Coprodução para cuidado e proteção dos animais em Florianópolis: o caso do Instituto É o Bicho

Por Maria Clara Ames*

Uma questão de interesse público que vem ganhando evidência em Florianópolis e várias outras cidades é a proteção e cuidado com animais, especialmente pelo número de animais domésticos que hoje fazem parte da vida das pessoas. Soltos nas ruas brasileiras, estima-se que haja em torno de 30 milhões de animais. Até pouco tempo, esses eram recolhidos e sacrificados. Atualmente, o município de Florianópolis mantém canis e gatil para os animais abandonados. Cuidado este que partiu do protagonismo da comunidade da cidade.

Em setembro de 2002 foi lançado o site eobicho.org, com a finalidade de ser um canal para a adoção de animais resgatados das ruas ou situações de maus-tratos, por um primeiro grupo de protetores. A iniciativa “É o Bicho!” foi pioneira na cidade e se tornou um importante e eficaz meio de encaminhamento dos animais para novos lares. Em 26 de setembro de 2003, foi criado oficialmente a Organização Não Governamental de Proteção Animal e Educação Ambiental, dirigida por Mauricio Varallo, chamada “Instituto É oBicho!”.

Fonte: Instituto É o Bicho

Atualmente, Florianópolis conta com este e alguns outros institutos que se dedicam à proteção de animais. Entre eles, o É o Bicho atua em parceria com a administração pública para cuidar de cães e gatos e garantir sua proteção e redução de sofrimento. Além de intermediar voluntários que abrigam os animais e que podem vir a adotá-los, e orientar sobre como fazer denúncias de maus tratos, a organização repassa alimentos e cuida da saúde dos animais, em colaboração com o Centro de Controle de Zoonoses (CCZ), uma das diretorias da Secretaria Municipal de Saúde (conforme CCZ). No âmbito da Prefeitura, também atua  a Diretoria do Bem-Estar Animal, Dibea, responsável pelo recolhimento e acolhimento de animais, cuidados veterinários (clínico, cirúrgico, atendimento domiciliar), atendimento a denúncias de maus tratos e castração.

Alice Castro, professora de Administração da Udesc Esag, foi uma das pessoas que adotaram um cãozinho. Além de relatar de forma geral como o Instituto e o centro de zoonoses coproduzem, Alice conta que, após a adoção, seus colaboradores têm todo um cuidado e acompanhamento para saber se o cão está sendo bem cuidado e tratado. Até mesmo por redes sociais, às vezes um contato informal é o suficiente para saber que está tudo bem com ele, afirma Alice.

O Instituto É o Bicho atua, ainda, no combate ao uso de animais como comércio ou para entretenimento, rodeios, farra do boi, animais em circo, vivissecção e qualquer ação que implique em desconforto, maus tratos e violação dos seus direitos. Realiza trabalhos educativos e de conscientização em escolas e outros espaços, atua ativamente no resgate de animais e participa de discussões legais que possam contribuir para protegê-los. Ainda, divulga o vegetarianismo como prática necessária para vivermos em harmonia com os animais e repudiam qualquer atividade baseada na exploração e sofrimento destes. Um termo com o qual define a condição dos animais é como seres sencientes. A senciência é a capacidade se sentir, de ter experiências que afetam o ser positiva ou negativamente.

Os cidadãos podem colaborar de várias maneiras nessa questão pública. Podem se candidatar para adoção, podem optar pelo voluntariado em campanhas ou podem, ainda, apadrinhar um animal, contribuindo com recursos para que ele seja cuidado. Outras formas de doação abrangem contribuições únicas ou mensais, para cobrir despesas de kits de serviços ou procedimentos médicos, tais como vacinas, exames e castração.

Segundo o Instituto, quando um bicho é resgatado, ele precisa de vários cuidados para começar sua nova vida. Além de alimento, segurança e conforto, todos os animais protegidos são doados somente depois de recuperados, vermifugados, vacinados e castrados. O objetivo é doar 100% dos animais já castrados, sendo a única forma de se garantir um trabalho eficiente.

O Instituto não trabalha com abrigo e para isso conta com o acolhimento dos animas na casa de um protetor, ou em lares temporários voluntários ou, quando não se tem vagas, em hospedagens pagas mensalmente.

Em 2014, foi composto o Conselho Municipal de Proteção Animal de Florianópolis. A Lei complementar 489/2014, de 20 de março de 2014, dispõe sobre a criação desse Conselho, composto por membros do poder público e da sociedade. Há um representante de cada uma das seguintes Secretarias: da Saúde, da Educação, do Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano, da Guarda Municipal de Florianópolis, e um representante do Ministério Público Estadual (Grupo de Defesa dos Direitos dos Animais). Além de cinco representantes de ONGs de proteção animal diferentes. Inicialmente, ficou decidido pela participação das Ongs: Instituto É o Bicho, Protetores e Amigos Trabalhando pelos Animais (PATA), OBA Floripa – Organização Bem Animal, Associação Catarinense de Proteção aos Animais (ACAPRA) e R3 Animal.

Entre outras prerrogativas, essa lei torna obrigatória a castração de todos os bichos protegidos pelos Institutos, antes da adoção, baseados no princípio de proteção consciente.

O Instituto É o Bicho considera a castração como um cuidado imprescindível, porque além de proteger a saúde, protege futuros descendentes de experimentar o sofrimento e o abandono, ajudando no controle da superpopulação de cães e gatos. Os gatos selvagens, que são devolvidos à rua quando terminam o pós-operatório, recebem um pic na orelha esquerda e, assim podem ser identificados como já castrados, caso sejam recolhidos em outro momento.

Segundo dados da Dibea, da prefeitura de Florianópolis, em fevereiro de 2017, havia mais de 100 animais à disposição para adoção. Além do Dibea e do Conselho Municipal de Proteção Animal, um indicativo recente da repercussão do problema foi a notícia de um projeto de lei que discute a proteção dos animais como seres sencientes, encaminhado à Assembleia Legislativa do Estado (Projeto Lei 160/2017).

Considerando que o abandono de animais é um problema que deve ser resolvido em conjunto com a comunidade, a Diretoria fez um apelo para somar os esforços e engajar o maior número possível de pessoas ao projeto, surgindo assim o corpo de voluntários que, embasados pela Lei 9.608/98, dão suporte à Diretoria de Bem-Estar Animal, atuando nas comunidades carentes e no Canil Municipal. Hoje, o número de voluntários chega a 400, atuando diariamente em parceria com a Dibea.

Com essa rede de atores, mais os passos legais e instituições que começam a se fortalecer, percebe-se o encontro de diferentes formas de se abordar o problema. Do ponto de vista da administração do município, interessa um controle populacional dos cães e gatos que vivem nas ruas. O Instituto É o Bicho e outros citados inserem-se como atores preocupados com a proteção e cuidado da vida desses animais. A comunidade em geral doa seu tempo, cuidado e recursos, que se somam aos demais esforços e contribuem ativamente para a redução do número de animais que sofrem por maus tratos ou estão abandonados.

Dito de outra forma, as iniciativas motivadas inicialmente por problemas distintos – população de animas nas ruas e proteção e cuidado para com os animais, convergem em uma solução quando os esforços coletivos se encontram, demonstrando a importância da participação conjunta de servidores públicos e cidadãos. Estes, ao mesmo tempo que buscam garantir o cuidado e a saúde dos animais, contribuem para a redução de animais soltos nas ruas, ao acolhê-los em suas casas.

* Texto elaborado por Maria Clara Ames, doutoranda em administração, no âmbito da disciplina Coprodução do Bem Público, do Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade do Estado de Santa Catarina, Udesc Esag.

Informação, tecnologia e cidadania no combate à corrupção: o exemplo da Operação Serenata de Amor

Por Bianca dos Santos Costa*

Fonte: https://www.catarse.me/serenata
Nos últimos meses, temos vivenciado em nosso país uma série de escândalos de corrupção envolvendo autoridades públicas em conluio com particulares. Como reflexo disso, observa-se a crise política e econômica em que o Brasil se encontra. A corrupção, que vem assolando nossa nação em grandes proporções, não está sendo mais digerida pela sociedade, que quer mais do que nunca uma resposta eficiente das autoridades responsáveis, seja fiscalizando as atividades para que se evite esse tipo de prática indesejável, ou pela aplicação da justiça àqueles que as tenham cometido.
A sociedade vem se mobilizando nesse sentido, cobrando das autoridades competentes e também investindo seus próprios conhecimentos e recursos, inclusive por meio de iniciativas de crowdfunding (financiamento coletivo). Os cidadãos buscam, assim, contribuir para qualificar e para preencher as lacunas de fiscalização de gastos do governo. 
Um exemplo disso é a “Operação Serenata de Amor”, projeto inspirado em experiências de outros países que tem como objetivo o combate à corrupção através do monitoramento dos gastos públicos dos Deputados do Legislativo Federal. O foco é a fiscalização dos gastos da Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar, CEAP, composta por uma verba indenizatória mensal para cada deputado utilizar no exercício de suas atividades, além do salário e diversos benefícios. Conforme divulgado pelo Data Science Brigade (2017), para este projeto foi criado um robô de inteligência artificial capaz de analisar cada pedido de reembolso dos deputados, identificando a probabilidade de detectar ilegalidades.
Segundo Felipe Cabral, proponente do projeto na plataforma Catarse, o valor da CEAP equivale a mais de 45 mil reais por mês, que o deputado pode usar para custear despesas pessoais para auxiliar o seu trabalho. Esse valor é liberado por lei e fica disponível para ser usado pelo parlamentar em seu gabinete com materiais ou serviços que não precisam necessariamente de licitação para sua aquisição.
Considerando o total de 513 deputados que a Câmara possui, esse gasto por ano ultrapassou, em 2015, os 200 milhões de reais (CABRAL, 2017).
A realização de um projeto como o Serenata de Amor não representa uma tarefa simples, mas conta com a vantagem de garantia da publicidade de todos esses dados na internet, mediante a obrigatoriedade de publicação advinda de algumas leis. Entre elas, está a Lei Complementar nº 131/2009, que tem como finalidade determinar a disponibilização, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Já o Decreto nº 7.185/2010 “Dispõe sobre o padrão mínimo de qualidade do sistema integrado de administração financeira e controle, no âmbito de cada ente da Federação”. Ainda, a Lei de Acesso à Informação nº 12.527/2011 dispõe sobre os procedimentos a serem observados pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, com o fim de garantir o acesso a informações. 
Os robôs utilizados no projeto são capazes de demonstrar o que são gastos legais ou superfaturados. Após essa identificação e com o auxílio humano, é possível fazer julgamentos mais específicos e formalizar denúncias junto ao Ministério Público, exigindo que recursos mal investidos sejam devolvidos para a administração pública.
Essa operação, que conta com o auxílio do cidadão por meio de financiamento via plataformas de crowdfunding, segundo Cabral (2017), já conseguiu retornar para os cofres públicos mais de 5 milhões de reais de gastos indevidos, por intermédio de verificações manuais realizadas por voluntários. Imagine-se o quanto mais será possível identificar com a difusão dessa nova tecnologia que utiliza a inteligência artificial.
Nesse sentido, projetos como a Operação Serenata de Amor podem contribuir com a diminuição da corrupção, pois poderá atuar de forma mais abrangente e célere no monitoramento da aplicação do dinheiro dos impostos. Além disso, estará ajudando de maneira significativa a formar cidadãos mais motivados, informados e participativos, já que estes se sentirão envolvidos nesse processo de fiscalização. 
É evidente, portanto, que a informação pública qualificada e disponível, associada ao uso da tecnologia, por cidadãos capacitados e engajados, gera efeitos na qualidade dos gastos públicos e no combate à corrupção.
Referências

BRASIL. Lei Complementar n. 131, de 27 de maio de 2009. Palácio do Planalto. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp131.htm>. Acesso em 19 maio de 2017.

_________. Decreto n. 7.185, de 27 de maio de 2010. Palácio do Planalto. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/decreto/d7185.htm>. Acesso em 19 maio de 2017.

_________. Lei n. 12.527 de 18 de novembro de 2011. Palácio do Planalto. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12527.htm>. Acesso em 19 maio de 2017.

CABRAL, Felipe. Operação Serenata de Amor. Catarse. Disponível em: <https://www.catarse.me/serenata>. Acessado em: 21 maio. 2017.

DATA SCIENCE BRIGADE. Operação Serenata de Amor – Conheça Nossa Campanha de Financiamento Coletivo. Disponível em: <http://serenata.datasciencebr.com>. Acessado em: 21 maio. 2017.

* Texto elaborado por Bianca dos Santos Costa, aluna do mestrado profissional em administração, no âmbito da disciplina Coprodução do Bem Público, no Programa de Pós-Graduação em Administração da Universidade do Estado de Santa Catarina, Udesc Esag.

Participação para Cidades Sustentáveis é tema de evento promovido pelo Instituto Arapyaú e pelo GVces no dia 21 de agosto


Abertura

Mario Monzoni, Coordenador do GVces_A participação social na busca pela sustentabilidade urbana
Rodrigo Agostinho, Gerente Executivo do Programa Cidades e Territórios_ O olhar do Arapyaú para cidades e territórios sustentáveis
Mesa 1 – Agendas municipais: a participação como meio para o desenvolvimento de capacidades locais e de políticas públicas efetivas 
:: Profª. Paula Schommer, Universidade do Estado de Santa Catarina
:: Romualdo Teixeira, membro do grupo gestor do Plano Sobral de Futuro
:: Luiz Henrique, Instituto Votorantim, sobre o Plano Três Lagoas Sustentável
Debate com público com mediação de Sérgio Andrade (Agenda Pública) 
Mesa 2 – Territórios de protagonismo da sociedade civil: desafios para engajamento e estratégias de diálogo com políticas públicas 
:: Henrique Silveira, Casa Fluminense, Agenda Rio 2017 
:: Paula Galeano, Fundação Tide Setúbal, Plano de Bairro Jardim Lapenna 
:: Profª. Gabriela Brelàz, Universidade Federal de São Paulo
Debate com público com mediação da Daniela Gomes (GVces) 


Vídeo completo do evento disponível aqui.

Cidades e Territórios Sustentáveis: guias de metodologias e instrumentos buscam contribuir para experimentações em curso

Em meio às iniciativas que almejam a sustentabilidade de cidades e territórios, três publicações recentes compilam instrumentos, metodologias e aprendizagens que podem contribuir para as experimentações em curso pelo mundo.

 “Como parte do trabalho em cidades sustentáveis e localização da Agenda 2030 e seus 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), o Centro RIO+ traçou as diversas ferramentas e recursos que apoiam o desenvolvimento sustentável nas cidades em todo o mundo. Embora fora de uma análise exaustiva, Ferramentas de Planejamento para Sustentabilidade Urbana mapeia mais de 50 tipos de abordagens e ferramentas, desde índices de medições urbanas, certificações e ferramentas de previsão até guias de planejamento participativo e ferramentas de prestação de contas.”


Para acessar a publicação completa, clique aqui.


Rede de Ação Política pela Sustentabilidade, RAPS, lançou recentemente um Guia contendo diversos instrumentos e iniciativas voltadas à construção de cidades e territórios sustentáveis. A publicação é parte de um Programa nesse sentido, voltado sobretudo aos Empreendedores Cívicos de diversas regiões do Brasil que integram a RAPS. 

Esta e outras publicações estão disponíveis na Biblioteca RAPS.


O Instituto Arapyaú e o Centro de Estudos em Sustentabilidade da Fundação Getulio Vargas, FGV EAESP, por sua vez, compartilham aprendizagens sobre a construção da participação em agendas para cidades sustentáveis, com base na análise de quatro experiências no Brasil. 

Acesse: Construindo a participação em agendas para cidades sustentáveis

Para pesquisadores, cidadãos e gestores dedicados ao desenvolvimento municipal sustentável vale a pena também explorar a riqueza de dados e análises que integram o Sistema de Indicadores de Desenvolvimento Municipal Sustentável. Desenvolvida pela Federação Catarinense de Municípios, Fecam, a iniciativa envolve uma rede de parceiros, entre eles a Udesc e pesquisadores do grupo Politeia.


Explore o Sistema de Indicadores de Desenvolvimento Municipal Sustentável, com dados sobre todos os municípios catarinenses. Em breve, disponível para todo o Brasil, em parceria com a Confederação Nacional dos Municípios, CNM.

Vídeo do Painel Accountability, Public Management and Open Government, com apresentação de Florencia Guerzovich sobre pesquisa em curso no grupo Politeia

A pesquisadora Florencia Guerzovich participou, em dezembro de 2016, do Painel Accountability, public management and open government“, no âmbito do Academic Days on Open Government Issues, promovido pelo IMODEV – Improving Public Policies in a Digital World e Université Paris 5 Panthéon Sorbonn – Chaire des Ameriques, durante a Conferência Internacional da Open Government Partnership.

No Painel, agora disponível em vídeo (aqui), Florencia apresenta reflexões de pesquisa em curso no grupo Politeia sobre accountability social e coprodução do controle. Ela explica os quatro tipos de pontes entre governo e sociedade civil – cable stayed bridge, movable bridge, step stone bridge and pier – que identificamos ao pesquisar iniciativas de accountability social e governo aberto no Brasil. Os quatro tipos de pontes são exemplificados com os casos de Londrina, Itajaí, Rondonópolis e Florianópolis.

Um working paper sobre o tema está disponível em:
GUERZOVICH, Florencia and SCHOMMER, Paula Chies: Four Ways in Which Social Accountability and Open Government Interventions Bridge the State and Society. 12th ISTR Conference in Stockholm, Sweden – Ersta Sköndal University College. ISTR Conference Working Paper Series. Vol X. Stockholm, Sweden, 28 June – 1 July 2016.