Quase todos os municípios terminaram suas eleições no domingo. Outros 55 ainda terão o segundo turno no final de outubro. De todo modo, a vida política local não acaba com a escolha do prefeito e dos vereadores. Na verdade, ela começa com essa decisão do eleitor, que só vai ser plenamente cidadão caso continue participando do processo político de sua cidade.
O município pode ser o espaço onde o cidadão tem mais condições de participar e influenciar as decisões coletivas. Porém, trata-se de uma possibilidade e não algo líquido e certo.
Na história brasileira, a defesa do municipalismo foi muitas vezes atrapalhada pelo mandonismo local e suas facetas.
Uma delas é a dos coronéis locais, que exerciam o poder pela mistura da força e da “doçura” das prebendas, dominando as prefeituras de forma direta ou por meio dos familiares.
A outra é a do clientelismo desbragado nas Câmaras Municipais, cujos vereadores buscam distribuir favores ao seu curral eleitoral, como vagas em creches ou cadeiras de rodas, quando o Legislativo deveria servir para garantir os direitos de cidadania igualmente a todos.
Mas algumas coisas mudaram nos municípios desde a Constituição de 1988. A conquista de maior autonomia e a descentralização federativa tornaram os governos locais mais importantes para os cidadãos.
Também foram ampliados os grupos da sociedade civil que se organizam para lutar por questões locais, como construção de casas populares, serviços de saúde, mobilidade urbana etc.
Por fim, nos últimos anos aumentaram as possibilidades de participação política no plano municipal. Conselhos de políticas públicas, orçamentos participativos, criação de ouvidorias, entre outros, permitiram uma maior abertura do poder público à atuação da população para além das eleições.
Vive-se hoje, no Brasil, uma combinação de estruturas arcaicas e modernas de governança local. Isso aparece na eleição a vereador, por exemplo.
A lista dos parlamentares escolhidos para o Legislativo das grandes cidades mostra claramente a existência de políticos ligados a causas e/ou métodos novos de se fazer política convivendo com aqueles eleitos pelo modus operandi clientelista.
E se cada em sua cidade fizer a conta direitinho, verá que a maioria ainda pende para o modelo tradicional.
Mesmo assim, é possível ativar mais as formas democratizadoras presentes no plano municipal. Um bom ponto de partida é atuar, prioritariamente de maneira coletiva, junto às Câmaras Municipais, acompanhando a tramitação de projetos e as audiências públicas, além de levar os vereadores para discutir com a sociedade fora da redoma do Legislativo.
Outro instrumento é a cobrança por mais transparência dos governos locais, exigindo o cumprimento da Lei de Acesso à informação e demandando mais serviços públicos que possam ser ofertados por meio da tecnologia da informação.
A descentralização no plano municipal, especialmente nas grandes metrópoles, é mais uma ferramenta democratizadora ainda pouco utilizada.
É fundamental dar centralidade às estruturas institucionais distritais, fornecendo-lhes recursos, pessoal qualificado e arenas de deliberação próprias.
Pensar a política para além das eleições no plano local passa, finalmente, por nos sentirmos mais citadinos, donos e responsáveis por nossas cidades.
Isso não só aumentará o uso dos instrumentos democráticos presentes na esfera municipal, como também poderá reduzir o vergonhoso contingente de eleitores que não quiseram votar no último domingo.