* Por Thomas Muller Mitke
O estádio Arena das Dunas de Natal foi construído em uma parceria público-privada entre o Governo do Estado do Rio Grande do Norte e a construtora OAS Arenas. Oficialmente, custou 423 milhões de reais aos cofres públicos, o que é quase 21% a mais do que o inicialmente previsto no Projeto Básico de 2010 (350 milhões).
A construção da obra causa dúvidas em relação à transparência de gastos dos recursos, uma vez que, segundo o Portal da Transparência da Copa 2014 e o Projeto Jogos Limpos, o BNDES financiou R$396.571.000,00 da obra. Já a Construtora e portais de notícias, como BBC e UOL, afirmam que R$300.000.000,00 foram financiados pelo Banco, sendo 123 milhões de reais quitados à vista pela empresa.
Pago à vista pela OAS
|
R$123.000.000,00
|
R$132.190.000,00
|
R$132.190.000,00
|
Financiamento BNDES
|
R$300.000.000,00
|
R$396.571.000,00
|
R$396.571.000,00
|
Total
|
R$423.000.000,00
|
R$528.761.000,00
|
R$528.761.000,00
|
Fonte
|
BBC e UOL
|
Jogos Limpos
|
Transparência
|
Tabela 1: Custos de Construção da Arena das Dunas
Por meio da PPP feita com a administradora do estádio, o governo do RN terá pago, ao final do contrato de concessão de 20 anos, 1.28 bilhões de reais a OAS. Com essa quantia, poderiam ter sido construídos três estádios da mesma magnitude da Arena das Dunas, pelo seu preço estimado de construção. Além disso, há cláusulas contratuais que definem um lucro mínimo (não divulgado publicamente) para a OAS Arenas que, caso não seja alcançado, será coberto pelo governo do estado, além das parcelas mensais já acordadas.
Informações Disponíveis Publicamente
|
Construção do Estádio R$423.000.000,00
|
Concessão de Uso R$ 1.288.440.000,00
|
Informações Exclusivas
|
Manutenção e Arrecadação Mensal
|
Lucro Mínimo Exigido pela OAS
|
Tabela 2: Informações disponíveis e informações exclusivas sobre Arena das Dunas
Os custos de manutenção do estádio também não foram expostos. Por estar localizado em uma região sem grande tradição no futebol e que não costuma receber grandes eventos, é razoável supor que dificilmente serão cobertos, o que pode ser estimado pela média de público do estádio atualmente, nos eventos que recebe (9.000 torcedores para uma capacidade de 31.000).
Além de tudo, a construtora OAS, investigada pela Operação Lava Jato, teve cinco executivos presos recentemente. Entre eles, estava seu presidente José Aldemário Pinheiro Filho, condenado por corrupção, lavagem de dinheiro e formação de organização criminosa. Constataram-se fraudes licitatórias na Petrobrás, favorecendo a construtora para vencer disputas em refinarias do Paraná e Pernambuco.
Hoje, a facilidade de fraude em licitação com altos valores se dá principalmente pela dificuldade de acesso que a sociedade civil possui sobre os dados oficiais do governo. O superfaturamento em obras públicas não é algo novo no Brasil e, apesar do crescente interesse da população sobre as contas públicas, ainda não possuímos ferramentas eficazes de pressão sobre a Administração Direta e Indireta da nação para evitar esse tipo de acontecimento.
Segundo Schedler (2004), a accountability pode ser definida pela relação entre “A” e “B”, sendo que “A” presta contas a “B” quando está obrigado a informar sobre suas ações e decisões, a justificá-las e a sofrer o castigo correspondente em caso de má conduta. Engloba três dimensões, sendo elas: informação, justificação e sansão.
O conceito tem se expandido desde o início do século XXI, com o crescimento das mobilizações em torno da transparência sobre o que é feito com o patrimônio público e os serviços públicos. A partir da Lei da Transparência, em 2009, muitos avanços foram obtidos na divulgação de informações públicas em portais eletrônicos. Ao mesmo tempo, a lei não estabeleceu diretrizes claras sobre como as informações deveriam ser divulgadas, o que dificulta a busca das mesmas pelos cidadãos. O quadro a seguir busca mostrar alguns avanços e desafios ocorridos nas últimas décadas, no Brasil, em relação à accountability:
Avanços
|
Desafios
|
Mais informação à disposição da sociedade
|
Dificuldade para acessar as informações nas plataformas eletrônicas
|
Interesse da sociedade para adquirir informações
|
Pouca pressão social buscando qualidade nas informações
|
Ação de organizações da sociedade civil
|
Informações desatualizadas e rebuscadas
|
Mais dificuldade para fraudar compras públicas
|
Informações complexas que confundem o cidadão
|
Menos propensão de políticos a cometerem atos de corrupção
|
Não se exige transparência das empresas em ações conjuntas com o poder público
|
Uma das fragilidades que ainda se percebe é que as leis impostas às entidades privadas no Brasil falham ao não prever a necessidade da transparência de dados pelas empresas que trabalham em parceria com a administração pública. A partir do momento em que há interesse público, em qualquer ação de uma organização privada, as etapas do processo devem ser divulgadas para análise da comunidade. Dessa forma, busca-se facilitar o acesso à informação e não dificultá-lo, como acontece atualmente.
Assim, deve-se procurar eficácia na promoção da transparência, esmiuçando as informações nos portais eletrônicos, para que todos os cidadãos possam entendê-las. Não se pode deixar a fiscalização das atividades do poder público por responsabilidade apenas dos observatórios sociais e dos intelectuais da mídia. O cidadão deve ter poder de atuar diretamente, contribuindo para definir o destino dos recursos públicos.
Dessa forma, percebe-se o papel importante de projetos da sociedade civil como o “Jogos Limpos”, que se dispõe a oferecer ferramentas para ações coletivas de vigilância, monitoramento e controle social sobre os investimentos destinados para a Copa do Mundo de 2014 e para as Olimpíadas de 2016.
Então, para que existam métodos eficazes de gestão no meio público, é necessário que se empodere mais a sociedade civil e os observatórios sociais, buscando cumprir o papel de fiscalização dos processos decisórios nos órgãos públicos. A administração pública só é modificada a partir do momento em que os próprios agentes públicos e a sociedade civil enxergam a necessidade de mudança.
Referências
ARENA DAS DUNAS: CENTRO COMERCIAL, ESTÁDIO DE FUTEBOL OU ELEFANTE BRANCO? Disponível em: http://copadomundo.uol.com.br/ noticias/redacao/2014/01/30/arena-das-dunas-centro-comercial-estadio-de-fute bol-ou-elefante-branco.htm. Acesso em: 16/11/2015
BNDES APROVA R$ 396 MILHÕES PARA A ARENA DAS DUNAS EM NATAL. ESTÁDIO ESTÁ 50% MAIS CARO QUE PREVISÃO INICIAL. Disponível em: http://www.jogoslimpos.org.br/destaques/bndes-aprova-r-396-milhoes-para-arena-das-dunas-em-natal-estadio-esta-50-mais-caro-previsao-ini cial/. Acesso em: 09/11/2015
COPA: PREJUÍZO DE ‘ELEFANTES BRANCOS’ JÁ SUPERA R$ 10 MILHÕES.Disponível em: http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/02/ 150212_elefantes_brancos_copa_rm. Acesso em: 09/11/2015
NASCERAM OS ELEFANTES BRANCOS DA COPA. Disponível em: http://entretenimento.r7.com/blogs/andre-barcinski/nasceram-os-elefantes-bran cos-da-copa-e-agora-pachecada-20150127/. Acesso em: 06/11/2015
PORTAL DA TRANSPARÊNCIA DA COPA DO MUNDO DE 2014.Disponível em: http://www.portaltransparencia.gov.br/copa2014/cidades/execucao.seam? empreendimento=6. Acesso em: 09/11/2015
SERGIO MORO CONDENA PRESIDENTE DA OAS POR CORRUPÇÃO. Disponível em: http://epoca.globo.com/tempo/filtro/noticia/2015/08/sergio-moro-condena-presidente-da-oas-por-corrupcao.html. Acesso em: 15/11/2015
* Este texto foi elaborado por Thomas Muller Mitke, acadêmico do curso de administração pública da Udesc/Esag, no contexto da disciplina Accountability Systems.