dinheiro? A conta fecha?

Por Rafael Telles de Carvalho, Brunna Maila dos Santos e Matheus Silva Duarte de Oliveira*

O processo eleitoral em 2018 e a atual situação econômica e financeira do Brasil levantaram inúmeras questões referentes aos gastos em campanhas políticas.

Quando se questiona “quanto custa uma campanha política?”, remete-se não apenas à quantidade de dinheiro gasto, também de onde vieram os recursos e se a arrecadação foi feita de acordo com as leis. Esses aspectos foram amplamente abordados nas recentes eleições, tanto por candidatos quanto pela população.

O total de gastos de candidatos e partidos em 2018, no 1º turno, chegaram aos R$ 2,9 bilhões de reais. É o que mostra um levantamento do portal de notícias G1 em 10/11/2018, a partir de informações disponibilizadas pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Esse número representa 50% menos nos gastos em comparação com a eleição de 2014, como se pode ver no Gráfico a seguir, divulgado pelo TSE:

Fonte: TSE, 2018

Os novos números são considerados por alguns analistas como um excelente resultado, representando uma maior consciência e bom senso dos candidatos. Outros consideram que a redução é apenas resultado das novas regras e condições que passaram a valer este ano, tais como: período de duração da campanha, que em 2014 era de 90 dias e diminuiu para 45 dias em 2018; o estabelecimento de teto de gastos por candidato (para presidente da república, por exemplo, são R$ 70 milhões no primeiro turno das eleições, com acréscimo de R$ 35 milhões na hipótese de realização de segundo turno) e; a proibição de doações por empresas.

Esta última tem muito a ver com a diminuição dos gastos neste ano, na opinião do entrevistado para esta matéria, o professor de administração pública da Udesc Esag, Leonardo Secchi (áudio da entrevista ao final do texto). O professor observa que a proibição de doações empresariais para as campanhas foi positiva, embora a redução dos recursos totais em si talvez seja algo negativo, sob o ponto de vista de que se deve investir mais em campanhas políticas, pois é um processo essencial da democracia, que requer debate e aprendizagem. O investimento em campanhas é visto como um incentivo à cidadania, um estímulo à participação da população no processo eleitoral. Nesse sentido, o fundo público acaba tendo um papel importante neste processo.

Algo colocado por muitos candidatos é a necessidade de ter mais independência em relação aos doadores públicos e privados. É o que mostrou a campanha de 2018, pois muitos candidatos têm usado recursos próprios nas suas campanhas, o chamado autofinanciamento. Sobre isso, Secchi considera um aspecto positivo e outro negativo:

O ponto de vista positivo é que, se ele é um político virtuoso e vai fazer a defesa do que é de interesse coletivo, ele não vai estar nas mãos ou atrelado a grandes financiadores, mas sim com autonomia para fazer o seu mandato. Por outro lado, também existe o risco desse mandatário privatizar o seu mandato, ou seja, por ter investido o seu próprio dinheiro na sua campanha, acredita que o retorno deve ser dele também. Claro que aí cabe à população saber separar o “joio do trigo” e saber eleger candidatos que, nas suas propostas, nos seus conteúdos, façam defesas de pautas coletivas e não pautas corporativistas, individuais, que venham a privatizar o mandato.

Leonardo Secchi

No ano de 2018, alguns candidatos investiram fortunas nas suas campanhas. O candidato à presidência Henrique Meirelles, por exemplo, investiu 54 milhões de reais em sua própria campanha, sendo 100% do valor vindo de seu “bolso”. Foi o candidato que mais colocou recursos próprios em campanha. Outros partidos vêm incentivando essa prática, entre eles o partido NOVO, financiado com o dinheiro dos próprios filiados.

Cabe questionar, entretanto, se o investimento financeiro em campanhas realmente faz tanta diferença. Em 2018, além da redução significativa nos gastos, houve um movimento dos candidatos para o forte uso da internet como instrumento nas suas campanhas, o chamado impulsionamento digital, que exige menos recursos financeiros. Muitos candidatos optaram por fazer suas campanhas mais pelas redes sociais, produzindo conteúdos para esses canais de comunicação, os quais demandam menor investimento de recursos. E parece ter dado certo para muitos candidatos, de diversos partidos, eleitos em 2018 tendo as redes sociais como principal meio de comunicação.

A campanha eleitoral de 2018, com as novas regras para o financiamento e as novas estratégias adotadas pelos candidatos, mostrou que o custo de uma campanha política é relativo.

Não podemos esquecer que o atual modelo de financiamento veio acompanhado de um novo momento em que se encontra o país. É preciso avaliar o que deve ser aproveitado do modelo antigo e adaptar-se às novas demandas da sociedade para alimentar a democracia, de forma a possibilitar a maior participação possível da população no processo eleitoral.

O modelo atual ainda sofre muitas críticas, principalmente no que se refere ao dinheiro público destinado aos Fundos Partidário e Eleitoral, enquanto muitos setores e serviços públicos carecem de recursos. Sobre o Fundo Partidário, por exemplo, de acordo com o Senado Notícias, no final de 2017, o senador Cristovam Buarque (PPS-DF) lamentou em plenário o veto do presidente Michel Temer de artigo da Lei de Diretrizes Orçamentárias que previa  recursos para o cumprimento de metas do Plano Nacional de Educação. Cristovam questiona:

E por que esse dinheiro para campanha? Primeiro ponto: campanha, quem tem que financiar são os simpatizantes. Segundo: por que essa campanha custa tanto? Depois que inventaram isso aqui, internet, a gente consegue fazer campanha barata.

Enquanto o governo veta um dispositivo que tem mais um peso simbólico do que financeiro, disse Cristovam, a comissão especial da Câmara dos Deputados que trata da reforma política aprovou a criação de um fundo público de R$ 3,6 bilhões para financiar as campanhas políticas (Senado Notícias, 2017)

Por conta disso, o senador conclamou a sociedade, em especial a comunidade científica e os estudantes, na luta contra o fundo. Na opinião dele, “só assim as autoridades saberão eleger prioridades em um tempo em que o dinheiro é escasso e muitos são os setores públicos que precisam de investimento” (Senado Notícias, 2017).

Em 2018, foram autorizados 888,7 milhões de reais para o Fundo Partidário, sendo que 20% desse total deve ser empregado na manutenção das fundações partidárias, responsáveis por atividades de pesquisa e formação política, e 5% para a promoção de mulheres na política.

O Fundo Eleitoral também sofre críticas. Segundo o Estadão, em 2018, o fundo bilionário criado serviu para bancar campanhas políticas, retirando R$ 472,3 milhões originalmente destinados pelos parlamentares para educação e saúde. O valor corresponde a uma transferência do dinheiro de emendas de bancada, que seria destinado a esses setores.

A questão dos gastos no financiamento de campanha divide opiniões e, sem dúvida, faz refletir a respeito do montante realmente necessário para uma boa campanha política. As inúmeras fragilidades em áreas como educação, saúde e segurança pública levam a questionar a razoabilidade em destinar tanta verba pública para campanhas eleitorais. Bem como, visualiza-se como óbvia a importância dos sistemas de transparência e o controle social sobre a administração pública, para quantificar e qualificar as necessidades de gastos com algo tão importante que é o processo eleitoral democrático. Sobre isso, outra questão que se coloca é o custo do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para os cofres públicos. Segundo o site JConline, de acordo com levantamento feito pela ONG Contas Abertas, o TSE custou R$ 5,4 milhões aos cofres públicos por dia no ano de 2017.

Além disso, embora se tenha avançado nos sistemas de prestação de contas e responsabilização dos candidatos pelo chamado “Caixa 2”, a diminuição significativa nos gastos pode não significar nada nos bastidores. A prática, que era e continua sendo ilegal, pode ter se atualizado e seguir acontecendo, com pouco ou nenhum conhecimento da população e dos sistemas oficiais de prestação de contas.

Cabe aos cidadãos e aos candidatos estimularem o controle e exigirem maior accountability no processo eleitoral para encontrar as verdadeiras causas da redução dos gastos e preencher as brechas que permitem com que haja novas maneiras de desequilibrar o jogo político-eleitoral. Além de refletir se o dinheiro público vem sendo bem empregado, vale analisar o que pode ser aprimorado para que se tenha mais controle e indicadores que certifiquem de que mudanças no sistema eleitoral e de financiamento de campanha estão surtindo efeito. Vale indagar sempre se, afinal, a conta fecha. Será que esses novos números apontam sinais de que estamos no caminho certo?

No link a seguir, pode-se ouvir a entrevista sobre o tema com o professor de administração pública da Udesc Esag, Leonardo Secchi, doutor em ciência política e especialista na formatação de mandatos compartilhados, sobre os custos em uma campanha política.

Referências e mais sobre o tema em:

Cristovam critica criação de fundo partidário bilionário e veto de Temer a dispositivo da LDO. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2017/08/10/cristovam-critica-criacao-de-fundo-partidario-bilionario-e-veto-de-temer-a-dispositivo-da-ldo> Acesso em: 23 de novembro.

Saúde e educação perdem R$ 472 milhões para campanhas. Disponível em: <https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,saude-e-educacao-perdem-r-472-mi-para-campanhas,70002142094>. Acesso em: 20 de novembro.

Gastos de campanha no 1° turno das eleições caem pela metade em comparação a 2014. Disponível em: <https://g1.globo.com/politica/eleicoes/2018/eleicao-em-numeros/noticia/2018/11/10/gastos-de-campanha-no-1o-turno-das-eleicoes-caem-pela-metade-em-comparacao-a-2014.ghtml>. Acesso em: 10 de novembro.

As mudanças no financiamento de campanha para as eleições de 2018. Disponível em: <http://iespnaseleicoes.com.br/as-mudancas-no-financiamento-de-campanha-para-as-eleicoes-de-2018/>. Acesso em: 10 de novembro.

Meirelles gasta R$ 54 milhões do próprio bolso e tem campanha mais cara. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/10/meirelles-gasta-r-54-milhoes-do-proprio-bolso-e-tem-campanha-mais-cara.shtml>. Acesso em: 20 de novembro.

TSE divulga limites de gastos de campanha e de contratação de pessoal. Disponível em: <http://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2018/Junho/eleicoes-2018-tse-divulga-limites-de-gastos-de-campanha-e-de-contratacao-de-pessoal>. Acesso em: 25 de novembro.

Quanto vale uma eleição? Regra de financiamento favorece ricos e quem já tem mandato. Disponível em: <https://www.brasildefato.com.br/2018/07/20/quanto-vale-uma-eleicao-regra-de-financiamento-favorece-ricos-e-quem-ja-tem-mandato/>. Acesso em: 25 de novembro.

Quanto custa a democracia. Disponível em: <https://veja.abril.com.br/politica/quanto-custa-a-democracia/>. Acesso em: 25 de novembro.

TSE custa R$ 54 milhões por dia, aponta ONG Contas Abertas. Disponível em: https://jconline.ne10.uol.com.br/canal/politica/nacional/noticia/2017/06/09/tse-custa-r-54-milhoes-por-dia-aponta-ong-contas-abertas-288979.php>. Acesso em: 25 de novembro.

*Texto elaborado pelos acadêmicos Rafael Telles de Carvalho (rafaelcarva4@gmail.com), Brunna Maila dos Santos (brunnamaila@gmail.com) e Matheus Silva Duarte de Oliveira (vizaduarteoliveira@gmail.com), no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, da graduação em Administração Pública da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer, com participação do mestrando Rafael Tachini de Melo.

Em tempos de luta pela democracia, como lidar com esse gigante invisível chamado FAKE NEWS?

Por Isabella Cristina Schnorr Gevaerd, Isadora Christina Ribas Schiefler e Luiza Moriggi da Silva*

O Brasil é um dos muitos países nos quais a desinformação compartilhada em meio virtual tem influenciado o comportamento do mundo real. Na Índia, a disseminação de notícias falsas levou à violência em várias partes do país. Segundo o jornal estadunidense “Radio free asia,” Myanmar tem sofrido com discursos de ódio e fake news vinculadas a páginas do Facebook. O site “Politize” aponta a desinformação nos Estados Unidos como um problema presente em uma série de plataformas de mídia social, a ser superado.

A disseminação de informações falsas, também conhecidas como fake news, acabam sendo utilizadas para influenciar as pessoas a pensarem de determinado modo ou até mesmo legitimar pensamentos que outrora não eram verbalizados. Pode-se perceber o fenômeno relativo a fake news como um “negócio” que tem potencial de mobilizar as massas, influenciando a formação da opinião pública, tanto em âmbito nacional quanto internacional.

Qualquer pessoa consegue disseminar fake news, seja por meio de publicação em páginas de Facebook, canais de vídeo como o Youtube, sites que se dizem informativos e, mais ainda, aplicativos de mensagens com menos possibilidade de controle, como o WhatsApp. Cabe ao público assimilar ou não as informações como verdadeiras.

Este novo “negócio” só se sustenta pois há quem valide as informações exatamente porque gostariam que fossem verdadeiras.

Desde 2016, a palavra “pós-verdade” consta no dicionário Oxford, denotando as “circunstâncias nas quais fatos objetivos têm menos influência em moldar a opinião pública do que apelos à emoção e crenças pessoais”. Não é de espantar que, em 2017, a palavra do ano seja “Fake News” e o termo tenha passado a constar de dicionários em diversos países. O dicionário Collins, por exemplo, define Fake News como “informações falsas, e eventualmente sensacionalistas, divulgadas sob o disfarce de notícias”.  Pouco mencionado no passado, o fenômeno hoje é visto por muitos como ameaça à democracia, ao livre debate e à ordem ocidental.

Neste contexto, compreender o seu efeito e saber identificar quando tais informações são disseminadas passa a ser uma necessidade, já que o fenômeno passa longe da accountability, que é essencial nas democracias. A relativa facilidade que qualquer pessoa tem de formular ou propagar notícias falsas traz dificuldades para a efetivação da accountability. Quando alguém intencionalmente propaga algo desalinhado com a verdade, afasta-se da transparência e da responsabilidade. Cria-se um ciclo desvirtuado de troca de informações errôneas, afetando o processo democrático. O debate de problemas públicos é empobrecido, pois os alvos das fake news acabam investindo grande parte de seu tempo na defesa diante das acusações, ao invés de focalizar o diálogo construtivo.

Do ponto de vista do advogado Leonardo Cisne, pós-graduado em Direito Digital e Compliance e membro e coordenador da Comissão de Direito Digital da OAB/SC, as fake news foram ganhando espaço de diferentes formas nos últimos tempos e é responsabilidade de cada um analisá-las atentamente para não se deixar envolver pelo que tais notícias tentam passar.

Mas como se pode estar atendo para não se deixar enganar por Fake News?

Segundo Leonardo Cisne, é importante verificar as fontes. Sites desconhecidos são menos confiáveis e podem mais facilmente disseminar informações falsas, principalmente quando o autor não se identificar, pois demonstra que o responsável por criar tal “notícia” não quer ser responsabilizado pelo que escreveu, nem mesmo identificado. Isso também afeta a accountability, em suas dimensões de controlabilidade e imputabilidade

O leitor deve ficar atento também à data das notícias. Muitas delas são publicadas muito depois de quando ocorreu o fato. Fora do contexto, podem ter interpretação muito diferente. Outra dica é verificar se a mesma notícia também foi publicada em outras fontes e canais de imprensa.

Outra tática é a leitura completa das notícias, pois muitas manchetes são feitas de forma sensacionalista ou enganosa, com o intuito de levar o leitor a acreditar em meias verdades ou confundi-lo com algo totalmente fora de contexto. Assim, o leitor deve ficar atento e não tirar conclusões considerando apenas os títulos das matérias que acessa, além de desconfiar de notícias de tom sensacionalista.

A figura a seguir resume algumas dicas para identificar notícias falsas:

Ainda que se siga essas orientações, é um grande desafio distinguir verdades de mentiras, pois muitas vezes essas se misturam e as realidades distorcidas ou embaçadas influenciam o contexto político e social. Desta forma, é importante pensar como eternos críticos, prezando pela justiça, verdade e pela democracia.

A responsabilidade principal está com cada cidadão que consome, dissemina e produz informações. Cabe à cidadania buscar o esclarecimento, a razoabilidade e a verdade, em cada contexto, buscando ler e escrever de forma consciente a história de seu povo.

Ouça a seguir a entrevista sobre o tema, realizada em outubro de 2018, com o advogado Leonardo Cisne:

Para mais informações sobre o tema, acesse o seguinte link:

https://www.bbc.com/portuguese/brasil-45666742

*Texto elaborado pelas acadêmicas Isabella Cristina Schnorr Gevaerd (bellagevaerd@gmail.com), Isadora Christina Ribas Schiefler (isadoraschiefler@gmail.com) e Luiza Moriggi da Silva (luizamoriggi@hotmail.com), em novembro de 2018, na disciplina Sistemas de Accountability, do curso de Administração Pública da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer.

Financiamento de campanhas eleitorais e accountability: o que mudou nas Eleições de 2018?

Por Ana Carolina Freitas Borba, Daniel Albiero, Onildo Medeiros, Vanessa Schreiner e Victor Pasquoal*

O atual sistema de financiamento de campanhas eleitorais no Brasil é um tema bastante comentado, mas ainda complexo e pouco conhecido para a maioria dos eleitores. Nos últimos anos, novas leis e normas foram aprovadas visando que as campanhas eleitorais sejam mais transparentes, haja menos fraudes e ilicitudes, o volume total de recursos investidos diminua e haja menos desequilíbrio entre os concorrentes. A Justiça Eleitoral também tem buscado melhorar seus sistemas e contribuir de forma mais ativa para o aumento da credibilidade do processo eleitoral. Ainda assim, os efeitos do financiamento e das estratégias de campanha ainda é algo difícil para ser entendido e acompanhado pelos maiores interessados, os cidadãos.

Dentre as principais mudanças, o financiamento de campanha passou a ser misto, ou seja, tanto público quanto privado. Desde 2016, são proibidas doações de empresas em campanhas eleitorais,mas pode haver autofinanciamento dos candidatos e doações de pessoas físicas, além dos recursos públicos oriundos do Fundo Especial de Financiamento de Campanhas (Fundo eleitoral) e do fundo partidário.

Há, ainda, o fundo partidário, que corresponde ao repasse anual de manutenção dos partidos, o que até então não era permitido para uso em campanha. É constituído por dotações orçamentárias da União, multas, penalidades, doações e outros recursos financeiros que lhes forem atribuídos por lei. Em 2018, esse repasse foi de R$ 888,7 milhões.

O Fundo Especial de Financiamento de Campanhas (FEFC) foi aprovado em 2017 pelo Congresso Nacional, que destinou para as eleições de 2018 o montante de R$ 1,7 bilhão. Esse valor foi repassado aos partidos de acordo com critérios relativos ao registro no TSE, representação na Câmara e quantidade de Deputados e Senadores.

Para facilitar o entendimento de como os candidatos e partidos políticos devem prestar contas, a Justiça Eleitoral elaborou o Manual de Prestação de Contas, contendo as diretrizes a serem seguidas pelos participantes e para consulta por qualquer pessoa interessada. Esse é um dos exemplos de como a Justiça Eleitoral tem buscado tornar o processo mais didático e transparente, o que tende a contribuir para a credibilidade do processo eleitoral e o fortalecimento da democracia no país.

No que diz respeito à fiscalização das ações de campanhas ocorridas via redes sociais, porém, a atuação do Tribunal Superior Eleitoral mostrou-se insatisfatória, diante da relevância que a comunicação via redes sociais alcançou nessas eleições. Candidatos com menos acesso a recursos públicos de financiamento de campanha voltaram suas ações às plataformas digitais, com menor custo, mas também com menos fiscalização pelos órgãos judiciais, até pela inexperiência diante das novidades. 

Abertas as urnas, ficou claro que a distribuição de recursos não foi determinante para os resultados das eleições, gerando ainda mais controvérsias sobre o fundo de campanha com base em recursos públicos, já que muitos candidatos com altos gastos de campanha não conseguiram obter resultados que os justificassem.

Isso tudo fica mais evidente quando colocamos os dados referentes às últimas eleições em gráficos:

Fonte: TSE
Fonte: TSE
Fonte: G1

Com base nos dados dos gráficos de distribuição de recursos para financiamento de campanha, é possível verificar que não há correspondência direta entre os valores gastos e o resultado das eleições. Candidatos que não tiveram acesso aos recursos buscaram compensar essa falta com utilização mais intensiva de redes sociais e outras estratégias. Muitos deles conseguiram se eleger.

Se, entre as campanhas eleitorais mais bem-sucedidas estão as que priorizaram o uso das redes sociais, como verificar se essas ações ocorreram de acordo com o permitido pelas normas e pela Justiça Eleitoral? Diante das transformações nos meios e estratégias de campanha, há uma demanda para que as instituições regulamentadoras e fiscalizadoras do processo eleitoral estejam sempre atualizadas e sejam mais ágeis em suas ações.

Para debater esses temas, conversamos com o Vereador da Câmara Municipal de Florianópolis, Gabriel Meurer, o Gabrielzinho. A questão da transparência foi bastante enfatizada. A intensa participação social que se viu nessas eleições, somada às novas regras para doação de pessoas físicas e o fundo partidário público, geraram demandas para uma prestação de contas mais efetiva.

Na opinião do vereador, “por mais que as campanhas tenham se tornado mais transparentes, não quer dizer que não haja desvios, por isto a fiscalização deve ser ainda mais efetiva”. Como esta foi a primeira eleição a utilizar as novas regras, foi notório que os partidos políticos e os próprios políticos tiveram várias dúvidas.

O entrevistado também observou que as redes sociais foram ferramentas muito utilizadas pelos candidatos, principalmente aqueles com menos acesso a tempo de rádio/TV e recursos do fundo partidário. “Os resultados das urnas nos mostraram o quanto as redes contribuíram para a credibilidade de campanha eleitoral dos candidatos que optaram por realizar a campanha por esse meio”, disse o entrevistado.

Entretanto, há que se ter precaução com as chamadas fake news, ou notícias falsas, pois grande parte dos cidadãos não investiga se as informações são verídicas e isto influencia diretamente no processo decisório da votação.

Órgãos como a Polícia Federal, a Abin, e o Ministério Público, juntamente com o Tribunal Superior Eleitoral, tem feito um trabalho buscando combater as fake news. “Não somente no período das eleições, o processo instituiu-se anteriormente à campanha. A responsabilidade cabe também aos cidadãos, que devem verificar a veracidade das notícias”, colocou o vereador Gabriel.

O que ainda pode ser aperfeiçoado para que a disputa seja mais justa e a escolha ocorra com base nas melhores propostas?

Um dos caminhos é se buscar mais equilíbrio de oportunidade a todos os candidatos, seja no tempo disponível para expor suas propostas na mídia ou em questões financeiras.

Nos debates da televisão, por exemplo, participam os candidatos com maior representatividade (existem regras neste aspecto).Porém, candidatos cujos partidos possuem pouca representatividade e que possuem propostas interessantes acabam não alcançando o grande público que acompanha os debates televisivos, que oferecem visibilidade aos candidatos. A pouca expressividade de alguns candidatos nas pesquisas, com pouco tempo na TV e sem participação nos debates, provoca certa desconfiança do eleitorado sobre suas propostas e sua credibilidade. Como muitos cidadãos não utilizam redes sociais ou tem acesso à internet, onde sua campanha era mais forte e incisiva, esses eleitores não tomaram conhecimento sobre o candidato a ponto de escolhê-lo e depositar sua confiança nele através do voto.

As eleições 2018 mostram, por um lado, que o controle social e a fiscalização estão mais efetivos, pois a população está mais politizada e atenta, embora ainda precise buscar informações em meios confiáveis. Por outro lado, permanecem traços relacionados à velha politicagem, baseada em troca de votos por favores e permutas e adesão a soluções “milagrosas” sem muito questionamento da viabilidade.

Uma melhoria nesse quadro, com mudanças mais efetivas a médio e longo prazo dependerá de que as pessoas utilizem o acesso às informações para refletir, debater e tomar decisões mais sensatas e maduras, não apenas nas eleições, também no cotidiano da política e da cidadania.  Além disso, os meios para realizar denúncias sobre desvios e promessas não cumpridas, seja nas eleições ou durante os mandatos, são mais acessíveis do que em outros tempos.

A população requer um país melhor, no qual os direitos básicos e deveres previstos na Constituição Federal sejam cumpridos. Isso passa por regras eleitorais que promovam equilíbrio na disputa e sejam cumpridas, informações e debate qualificado, partidos e governos eficientes, transparentes e responsivos às expectativas dos cidadãos. O que exige que os próprios cidadãos sejam responsáveis no exercício do seu poder político, antes, durante e depois das eleições.

Ouça entrevista sobre o tema, no programa Nas Entrelinhas, da Rádio Udesc, com o Vereador de Florianópolis, Gabriel Meurer, Gabrielzinho.


Referências

ABRUCIO, Fernando Luiz; LOUREIRO, Maria Rita. Finanças públicas, democracia e accountability. In: ARVATE, Paulo Roberto; BIDERMAN, Ciro (Org.). Economia do Setor Público no Brasil. Rio de Janeiro: Campus/Elsevier, 2005. pg. 75-102.

Fundo Especial de Financiamento de Campanha. Disponível em : http://www.tse.jus.br/eleicoes/eleicoes-2018/prestacao-de-contas-1/fundo-especial-de-financiamento-de-campanha-fefc

Lei das Eleições – Lei nº 9.504, de 30 de setembro de 1997.Disponível em: http://www.tse.jus.br/legislacao/codigo-eleitoral/lei-das-eleicoes/lei-das-eleicoes-lei-nb0-9.504-de-30-de-setembro-de-1997

Instrução Normativa Conjunta nº 1.019 de 10 de março de 2010.Disponível em: http://www.tse.jus.br/legislacao/codigo-eleitoral/instrucoes-normativas/instrucao-normativa-conjunta-nb0-1.019-de-10-de-marco-de-2010

Tribunal Superior Eleitoral – Distribuição do Fundo Partidário. Disponível em: http://www.justicaeleitoral.jus.br/arquivos/tse-distribuicao-fundo-partidario-duodecimo-outubro-2018-1541614726486

Tribunal Superior Eleitoral – Montante Total do fundo especial de financiamento de campanha. Disponível em:http://www.justicaeleitoral.jus.br/arquivos/montante-total-do-fundo-especial-de-financiamento-de-campanha

Entenda o que são e quais as diferenças entre o fundo eleitoral e o fundo partidário. Disponível em:https://politica.estadao.com.br/noticias/eleicoes,entenda-o-que-sao-e-quais-as-diferencas-entre-o-fundo-eleitoral-e-o-fundo-partidario,70002362544



* Texto elaborado por Ana Carolina Freitas Borba (anacarolinaborbaf@gmail.com), Daniel Albiero (albierogodoi@gmail.com), Onildo Medeiros (onildo.sm@gmail.com), Vanessa Schreiner (vanessa.schreiner@gmail.com) e Victor Pasquoal (victorpasquoal@hotmail.com), no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, da graduação em Administração Pública da Universidade do Estado de Santa Catarina, ministrada pela Professora Paula Chies Schommer, no segundo semestre de 2018.

Inovação na política: a sociedade está preparada? Um enfoque nos mandatos coletivos e compartilhados

Por Ana Victoria Nunes, Flávia Kfuri, Franciele Rocha, Pâmela Vidio e Patrícia Rosa*

A tecnologia está cada vez mais presente no cotidiano das pessoas, é difícil imaginar a realidade sem ela. Dentre os meios eletrônicos mais utilizados pela população, os aparelhos celulares despontam como os preferidos. Na entrevista publicada pelo site Caros Ouvintes, instituto de estudo de mídia, são revelados dados de como o celular se tornou o dispositivo eletrônico mais utilizado pelas pessoas para comunicação, informação, acesso a serviços e outras utilidades.

Segundo a Anatel, o Brasil apresenta 236 milhões de celulares ativos, desses, 162 milhões possuem acesso à internet. A velocidade do mundo digital e o acesso às notícias facilitou o compartilhamento de informações por meio de plataformas sociais, que se tornaram ferramentas importantes para se manter conectado atualmente.

Dentre as mudanças culturais que a tecnologia trouxe à sociedade, uma tendência percebida é o compartilhamento. Compartilhar caronas, casas e assinaturas tornou-se algo comum e essa tendência também chegou à política. O uso da internet tem se mostrado uma inovação no contexto eleitoral. Além do compartilhamento de informações sobre candidatos, partidos e propostas, nas últimas eleições, destacam-se os mandatos compartilhados.

O artigo Mandatos Compartilhados, papel e limites, de Saulo Francisco Paganela e Keli Magri, explica o contexto e a evolução do compartilhamento para  impulsionar ideias e projetos. Segundo o texto, só no Brasil, nas eleições de 2012, 2014 e 2016, houve 67 candidaturas que seguiram o modelo de mandatos compartilhados, com o objetivo de ocupar cargos do legislativo em diversas cidades brasileiras, representando 19 partidos políticos diferentes. As propostas atingiram a marca de 256.011 votos válidos e oito candidatos foram eleitos, em quatro estados distintos: Goiás, Rio Grande do Norte, Minas Gerais e Santa Catarina. Em 2018, a estimativa é de que tenham sido lançadas cerca de 32 candidaturas.

Essas candidaturas apresentam uma alternativa ao modelo de democracia representativa, na qual os eleitores escolhem um representante e este delibera por conta própria durante todo o mandato legislativo. No mandato compartilhado, o processo de tomada de decisão passa por um debate com o envolvimento de pessoas com opiniões diversas, que diversificam os pontos de vista durante a deliberação.

O primeiro modelo de mandato dividido entre um grupo de pessoas surgiu na Suécia, em 2002, quando um conjunto de estudantes da universidade local lançou uma candidatura compartilhada para vereador e o candidato representante do grupo foi eleito. A proposta possui variados modelos bem-sucedidos e de lá para cá outros países têm adotado essa prática, a exemplo da Austrália, Estados Unidos, Argentina e no Brasil.     

Os conceitos de mandato compartilhado e mandato coletivo podem ser utilizados como sinônimos. Existe, porém, uma diferença conceitual, algo que vem sendo discutido e aprofundado. O mandato coletivo costuma se referir à modalidade em que um grupo fechado de pessoas, geralmente do mesmo partido, atua em conjunto durante o mandato. Já no mandato compartilhado, não há limitação quanto à participação de co-parlamentares. Em ambos, oficialmente, perante a justiça eleitoral, há um único candidato e um único eleito.

Os critérios de como funciona o mandato coletivo ou compartilhado podem ser negociados previamente, buscando evitar desavenças durante a execução do mandato, e recebem ajustes em seu curso, de acordo com as necessidades. Para isso é importante que as expectativas dos envolvidos no mandato sejam alinhadas e que se chegue a um modelo baseado na confiança, visto que o Tribunal Superior Eleitoral autoriza a candidatura de grupos, porém reconhece apenas um candidato como “oficial”.

Segundo Willian Quadros, mestrando em administração na Udesc Esag, na linha de Políticas Públicas e Gestão, o critério primordial do mandado compartilhado é a delegação do poder de decisão. Esses mandatos acarretam o compromisso do representante no legislativo de compartilhar o poder com um grupo de cidadãos. O representante pode apenas consultar, debater, ou seguir o posicionamento do grupo de representados ao se posicionar e decidir no parlamento, dependendo do modelo de mandato proposto. 

O mandato compartilhado representa uma inovação ao promover uma aproximação entre cidadãos e a arena política, além de ser uma ferramenta de accountability a favor do cidadão. A partir do momento que a tomada de decisão é realizada em conjunto, as informações são difundidas com mais facilidade e transparência, e a comunicação torna-se menos assimétrica entre o representante eleito e seu eleitorado. O representante, por sua vez, acessa conhecimentos que talvez não teria, amplia perspectivas e tende a se posicionar e votar com mais legitimidade em relação a sua base.

Para entender essa relação, é preciso ter em mente que a noção de accountability no setor público é complexa. Denhardt e Denhardt (2003) observam que o administrador de empresas privadas tem que responder, sobretudo, a critérios dos mercados, enquanto que o das organizações públicas devem atender às leis, à Constituição, aos valores da comunidade, às normas políticas, aos padrões profissionais e aos interesses dos cidadãos. Essa concepção de accountability considera que gerar bons resultados e prestar bons serviços públicos é pouco. É preciso cuidar também de aspectos referentes à democracia, aos valores sociais e comunitários e ao interesse público.  

Com isso em mente, pode-se começar a trabalhar com o conceito no contexto democrático. Malena, Forster e Singh (2004) definem accountability como a obrigação dos detentores do poder de prestar contas e/ou demonstrar responsabilidade por suas ações. Os agentes públicos devem ser accountable em sua conduta e em seu desempenho, ou seja, devem ser responsáveis perante a lei e servir ao interesse público de maneira justa, eficiente e efetiva. Para esses autores, esse é um direito dos cidadãos e uma obrigação dos agentes públicos.

Bovens (2005) afirma que a accountability no setor público pode ser definida como uma relação social em que um ator (indivíduo ou organização) se sente obrigado a explicar e a justificar publicamente sua conduta a outro ator significativo (uma pessoa, organização, ou mesmo uma entidade virtual – como a consciência).

Foto: Thomas Drouault/Unsplash.com

Já a accountability social pode ser definida como uma abordagem em que os cidadãos e as organizações da sociedade civil participam direta ou indiretamente das atividades que exigem essa prestação de contas ou responsabilidade. Ainda, Fonseca (2016) traz o conceito de accountability social como aquele que surge como estímulo de outros meios de fiscalização por parte da sociedade, a serem desempenhados pelos movimentos sociais, pelas associações e grupospopulares, pela sociedade civil organizada e pela imprensa. Esse controle pode ser feito fora do período eleitoral e garante maior grau de participação. Os cidadãos se mobilizam para demandar mais prestação de contas, qualidade dos serviços públicos, informação e transparência, além de poderem atuar diretamente como coprodutores do serviço público.

O mandato compartilhado pode ser visto como um mecanismo de accountability social, em que há ação direta do cidadão, pois permite a delegação do poder de decisão, a aproximação das pessoas da arena política (diminui o gap entre o cidadão e a política), a ampliação da participação cidadã e o estímulo da fiscalização pela sociedade.

A partir dessa proposta de aproximação entre cidadão e o poder legislativo, já se pode perceber alguns impactos do mandato compartilhado nas eleições. Esse modelo de representatividade, timidamente, tem surgido e assumido alguns cargos eletivos, mostrando que a população anseia por renovação na estrutura política e participação. Quando analisados os resultados deste ano, 2018, o que se observou foi que houve mais candidatos com propostas de mandato compartilhado do que nas eleições anteriores, trazendo uma proposta de democracia mais alargada. Por outro lado, o coordenador de uma campanha de mandato compartilhado, William Narzetti, observa que uma parcela da população, em sentido contrário, parece disposta a abrir mão de parte de seu poder em prol de um governo mais forte,duro e autoritário.

Assim, ainda que os mandatos compartilhados sejam um mecanismo de inovação que aproxima o cidadão da política e pode ser usado como ferramenta para o exercício da democracia de maneira mais transparente e responsiva, questiona-se: que tipos de accountability política desejamos? São legítimas tanto as expectativas de cidadãos que querem se envolver diretamente no exercício do poder político ou parlamentar, quanto as expectativas daqueles que talvez prefiram delegar o poder para seus representantes. O exercício da democracia ocorre por meio de diferentes formas de compartilhamento de poder e accountability,em permanente processo de experimentação e aprendizagem.

A seguir está disponível link para entrevista sobre o tema, realizada pelas estudantes Ana Victoria Nunes, Flávia Kfuri, Franciele Rocha, Pâmela Vidio e Patrícia Rosa com o entrevistado Leonardo Secchi e participação da professora Paula Chies Schommer e do estudante Alencar Lunardello, do Programa Nas Entrelinhas.

Leonardo Secchi é professor de Administração Pública na Universidade do Estado de Santa Catarina, Udesc Esag, doutor em ciência política pela Universidade de Milão, na Itália, e pós-doutor em políticas públicas pela universidade de Wisconsin-Madison, nos Estados Unidos. Em 2018, candidatou-se a deputado estadual com a proposta de mandato compartilhado e reuniu cerca de 1240 Codeputados.

Ouça a entrevista na íntegra:

Referências

BOVENS, Mark. Public accountability. In: FERLIE, Ewan; LYNN Jr., Laurence E.; POLLITT, Christopher (eds.). The Oxford Handbook of Public Management. Oxford: Oxford UniversityPress, 2005, p. 182 – 206.

DENHARDT, Janet V.; DENHARDT, Robert B. The new public service: serving not steering. Armonk: M. E. Sharpe, 2003.

MALENA, Carmen; FORSTER, Reiner; SINGH, Janmejay. Social accountability: an introduction to the concept and emerging practice. Washington, D. C.: The World Bank, 2004, Social Devolopment Papers, Paper 76.

FONSECA,C.S.D. da. Accountability social: um instrumento de participação ativa nasociedade na vida pública. Revista de Teorias da Democracia e DireitosPolíticos. Disponível em: <http://www.indexlaw.org/index.php/revistateoriasdemocracia/ article/view/1112/pdf>

*Texto elaborado pelas acadêmicas de administração pública Ana Victoria Nunes (anavictorianunes@hotmail.com), Flávia Kfuri (flavinhakfuri@gmail.com), Franciele Rocha (francieleerocha@gmail.com),Pâmela Vidio (pamelavidio@gmail.com)e Patrícia Rosa(patricia.dasilvarosa@gmail.com),no âmbito da disciplina Sistemas de Accountability, da Udesc Esag, ministrada pela Professora Paula Chies Schommer, no segundo semestre de 2018.

Sustentabilidade na Administração Pública: como garantir a responsabilidade socioambiental entre os gestores públicos e incentivar a adesão à Agenda A3P?

Por Felipe Dutra, Lucas Jacques, Daniel Andrade, Rinaldo Marconi e Jorge Cruz*

O tema da sustentabilidade vem ganhando espaço ao longo dos anos na sociedade civil, na imprensa, na indústria e na administração pública. O avanço dos estudos e práticas referentes ao assunto possibilita aprender mais sobre a importância de se respeitar a natureza e o equilíbrio social, articulados ao desenvolvimento socioeconômico, compreendendo que os recursos são limitados e podem ser melhor aproveitados e distribuídos.

Em escala mundial, as empresas são exigidas quanto aos seus processos de produção e à promoção do consumo ecologicamente correto. A administração pública não pode ficar de lado, tanto na criação de leis de proteção e incentivo e na fiscalização de seu cumprimento, como na conscientização interna dos órgãos públicos e na promoção de melhores práticas. Entre elas, licitações verdes, programas de fomento às ações ambientalmente sustentáveis e seu monitoramento, buscando garantir a responsividade. Uma vez que a sociedade passa a valorizar o desenvolvimento sustentável, cabe também à administração pública adaptar-se e agir de forma ambientalmente responsável, contribuindo para as transformações necessárias.

Um exemplo de programa nacional que vem ganhando espaço nos órgãos públicos é a Agenda Ambiental na Administração Pública (A3P). A A3P é um programa do Ministério do Meio-Ambiente (MMA), criado em 1999 e ampliado em 2007 – ao ser integrado ao Departamento de Cidadania e Responsabilidade Socioambiental – que objetiva estimular os órgãos públicos do país a implementarem práticas de sustentabilidade, como a diminuição do gasto com energia, redução do uso de papel,  o uso de copos plásticos, entre outras ações. O órgão que adota a A3P demonstra seu compromisso em obter eficiência na atividade pública enquanto promove a preservação do meio ambiente. Fazer parte do programa é uma decisão voluntária e o mesmo pode ser implementado por qualquer órgão e instituição pública, além da possibilidade de ser usado como modelo por outros segmentos da sociedade. Ao seguir as diretrizes estabelecidas pela Agenda A3P, o órgão público protege a natureza e consegue reduzir os gastos públicos.

De acordo com a nossa entrevistada Elizete Lanzoni Alves (link para entrevista completa ao final do texto), membro da equipe de gestão ambiental do Tribunal de Justiça de Santa Catarina e especialista no tema, o TJ-SC economizou mais de 6 milhões de reais em 2 anos somente com a gestão socioambiental, segundo levantamento em 2015.  Ela destaca que essa economia é um grande incentivo para a A3P, reforçando que “a administração pública tem que agir com responsividade. Dever de dar respostas positivas à sociedade.”

Em 2017, foram assinados no país 34 Termos de Adesão ao programa, superando o ano de  2016, quando se chegou a 26. A meta anual é de 25 Termos de Adesão. Até o fim de 2017, segundo dados do MMA, tínhamos 350 órgãos federais, estaduais e municipais com o termo de adesão do programa assinados.

Com esses dados, podemos refletir sobre a quantidade de órgãos públicos existentes no Brasil e perceber que o número de adesões da A3P ainda é muito baixo. Nossa entrevistada comenta que muitos órgãos praticam algumas ações dos eixos da Agenda, mas não a adotam porque isso exige apresentar um projeto detalhado e cuidar da parte de prestação de contas dessas atividades, o que demanda dedicação dos gestores.

Muitos gestores ainda não possuem a capacitação adequada para esta temática, embora vários servidores sejam extremamente dedicados à causa. A questão cultural do país e região em que cada órgão atua, além da sua cultura organizacional, também são importantes. A ação individual é essencial para a disseminação dessas boas práticas, mas para que haja uma mudança significativa, é preciso uma mudança mais ampla.

Criar a consciência cidadã da responsabilidade socioambiental nos gestores e servidores públicos é um grande desafio para a implantação da A3P e ao mesmo tempo fundamental para o seu sucesso. Pensando assim, quais ações podem ser tomadas para incentivar os gestores a aderirem ao programa e firmarem sua participação?

De acordo com Abrucio e Loureiro (2005), a literatura sobre accountability trata do controle dos atos dos governantes em relação às leis e ao programa de governo, do combate à corrupção e à preservação de direitos fundamentais dos cidadãos. Além disso, ultimamente há mais ênfase ao aperfeiçoamento das instituições para a melhoria do desempenho dos programas governamentais e sua maior transparência e responsabilização do poder público frente à sociedade.

Uma prática que pode auxiliar na melhoria de desempenho da gestão socioambiental é a criação de mecanismos de incentivo e reconhecimento a gestores e órgãos que definam e alcancem projetos e metas ambicioso nessa área. Podem ser incentivos desde o âmbito federal, como é o caso do MMA e do Conselho Nacional de Justiça, CNJ, e no âmbito estadual ou local . A troca de informações e experiências entre gestores e especialistas de outros setores é também essencial para o aprimoramento de programas e ações.

O MMA tem várias formas de orientar os gestores, por meio de exemplos de como fazer relatórios, apresentação de cursos e materiais didáticos. O programa A3P conta com a Rede A3P, que é um canal no qual os gestores podem trocar experiências mesmo sem terem aderido formalmente ao programa. Outra forma dos gestores terem acesso a dados e relatórios, é a plataforma Ressoa, na qual são publicados os relatórios anuais das entidades que participam formalmente da Agenda.

Um meio de reconhecimento aos gestores é o Prêmio A3P, que objetiva reconhecer os projetos implementados, dar visibilidade às iniciativas e incentivar outros órgãos a aderirem à Agenda. A premiação acontece a cada dois anos e, até o ano de 2016, 68 projetos de todo o Brasil foram contemplados: iniciativas que refletem o que há de mais moderno na aliança entre tecnologia, sustentabilidade e gestão pública.

Junto com a ONU, o MMA faz um mapeamento das boas práticas na gestão socioambiental, que é uma forma de inspirar inovações e possibilitar a troca de experiências, auxiliando prefeitos, secretários e outros gestores públicos a implementar programas de sustentabilidade.

Portanto, percebemos que a administração pública possui diferentes métodos de incentivar a adoção de políticas sustentáveis dentro das suas organizações e deve continuar se aprimorando. Os gestores precisam buscar se atualizar e encontrar meios para realizar a gestão socioambiental, promovendo a economia de gastos públicos e a proteção à natureza. Isso pode contribuir para engajar mais a sociedade e as empresas, ao mesmo tempo que estas pressionam a administração pública para avançar ainda mais.

Seja por meio de incentivos, prêmios e reconhecimento, ou por meio de exigências legais, fiscalização e punição, é crucial que o país avance em sustentabilidade. Os órgãos públicos têm muito a ganhar e contribuir para isso, à medida que assumam compromissos mais ousados de gestão ambiental, prestando contas dos resultados e compartilhando aprendizagens ao longo de suas dificuldades e êxitos.

Ouça a entrevista completa sobre o tema realizada em novembro de 2018 com Elizete Lanzoni Alves, membro da equipe de gestão ambiental do Tribunal de Justiça de Santa Catarina e especialista no tema:

Referências

ABRUCIO, Fernando Luiz; LOUREIRO, Maria Rita. Finanças Públicas, Democracia e Accountability. In: BIDERMAN, Ciro; ARVATE, Paulo Roberto. (Org.). Economia do Setor Público no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Campus, 2005. pg. 75-102.

BRASIL. Ministério do Meio-Ambiente. <http://www.mma.gov.br/responsabilidade-socioambiental/a3p.html>. Acesso em: 01 de novembro de 2018.

Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Gestão Socioambiental – A3P. <https://www.tjsc.jus.br/web/gestao-socioambiental/a3p>. Acesso em 06 de novembro de 2018.

ONU. Organização das Nações Unidas. ONU e Governo Federal mapeiam boas práticas de sustentabilidade para órgãos públicos. <https://nacoesunidas.org/onu-e-governo-federal-mapeiam-boas-praticas-de-sustentabilidade-para-orgaos-publicos/>. Acesso em 24 de novembro de 2018.

 

*Texto elaborado pelos acadêmicos Felipe Dutra, Lucas Jacques, Daniel Andrade, Rinaldo Marconi e Jorge Cruz, em novembro de 2018, na disciplina Sistemas de Accountability, do curso de Administração Pública da Udesc Esag, ministrada pela professora Paula Chies Schommer.