A coprodução como alternativa para aprimorar a coleta e a gestão de resíduos sólidos

Por Rogério Simões*

O crescimento populacional e a alteração dos modos de vida ao longo do último século acarretaram o surgimento de diversos problemas nas cidades. Um desses problemas é o volume de resíduos sólidos gerado, tanto no meio doméstico, como no meio industrial e comercial. Além do volume, as características dos resíduos gerados também se alterou, e seu impacto negativo na natureza se intensificou de forma exponencial.

A preocupação com a preservação do meio ambiente também vem ganhando destaque. Conforme Hannah Arendt, filósofa alemã, “Se o mundo deve conter um espaço público, não pode ser construído apenas para uma geração e planejado somente para os que estão vivos: deve transcender a duração da vida de homens mortais”. Este pensamento pode ser relacionado à preocupação ambiental, inclusive com a geração de resíduos sólidos, pois o tempo de absorção destes pela natureza (que no caso de alguns plásticos pode superar 200 anos) e sua correta destinação final em aterros sanitários (de forma a evitar a contaminação de solo, água e ar pela decomposição destes resíduos) se torna de suma importância para a criação de um espaço público adequado para o desenvolvimento das cidades.

Estima-se que, de todo resíduo sólido gerado pelo ser humano, aproximadamente 65% são de materiais que podem ser reciclados (papel, vidro, plástico, metal) e 20% são de materiais orgânicos que podem, através de compostagem, ser transformados em energia, adubo ou mesmo na geração de gás. Mas para tanto, deve-se ter os devidos cuidados de separação e armazenamento destes resíduos, para que possam ser aproveitados nos processos de reciclagem e/ou compostagem e, consequentemente, se reduzir o volume destinado aos aterros sanitários. Isto não é possível sem a participação ativa da população neste processo. Neste ponto, pode-se fazer relação com o conceito de coprodução, segundo o qual tanto os agentes públicos como os cidadãos são responsáveis pela prestação de um serviço público, visão apresentada por Verschuere, Bandsen e Pestoff (2012).

O envolvimento do cidadão nesse processo é fundamental para que o mesmo possa funcionar e gerar bons resultados. Na área de resíduos sólidos, o cidadão não pode atuar só como mero separador do resíduo produzido em seu ambiente doméstico, mas como multiplicador de suas ações (por exemplo, na participação da compostagem de seus resíduos orgânicos, seja na forma individual ou coletiva) e como fiscalizador dentro da comunidade onde está inserido. Pode também participar como fiscalizador do resultado final de todas as diversas ramificações do processo de coleta, observando a qualidade dos resíduos que chegam para a reciclagem e a compostagem, bem como a porcentagem de resíduos que ainda seguem aos aterros sanitários. Desta forma, poderá atuar eficazmente junto a sua comunidade para que o serviço prestado ocorrera da melhor forma possível.

Esta participação do cidadão só será possível se as concepções tradicionais de planejamento e gestão de serviços públicos forem atualizadas de forma a considerar o processo de coprodução como um mecanismo de integração e um incentivo para a mobilização dos recursos humanos presentes em uma comunidade.

Modelos de incentivo da participação cidadã através da regulamentação por leis (método normativo), como a taxação dos serviços de coleta de resíduos sólidos, de forma a punir aqueles que não participam do processo corretamente (método adotado em alguns países, onde os resíduos coletados são pesados e a taxa de lixo é proporcional ao volume/tipo de lixo gerado), apesar de muitas vezes apresentarem sua eficiência, não podem ser considerados coprodução, pois vários autores que abordam o tema assinalam o elemento “voluntário” como essencial na coprodução.

Como questionamento sobre isso, podemos apontar: será que a participação do cidadão deve ser incentivada somente através de uma maior conscientização e educação da população, mostrando sua importância no processo (o que podemos chamar de método comunitário), e dessa forma se configurar como uma coprodução do bem público? Ou existem outras formas de se obter os objetivos desejados de participação dos cidadãos, mesclando métodos normativos com comunitários?

Referências
ARENDT, Hannah. A Condição Humana. 8ª ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997.


VERSCHUERE, Bram; BRANDSEN, Taco; PESTOFF, Victor. Co-production: The State of the Art in Research and the Future Agenda. Voluntas, 23(4):1083, 2012.

* Texto elaborado por Rogério Simões, no âmbito da disciplina Coprodução do Bem Público, do Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade do Estado de Santa Catarina, Udesc Esag.

O que eu vejo perto de mim é coprodução? Relação entre prefeituras e comunidades

Por Bianca dos Santos Costa*


A literatura apresenta diversas dimensões e perspectivas relacionadas ao conceito de coprodução do bem público. Em nosso cotidiano, porém, não temos o costume de enxergar certas ações pensando em coprodução, ou seja, certas situações podem passar despercebidas e não discutidas como sendo um fenômeno dessa natureza.

A coprodução é definida por Salm e Menegasso (2010) como uma estratégia para a produção dos serviços públicos por meio do compartilhamento de responsabilidades e poder entre agentes públicos, agentes privados e cidadãos.

No âmbito municipal, as prefeituras lidam com diversas demandas e usualmente seus recursos e capacidades não são suficientes para atender a todos os serviços que a comunidade necessita. Considerando essa escassez de recursos e as impossibilidades de prestar todos os serviços, bem como o imenso potencial de contribuição da comunidade, a coprodução é uma alternativa para promover políticas que incentivem o engajamento do cidadão, juntamente com servidores, na prestação dos serviços públicos, seguindo alguns critérios.

A pavimentação de ruas com a participação das comunidades é um caso interessante para ser analisado sob as lentes da coprodução. Dependendo do município, esses projetos de pavimentação podem acontecer de diferentes maneiras. Em alguns casos, as prefeituras fornecem todo o material necessário para construção, como lajotas e cimento, e a mão de obra fica a cargo dos moradores, ou seja, a prefeitura busca esse apoio da comunidade para prover a prestação do serviço.

Um dos elementos que favorece a coprodução é a transparência dos processos, visto que as pessoas conseguem perceber quais os critérios e prioridades que estão sendo aplicados, fazendo com que o envolvimento do cidadão permita essa melhora na capacidade de reposta às necessidades da comunidade.

Outro caso que ocorre em prefeituras são os convênios efetuados com organizações não-governamentais, ONGs. No serviço de creches, por exemplo, as prefeituras podem fazer parcerias com ONGs que prestam o serviço a crianças e famílias, compartilhando recursos, conhecimentos e responsabilidade ao prestar esse serviço.

Porém, quando a relação entre uma prefeitura e uma ONG se resume ao repasse de recursos, muitas vezes insuficientes e instáveis, ocorre a dúvida se seria realmente coprodução ou se representaria apenas um tipo de terceirização precária. O simples fato de haver o envolvimento de um grupo na prestação do serviço pode não ser coprodução. Para isso, é preciso apresentar determinadas características que efetivamente considerem a participação de ambos os envolvidos – cidadãos/usuários e profissionais/servidores públicos – no planejamento e/ou na execução, representando mais do que o simples repasse de recursos para a prestação de um serviço por um valor menor do que seria necessário.

Acredito que tanto os projetos de pavimentação como as parcerias com ONGs podem ser representados como possibilidades de coprodução, pois conforme afirma Ostrom (1999), a coprodução representa a combinação de atividades em que tanto os agentes de serviço público como os cidadãos contribuem para a provisão dos serviços públicos. Porém, cada caso precisa ser analisado em detalhes, pois a simples transferência de recursos e responsabilidades não satisfaz essa definição, sendo necessária a observação de vários outros critérios, como a oportunidade de efetiva participação dos cidadãos, a contribuição para a qualidade nos serviços prestados e a redução dos custos, por meio de inovações em processos e compartilhamento de responsabilidades.


Referências

OSTROM, Elinor. (1999). Crossing the great divide: coproduction, synergy and development. World Development, Vol. 24, No. 6, pp. 1073-1087.1996.

SALM, José Francisco; MENEGASSO, Maria Ester. Proposta de modelos para a coprodução do bem público a partir das tipologias de participação. XXXIV Encontro Científico de Administração da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração – ANPAD. Rio de Janeiro: ANPAD, Anais, CD-ROM.



* Texto elaborado por Bianca dos Santos Costa, aluna do mestrado profissional em administração, no âmbito da disciplina Coprodução do Bem Público, no Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade do Estado de Santa Catarina, Udesc Esag.

Burocracia e coprodução do controle em debate durante encontro entre pesquisadores do Politeia e auditores da Secretaria da Fazenda

Grupo de pesquisa da Udesc promove evento sobre coprodução na administração pública


Representantes da Secretaria Estadual da Fazenda (Sefaz/SC), pós-graduandos e professores da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc) participaram na tarde desta quinta-feira, 20, de um evento sobre coprodução na administração pública, realizado no Centro de Ciências da Administração e Socioeconômicas (Esag), em Florianópolis.

Com o tema “A Burocracia e o desafio da coprodução na Administração Pública: limites e possibilidades”, o encontro foi promovido pelo Mestrado Profissional em Administração da Udesc Esag, por meio das disciplinas de Análise Organizacional e Gestão do Conhecimento, e pelo grupo de pesquisa Politeia – Coprodução do Bem Público: Accountability e Gestão, em parceria com a Diretoria de Auditoria da Sefaz/SC.

A programação incluiu uma série de apresentações, no Auditório do centro de ensino, seguido de debates em grupos em salas de aula.



Projeto Auditoria Cidadã

Um dos objetivos do encontro foi identificar limites e possibilidades associados à consolidação do Projeto Auditoria Cidadã, realizado pela Sefaz/SC, a partir de uma experiência de interação entre os participantes: servidores do órgão estadual, pesquisadores, docentes e alunos do Mestrado Profissional e do Doutorado em Administração da Udesc Esag.

No evento, o Auditoria Cidadã foi apresentado pelo diretor de Auditoria da Sefaz/SC, Augusto Piazza, que falou sobre ações como a inspeção de merendas escolares e dos hospitais públicos do Estado. Ele destacou na ocasião a relevância do encontro para a consolidação do projeto.

Pelo Politeia, a professora Micheline Gaia Hoffmann falou sobre as características e os impactos da burocracia; e os docentes Paula Chies Schommer e Arlindo Carvalho Rocha, junto com os mestrandos Clóvis Renato Squio e Thaís Serpa, também integrantes do Politeia, apresentaram conceitos e casos da coprodução do controle.


Após as apresentações, ocorreram quatro mesas de trabalho simultâneas, em salas de aula, abordando o tema sobre diferentes pontos de vista: do servidor auditor; do usuário cidadão; do gestor auditado; e do gestor institucional.

O evento foi concluído com a apresentação dos resultados dos debates pelos relatores dos grupos.




Assessoria de Comunicação da Udesc Esag
E-mail: comunica.esag@udesc.br

Telefone: (48) 3664-8281 

Fotos: Ana Prieto e Gustavo Vaz/Ascom

Mais detalhes e imagens em: http://www.esag.udesc.br/?idNoticia=17838

Datapedia: dados de todos os municípios brasileiros compartilhados e transformados em informação, a serviço da cidadania

Foi lançada neste mês de abril a Plataforma Datapedia – www.datapedia.info, reunindo dados públicos e oficiais de todos os municípios brasileiros.

“Hoje já são mais de 10 bilhões de dados presentes – e continuamos a ampliar as bases.

(…)
Entendemos que a realidade é sempre mais complexa que os números podem mostrar. Atrás de percentuais e números existem pessoas, histórias, alegrias e dores. E conhecer os dados e evidências de sua cidade é um dos primeiros passos para que cidadãos, empresários e políticos possam fazer melhores perguntas, melhores decisões, melhores ações para construir o Brasil que queremos.
A Datapedia tem visualização gratuita para todas as 5570 localidades, aumentando a transparência da gestão pública, e fornece serviço de assinatura para quem deseja construir análises comparativas ou construir seu próprio Dashboard, serviços de relatórios analíticos e oficinas de capacitação para planejamento e gestão a partir de evidências.
Estamos a serviço,
Equipe Datapedia”

MANIFESTO


ACESSO À INFORMAÇÃO CONTEXTUALIZADA GERA MAIOR AUTONOMIA AO CIDADÃO. AS PREMISSAS UTILIZADAS NAS ANÁLISES DEVEM SEMPRE SER EXPLÍCITAS. AS INFORMAÇÕES E ANÁLISES DEVEM SER APRESENTADAS DE FORMA AMIGÁVEL, INTELIGÍVEL E CONSISTENTE. A SOCIEDADE SE TORNA MAIS CIVILIZADA QUANTO MAIS VISÍVEIS FOREM AS PESSOAS E MAIS TANGÍVEIS FOREM OS RESULTADOS. TRANSPARÊNCIA É MANDATÓRIA PARA NOSSA ATUAÇÃO. NOSSAS FONTES SÃO SEMPRE EXPLICITADAS EM NOSSO SITE.

Práticas de coprodução em saneamento básico


Por André Souza Noronha Nepomuceno, Raphael Ewaldo de Souza e Vitor Bruno*

Muito se fala sobre a importância do saneamento para a qualidade de vida de uma sociedade. De acordo com dados do Instituto Trata Brasil/CEBDS (2014), a falta de saneamento básico é um transtorno em vários locais do Brasil e está relacionada diretamente com o aumento de doenças. Se toda a população brasileira tivesse acesso à coleta e tratamento de esgoto, estima-se que haveria uma redução, em termos absolutos, de mais de 70 mil internações por ano, associadas a infecções gastrintestinais; sendo que, dessa redução, mais da metade seria na região Nordeste. A restrição de água potável, o acúmulo de lixo e a destinação prematura dos efluentes líquidos favorecem o surgimento e o desenvolvimento de vetores e agentes que podem ocasionar doenças, como por exemplo, diarreia, verminoses, cólera, leptospirose e hepatite.
Saneamento é o conjunto de medidas que tem como objetivo resguardar ou mudar a situação ambiental com o interesse de reduzir ou eliminar doenças, promovendo saúde e melhoria na qualidade de vida da população. Em nosso país, o saneamento básico é um direito garantido pela Constituição Federal, definido pela Lei nº.11.445/2007 como o conjunto dos serviços de: abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana, drenagem urbana, manejos de resíduos sólidos e de águas pluviais. Mesmo compreendendo que o conceito de saneamento abrange os serviços supracitados, o senso comum entende que o mesmo se resume ao acesso à água potável e à coleta e tratamento de esgoto (Instituto Trata Brasil, 2014).
Praticamente 17% da população mundial, em especial pessoas dos países em desenvolvimento, não possui acesso à quantidade mínima de água potável estabelecida pelas organizações competentes, cerca de 5 litros de água por dia; e 45% dos países do chamado terceiro mundo não possui acesso ao saneamento básico (ABES, 2016). No Brasil, a condição geral do saneamento, tanto no campo quanto nas cidades, continua ruim para as populações de baixa renda, apesar da evolução nos últimos 40 anos. Referente à participação da sociedade civil organizada, há uma garantia da participação de usuários e da sociedade civil em todos os plenários formalmente constituídos, desde o Conselho Nacional de Recursos Hídricos até os Comitês de Bacia Hidrográfica. Essa é uma forma de dar legitimidade às decisões e também uma maneira de ampliar as chances de implantação das decisões tomadas (Porto e Porto, 2008).
Neste texto, buscamos comparar distintas experiências associadas ao saneamento básico no Brasil, visando compreender se e de que maneira a coprodução de bens e serviços públicos ocorre nesta área, identificando pontos de convergência entre os casos analisados; sendo a coprodução entendida conforme a definição sugerida por Ostrom (1996), como o processo em que pessoas de diferentes organizações destinam esforços para a produção de bens e serviços que geram benefícios para o coletivo.

Os Comitês de Bacias Hidrográficas
         Os comitês de Bacias Hidrográficas (CBHs) são organismos colegiados, integrantes do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos e começaram ser constituídos no Brasil a partir de 1988. A diversidade de atores que compõem os Comitês estabelece uma visão  democrática, que compreende diferentes perspectivas sobre os assuntos abordados, contribuindo para a representatividade da sociedade nas decisões relacionados à bacia hidrográfica. Os membros do colegiado são escolhidos entre si, quer sejam eles dos setores usuários de água, da sociedade civil organizada ou entidades do governo. Suas principais responsabilidades são: aprovar o Plano de Recursos Hídricos da Bacia; arbitrar conflitos pelo uso da água, em primeira instância; criar mecanismos e sugerir valores da cobrança pelo uso da água, além de implantar políticas de gestão ambiental no âmbito da bacia hidrográfica, como por exemplo, o Plano de Bacia.
Essencialmente, um comitê de bacia trabalha em sistema de redes e em coprodução. No âmbito de redes, sua própria estrutura favorece esse conceito, agregando diversos atores da sociedade em prol da gestão ambiental, do uso sustentável dos recursos hídricos e da sustentabilidade econômica. São agentes da sociedade civil, governos, indústrias e usuários de água que podem participar do comitê, fazendo parte da atividades e dando voz a diversos setores, tais como abastecimento público, energia, agricultura, pecuária e industrial.
O Plano define os usos dos recursos hídricos dentro de determinada bacia, operando como um plano diretor da água. A outorga do direito de uso da água depende, essencialmente, de um plano individual para cada bacia, considerando suas peculiaridades econômicas, geográficas e sociais. Na prática, baseado nas características físicas e econômicas da bacia, são definidos os principais usos com o intuito de preservar o recurso natural, priorizando atividades consideradas mais importantes e que mais demandam os recursos. Os Comitês foram oficializados pela Lei nº 9.433, de 8 de janeiro de 1997.
Existem diferentes exemplos da ocorrência de coprodução associados aos Comitês de Bacia. A própria definição das políticas ambientais compreende o envolvimento de diferentes atores, tanto no processo de elaboração das políticas como na implantação, em maior ou menor grau. Programas de pagamentos por serviços ambientais – PSA -, muito em evidência nos últimos anos, são essencialmente mecanismos de coprodução, uma vez que sua implementação e eficácia dependem da participação de proprietários rurais e de outros agentes usuários de água. Outros projetos podem se beneficiar da coprodução, por exemplo, a educação ambiental através de multiplicadores, que podem ser estudantes, associações de moradores e escolas.

Coprodução em casos de saneamento
            No Brasil, é possível observar em diferentes contextos e situações, arranjos de comunidades, organizações e governos atuando em conjunto para a concepção, desenvolvimento e execução de políticas e serviços públicos na área de saneamento. Destacamos três casos que trazem consigo distintos contextos e arranjos de atores. Um, envolvendo a provisão de um direito básico – água – em uma região totalmente escassa deste bem; outro, atuando na conservação de mananciais visando a manutenção da provisão deste recurso natural; e, por último, uma situação em que o planejamento e a execução do sistema de esgotamento de um condomínio foram realizados por meio de um arranjo típico de coprodução de bens e serviços públicos, por envolver governo, usuários e diferentes atores da sociedade no planejamento, desenvolvimento e manutenção do sistema.
         
          Consórcio Iberê

Figura 1: Logomarca do Consórcio IBERÊ
Fonte: website da iniciativa     

            O Consórcio Iberê surgiu de uma iniciativa da sociedade civil com o intuito de aplicar uma gestão por bacias hidrográficas no oeste de Santa Catarina. O objetivo do Consórcio é aplicar um gerenciamento ambiental e social integrando municípios pertencentes a uma mesma bacia. Em qualquer bacia, os impactos das ações se refletem em toda a sua extensão, principalmente em se tratando de recursos hídricos. É inócuo tratar essa questão isoladamente por municípios. Nesse caso, são sete os municípios integrantes e cada prefeitura disponibiliza um técnico como coordenador municipal do Consórcio, além da presença da sociedade civil e outras organizações. O presidente do Consórcio é sempre um prefeito de um dos municípios.
           Desde sua fundação, em 1999, o Consórcio Iberê já desenvolveu diversos projetos na área ambiental. O Projeto de Preservação, Conservação, Recuperação e Manutenção das Matas Ciliares é um caso de sucesso quanto à governança em rede e o modelo de coprodução. Os resultados mostram que quando há governança, participação e a sociedade civil é acionada para a solução de problemas, o resultado é imediato.
A coprodução acontece, por exemplo, com a participação de proprietários rurais que contribuem com seu trabalho na recuperação da mata ciliar existente em suas propriedades. Além disso, eles são multiplicadores de ideias; identificam, sensibilizam e trazem novos produtores para o projeto. Esse projeto conta com a participação financeira da Companhia Catarinense de Águas e Saneamento (CASAN) para: obtenção de materiais de isolamento das áreas a serem recuperadas; pagamento de pessoal (no caso, dois técnicos contratados pelo consórcio); material de divulgação e promoção de eventos educacionais e; compras de equipamentos, como computadores e material de expediente.

          ASA – P1MC


Figura 2: Logomarca da iniciativa ASA
Fonte: website do programa ASA
O programa desenvolvido pela Articulação Semiárido Brasileiro – ASA – no início dos anos 2000, visa a atender uma necessidade básica da população que vive na região: água para beber. Muito mais do que apenas água, suprir esta necessidade básica reflete diretamente no desenvolvimento de toda uma comunidade. Neste caso, por exemplo, possibilitou inúmeros avanços como: aumento da frequência escolar; diminuição de doenças e diminuição da sobrecarga de trabalho das mulheres, que antes precisavam caminhar quilômetros para obter um balde de água.

Figura 3: Cisterna do P1MC
Fonte: website do programa ASA

Como coloca o atual site do Programa, a experiência do Programa 1 Milhão de Cisternas – P1MC – demonstra um novo caminho para a construção de políticas públicas; um movimento que nasce com a mobilização da sociedade civil para propor uma política efetiva para o contexto onde vivem, e que se transforma em uma política de governo obtendo recursos previstos no Orçamento Geral da União.
A coprodução se dá, desde sua origem, por meio da tomada de decisão “de baixo para cima”, como mostra o vídeo-case do Programa, pois as comunidades decidem o município, doravante a localidade e, por último, a família que será beneficiada; há todo um consenso em planejar sistematicamente a implantação das cisternas para suprir o fornecimento para o maior número possível de famílias – uma vez que as famílias compartilham da mesma cisterna até que cada uma tenha a sua.
Da meta original, que corresponde a um milhão de cisternas instaladas, já foram implementadas 588 mil cisternas rurais  – até o final de 2016.

Esgotamento condominial em Recife

         Uma experiência brasileira emblemática foi analisada por Ostrom (1996), em artigo no qual a autora aborda dois casos para explorar a conceituação de coprodução, fazendo um paralelo entre  seus pontos-chave. Destacamos o caso que se desenrolou em Recife/PE, no nordeste do Brasil. Um engenheiro chamado José Carlos de Melo, junto a um grupo de cidadãos, desenvolveu um sistema condominial inovador de esgotamento, no qual pequenas adaptações em relação a projetos tradicionais fizeram com que cada unidade predial definisse seu modelo, tendo impacto no custo inicial de implementação e os custos contínuos de manutenção. Um exemplo foi a instalação das tubulações por baixo das calçadas ao invés das tradicionais tubulações que são enterradas por baixo das vias rodoviárias. Nessa etapa, o custo foi equivalente à ¼ do custo tradicional.    
 Esgotamento condominial
Figura 4: Ilustração condominial
Fonte: Google Images – busca livre
A coprodução ocorre no sistema condominial por envolver, além de especialistas na área, os residentes, desde o planejamento do layout, a manutenção e a negociação de custos. Isto promove uma cidadania ativa. Uma parte fundamental deste programa é a ativação dos cidadãos locais a participar desde o início, no planejamento dos seus próprios sistemas condominiais.
Os moradores se envolveram diretamente no planejamento, na instalação e na manutenção, e o sistema, por sua vez, foi ligado à rede de coleta do município. Fazer esse tipo de sistema funcionar de forma eficaz a longo prazo requer mudança na atitude e rotinas operacionais dos órgãos públicos, uma vez que exige a contribuição dos condôminos em todas as fases do projeto.
Embora os resultados sejam impressionantes para incentivar a coprodução em outras partes do mundo, o caso do sistema condominial demonstra três difíceis desafios: (i) a organização dos cidadãos e o engajamento futuro na realização das ações que envolvem o coletivo; (ii) o bom trabalho em equipe dentro de um órgão público; e (iii) uma coordenação eficaz entre os cidadãos e uma agência.

Implicações da coprodução no desenvolvimento de serviços públicos
Os casos apresentados mostram diversas possibilidades e bons resultados na coprodução de serviços públicos. Tanto no caso do Consórcio Iberê quanto no caso da Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA), os resultados se mostram expressivos e crescentes ao longo do tempo. Vale uma nota, em ambos a iniciativa partiu da sociedade civil e os governos entraram como agentes de apoio. Isso mostra a força que a coprodução tem de colaborar para que o Estado garanta acesso e assistência a toda a população. A dinâmica da sociedade civil se mostrou, nesses dois casos, mais eficaz que a centralização estatal.
Embora o campo pareça promissor para a coprodução e a gestão em rede, é inegável que há dificuldades para seu desenvolvimento de forma ampla no setor de saneamento. Questões culturais, econômicas, burocráticas e até mesmo um entendimento mais aberto por parte de nossos administradores ainda limitam as possibilidades.
           Não é arriscado dizer que as redes são uma tendência, quase inevitável, em certos setores da economia. A própria inabilidade do Estado em alguns setores, o gigantismo que o obriga a realizar cortes, além do potencial da cidadania, a dinâmica do mercado e a competitividade acabam criando um ambiente em que o Estado não pode fugir dessa nova ordem. Cabe então à sociedade encontrar novos caminhos e mostrar que é possível, adotando um papel ativo no serviço público, somando esforços às instituições e evoluindo o modelo de democracia e coprodução do bem público, transformando os modelos vigentes, entendidos como ultrapassados, na direção de novos modelos que atendam aos anseios da sociedade.
REFERÊNCIAS
ABES – Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental. A importância do saneamento no contexto mundial. São Paulo. 10 ago. 2010.  44 slides. Apresentação em Power-point. Disponível em: <http://www.fenasan.com.br/arquivos/apresentacoes10/1008_15h30_dante.pdf>. Acesso em: 12 dez. 2016Instituto Trata Brasil. Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável. Benefícios Econômicos da Expansão do Saneamento Brasileiro. São Paulo: Instituto Trata Brasil/CEBDS; 2014. Disponível em: <http://www.tratabrasil.org.br/datafiles/uploads/estudos/expansao/BOOK-Benef%C3%ADcios%20-logos.pdf>. Acesso em: 10 dez. 2016.

PORTO, M. F. A.; PORTO, R.L.L.. Gestão de bacias hidrográficas. Estud. av.,  São Paulo, v. 22, n. 63, p. 43-60, 2008. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142008000200004&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 08 dez. 2016
OSTROM, Elinor. Crossing the great divide: coproduction, synergy, and development. World Development. v.24, n.6, p.1073-1087, 1996
LINKS
http://www.tratabrasil.org.br/
http://www.ibere.org.br/

http://www.asabrasil.org.br/acoes/p1mc

* Texto elaborado por André Souza Noronha Nepomuceno, Raphael Ewaldo de Souza e Vitor Bruno, no contexto da disciplina Governança e Redes de Coprodução, do Mestrado Profissional em Administração da Universidade do Estado de Santa Catarina, Udesc Esag.

Paraísos fiscais, offshores e o mercado imobiliário de São Paulo é tema de evento no dia 10 de Abril

Inscrições para o evento via link: http://quemmoraaolado.org/inscricoes/

Transmissão online Ao Vivo: 

Parte1 – 9h às 12:30h: https://www.youtube.com/watch?v=ltD78B9KLZ8
Parte2- 14:30h às 16h: https://www.youtube.com/watch?v=zPeGiuXN30M
Para saber mais:
Reportagem sobre cidades nos Estados Unidos mostra como os imóveis vem sendo utilizados como lavagem de dinheiro e como isso influencia a configuração das cidades: http://www.washingtonexaminer.com/money-laundering-is-shaping-us-cities/article/2618135

UOL Notícias: Empresas ligadas a paraísos fiscais têm mais de R$ 8 bi em imóveis em São Paulo

Semana Sinais Vitais: Debate e Seminário na UDESC discutem o tema Criança e Adolescente

Na semana do aniversário de Florianópolis, teremos a Semana de Lançamento do Relatório Sinais Vitais 2016 com foco em criança e adolescente, produzido pelo Instituto Comunitário Grande Florianópolis, ICom. Para apresentar e discutir os dados, a Udesc recebe dois eventos.
O primeiro será realizado na terça-feira (21), das 10h às 12h, no Plenarinho da UDESC, e irá discutir as políticas públicas para primeira infância e seus desafios nos casos brasileiros e de Santa Catarina, buscando um diálogo com lideranças políticas do estado, membros da RAPS e outros interessados. O evento está sendo organizado pela Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (RAPS) e o ICOM, em parceria com o grupo Politeia e o Observatório Floripa Cidadã, da Udesc/Esag, o Movimento Nacional ODS Nós Podemos Santa Catarina e outras organizações.
Continuando a conversa, na quarta-feira (22), das 8h30 às 12h, no auditório da ESAG, os resultados dos Sinais Vitais serão apresentados mais detalhadamente por especialistas envolvidos na co-construção do relatório e discutidos com gestores do Sistema de Garantias de Direitos da Criança e do Adolescente de Florianópolis, membros da comunidade acadêmica e demais interessados. O evento está sendo promovido em parceria pelo ICOM e o Núcleo de Pesquisa e Extensão em Inovações Sociais na Esfera Pública (NISP) e o Laboratório de Educação para a Sustentabilidade (LEDS), da Udesc Esag.


Os participantes dos dois encontros receberão uma edição do relatório.

Além dos eventos na Udesc, a Semana de Lançamento do Sinais Vitais Criança e Adolescente 2016 conta com outros dois eventos: na segunda, 20, às 19h, ocorre o lançamento oficial na Assembleia Legislativa de SC (Alesc); e, na quinta, 23, das 9h às 16h, a Praça Getúlio Vargas, no Centro da Capital, receberá oficinas para crianças, adolescentes e seus familiares.

Todos os eventos são abertos ao público, com inscrições pelo link https://docs.google.com/forms/d/e/1FAIpQLScFwwDFRBxZIkWuaKZO6czlmdyLOZTDI54GI2EG-Nf_IuxtBA/viewform?c=0&amp;w=1.


Em março do ano passado, também na semana de aniversário de Florianópolis, a Udesc sediou o lançamento da primeira edição do Relatório Sinais Vitais, que traçou um panorama da cidade a partir de diferentes indicadores.


Mais detalhes no Portal ESAG:  http://www.esag.udesc.br/?idNoticia=17597 – Udesc recebe esta semana dois eventos sobre situação da criança e do adolescente em Florianópolis