Por Bianca dos Santos Costa*
A literatura apresenta diversas dimensões e perspectivas relacionadas ao conceito de coprodução do bem público. Em nosso cotidiano, porém, não temos o costume de enxergar certas ações pensando em coprodução, ou seja, certas situações podem passar despercebidas e não discutidas como sendo um fenômeno dessa natureza.
A coprodução é definida por Salm e Menegasso (2010) como uma estratégia para a produção dos serviços públicos por meio do compartilhamento de responsabilidades e poder entre agentes públicos, agentes privados e cidadãos.
No âmbito municipal, as prefeituras lidam com diversas demandas e usualmente seus recursos e capacidades não são suficientes para atender a todos os serviços que a comunidade necessita. Considerando essa escassez de recursos e as impossibilidades de prestar todos os serviços, bem como o imenso potencial de contribuição da comunidade, a coprodução é uma alternativa para promover políticas que incentivem o engajamento do cidadão, juntamente com servidores, na prestação dos serviços públicos, seguindo alguns critérios.
A pavimentação de ruas com a participação das comunidades é um caso interessante para ser analisado sob as lentes da coprodução. Dependendo do município, esses projetos de pavimentação podem acontecer de diferentes maneiras. Em alguns casos, as prefeituras fornecem todo o material necessário para construção, como lajotas e cimento, e a mão de obra fica a cargo dos moradores, ou seja, a prefeitura busca esse apoio da comunidade para prover a prestação do serviço.
Um dos elementos que favorece a coprodução é a transparência dos processos, visto que as pessoas conseguem perceber quais os critérios e prioridades que estão sendo aplicados, fazendo com que o envolvimento do cidadão permita essa melhora na capacidade de reposta às necessidades da comunidade.
Outro caso que ocorre em prefeituras são os convênios efetuados com organizações não-governamentais, ONGs. No serviço de creches, por exemplo, as prefeituras podem fazer parcerias com ONGs que prestam o serviço a crianças e famílias, compartilhando recursos, conhecimentos e responsabilidade ao prestar esse serviço.
Porém, quando a relação entre uma prefeitura e uma ONG se resume ao repasse de recursos, muitas vezes insuficientes e instáveis, ocorre a dúvida se seria realmente coprodução ou se representaria apenas um tipo de terceirização precária. O simples fato de haver o envolvimento de um grupo na prestação do serviço pode não ser coprodução. Para isso, é preciso apresentar determinadas características que efetivamente considerem a participação de ambos os envolvidos – cidadãos/usuários e profissionais/servidores públicos – no planejamento e/ou na execução, representando mais do que o simples repasse de recursos para a prestação de um serviço por um valor menor do que seria necessário.
Acredito que tanto os projetos de pavimentação como as parcerias com ONGs podem ser representados como possibilidades de coprodução, pois conforme afirma Ostrom (1999), a coprodução representa a combinação de atividades em que tanto os agentes de serviço público como os cidadãos contribuem para a provisão dos serviços públicos. Porém, cada caso precisa ser analisado em detalhes, pois a simples transferência de recursos e responsabilidades não satisfaz essa definição, sendo necessária a observação de vários outros critérios, como a oportunidade de efetiva participação dos cidadãos, a contribuição para a qualidade nos serviços prestados e a redução dos custos, por meio de inovações em processos e compartilhamento de responsabilidades.
OSTROM, Elinor. (1999). Crossing the great divide: coproduction, synergy and development. World Development, Vol. 24, No. 6, pp. 1073-1087.1996.
SALM, José Francisco; MENEGASSO, Maria Ester. Proposta de modelos para a coprodução do bem público a partir das tipologias de participação. XXXIV Encontro Científico de Administração da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração – ANPAD. Rio de Janeiro: ANPAD, Anais, CD-ROM.